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7 de fev. de 2019

AS TRAGÉDIAS DE UM BRASIL QUE NÃO APRENDE



O Césio 137 causou um problema gravíssimo, tanto de infra-estrutura quanto de saúde pública, mas há poucos dias, outro aparelho de raio-x foi encontrado em um ferro-velho. A mesma prática irresponsável, a mesma ausência de fiscalização, a mesma temeridade e provavelmente, a mesma ignorância de não atentar que um aparelho dessa natureza não pode ser descartado de modo tão simples.

É praticamente anual uma temporada de chuvas que cause desabamentos e mortes na cidade do Rio de Janeiro. Eu lembro bem de um carnaval 20 anos atrás, em que o Joaozinho Trinta chegou até a fazer uma alegoria que pedia chuva para um orixá que só atendia os pedidos em contrário. O fato é que, maiores ou menores, praticamente todos os anos o Rio de Janeiro experimenta tragédias nas encostas e nas suas muitas favelas. E nem por isso se faz absolutamente nada para corrigir o problema e conter o adensamento urbano irregular e desenfreado. Décadas perdidas sem nenhum programa eficiente de habitação popular e urbanização, coisas que o prefeito Negrão de Lima já defendia na década de 60. Em contrário, a favela virou até atração, com direito a trégua dos traficantes quando aparecem ônibus de turismo.

Na tragédia da Serra Fluminense em 2011, também. Naquele conjunto perverso de condições climáticas desfavoráveis e ocupação urbana desordenada e irresponsável morreram quase mil pessoas e 30 mil ficaram desabrigadas, sendo que ainda há gente nesta situação, passados mais de 8 anos. Quase uma década sem nenhuma política de segurança e, pior, roubalheira e corrupção generalizada nas obras públicas que seguiram para reparar os danos, desvios ou simples esquecimento de donativos em depósitos.

O Morro do Bumba, episódio de ganância imobiliária misturada com ocupação urbana desordenada e irresponsável morreram 267 pessoas. Passados quase 9 anos não há um marco regulatório eficaz sobre aterros sanitários e lixões, que continuam sendo utilizados para adensamentos urbanos tão logo sejam desativados como destinos de lixo.

Na Boate Kiss morreram 242 pessoas e, passados quase 6 anos, não há nenhum condenado, não há nenhum indenizado. Daquela carnificina o que seguiu foi uma obrigatoriedade vexatória de placas verdes na frente de todos os estabelecimentos comerciais, mas de ação prática efetiva para que não se repita, quase nada. E ali manifestou-se outro defeito visceral do Brasil, o autoritarismo de agentes que deveriam proteger os cidadãos, como um promotor que processou um pai de vítima, único condenado até agora, por danos morais decorrentes de supostas ofensas em face da demora no trato da questão.

Na tragédia ambiental de Mariana, além de morrerem 19 pessoas foram milhares de animais domésticos e silvestres, além de uma perda colossal de biodiversidade com a morte de um rio, comprometendo uma bacia hidrográfica inteira. É possível que dali, tenham partido os surtos de febre amarela e chicungunha que estão levando a situação sanitária do país para algo parecido com a do início do século XX. Sem nenhuma consequência criminal, não há presos, as ações mitigadoras dos danos foram mínimas e o marco regulatório simplesmente não saiu do lugar. Os peixes voltaram ao Rio Doce, mas a pesca nele praticamente acabou em razão da contaminação, apesar da vida insistir em voltar ao rio, os bancos de areia de sedimentos tóxicos vão se transformando em ilhas. O então Departamento Nacional da Produção Mineral passou a exigir um relatório anual sobre o estado de represas de rejeitos e tudo ficou nisso mesmo, nada mais se fez, nada mais se disse até que aconteceu Brumadinho.

Em todos estes casos há componentes comuns: 

O problema aparece e não é atacado. Nada se resolve, no máximo se discutem leis poéticas e idealizadas que não são cumpridas porque exigem uma burocracia tão grande que o Estado não consegue operá-las, como, aliás, é incapaz de operar até a legislação que já existe, cujo rigor é imenso, mas apenas para acumular papéis.

Ausência completa de fiscalização e atuação pró-ativa do Estado. A legislação existe, existem diversos órgãos capazes de fazer verificações, mas na prática, alega-se falta de competência, de pessoal e de condições materiais. E o Estado continua existindo apenas como mantenedor de si mesmo, sem que as 3 esferas se conversem, como se municípios e estados não estivessem inseridos em uma federação.

Pior é o festival de politicagem. Deputados e senadores criam CPI(s) e fazem discursos inflamados contra o governo de plantão, exigem providências e dizem que vão instituir o rigor da Lei. Tudo jogado ao vento, esquecido tão logo a mídia passa para outro item da pauta macabra do dia a dia nacional. 

Há quem diga que o Brasil sofre um castigo de Deus, mas se olharmos os muitos episódios agudos e os milhares de episódios diários que são representados por quase 120 mil mortes violentas por ano, que incluem homicídios, acidentes de trânsito, acidentes de trabalho e doenças decorrentes de atividades, a única constatação objetiva é de que somos irresponsáveis, não aprendemos com nossos erros, continuamos achando que leis poéticas resolvem problemas que precisam de ações práticas.

Aliás, o fetiche brasileiro por leis é algo sintomático de nossa sociedade. Para tudo há lei, para tudo há regulamento, mas nada é solucionado porque na mesma proporção em que se legisla, se abrem brechas para a proteção processual dos desonestos e dos malandros. Quando constatamos que ladrões contumazes de dinheiro público apostam sua liberdade na discussão de prisão somente após o trânsito em julgado, quando olhamos os números que demonstram que 90% das multas ambientais simplesmente não são pagas, quando indignados ouvimos falar da troca de punições por termos de ajustamentos de conduta, tudo isso nos remete a leis que não protegem a sociedade nem às coisas que ela deve prezar, mas somente às elites políticas, econômicas e intelectuais, todas elas sempre agraciadas com algum tipo de benesse que é negado para a maior parte da população.

Quando generalizo assim, é óbvio que a culpa recai sobre a classe política, afinal, é dela que se espera que se tomem as iniciativas mais importantes para enfrentar problemas. Mas não é um problema apenas da classe política, é um problema nosso, como país incapaz de cobrar de seus governantes uma atuação mínima que aprenda com os erros no pranto das tragédias, para que elas não se repitam.

Enquanto nós, brasileiros, não aprendermos que uma única morte violenta, qualquer que seja o motivo, é vergonhosa e aviltante à nossa condição de cidadãos, nunca sairemos deste circulo vicioso de tragédia-indignação-falatório-nova tragédia. Enquanto não colocarmos a Lei para punir os criminosos ao invés de dar-lhes razões de defesa e obtenção de prazos processuais protelatórios continuaremos a ser a pátria das tragédias, das mortes estúpidas, da vida que não vale nada se for de um cidadão comum que não tenha relações privilegiadas com o Estado.



9 de nov. de 2015

A TRAGÉDIA DE MARIANA NA CONTA DAS LEIS IDEAIS

A cada tragédia como esta, não só eu, mas gente muito mais qualificada sempre diz que faltou fiscalização, apesar das leis rígidas e da burocracia insana para se praticar qualquer atividade econômica no Brasil.

Na Boate Kiss, a burocracia deixou que se usassem isolamentos que não eram à prova de fogo. Passaram por lá a prefeitura da cidade, a saúde pública, a polícia civil e o corpo de bombeiros, cada um com um conjunto de regras a serem cumpridas e, claro, com uma taxa a ser cobrada, mas isso não impediu a morte de 200 jovens, porque no fim das contas, apenas as taxas é que importaram, nada foi fiscalizado.

No caso do Morro do Bumba, 200 soterrados e 48 mortes. Um monte de gente honesta comprou terrenos loteados em cima de um aterro sanitário, aquilo virou um bairro onde a municipalidade cobrava IPTU e demais taxas, as companhias de eletricidade, água e telefonia nunca se preocuparam com absolutamente mais nada além de fazer as ligações. A burocracia novamente cobrou taxas e impostos, mas nunca atinou para o perigo do gás metano, e aquelas pessoas perderam tudo o que tinham e/ou morreram, sem contar as adoecidas pelo contato de anos com o lixo acumulado sob suas casas. Ninguém proibiu nem que se invadisse, nem que se loteasse aqueles terrenos, isso com leis rígidas dizendo que é proibido.

São dois exemplos, mas se qualquer um de nós puxar pela memória, vai encontrar casos com elementos comuns: leis absurdamente rígidas, burocracia, falta de fiscalização e omissão de autoridades.

Aqueles tanques de decantação em Mariana eram depósitos de rejeitos e materiais químicos usados para separar o minério de ferro. Não se constrói tanque de decantação daquele tamanho sem licença ambiental, que em teoria observa de regras rígidas tanto de instalação quanto de operação. Provavelmente a empresa apresentou inclusive um plano de manejo, já que os resíduos eram misturados à água, ou seja, deveria haver tratamento dela, o que vai muito além de apenas manter a barragem, até porque, nenhuma estrutura assim pode receber dejetos por tempo e quantidade indefinidos. 

Mas as licenças foram emitidas e ninguém mais fiscalizou para saber quanto de resíduo havia lá, e se isso já forçava as barragens, ou ainda se chuvas torrenciais poderiam aumentar a pressão delas, ou se não seria o caso de a cada período de tempo, elas serem reforçadas de alguma maneira. Elas romperam. A lama, as pedras e os químicos de sua composição destruíram bem mais que um lugarejo: roubaram vidas até mesmo de quem sobreviveu, acabaram de matar de vez o Rio Doce e levaram desgraça e sujeira até o oceano Atlântico. E tem gente dizendo que a culpa foi de dois pequenos abalos sísmicos.

Ou seja, de pouco ou nada adiantam as leis extremamente rigorosas, redigidas com um português poético, depois regulamentadas de modo doentio, inclusive aumentando o rigor da própria lei, pelos órgãos que não deveriam estar legiferando, mas fiscalizando, visitando os lugares onde a lei se aplica, indiciando quem à descumpre, pedindo cadeia para quem incorre nos crimes de sua violação.

Melhor leis menos rígidas e burocracia menor, com mais fiscalização. Mas o Brasil não aprende, e provavelmente teremos como consequência de Mariana, uma fúria fiscalizatória especialmente direcionada contra empresário que cumprem as leis (os que não cumprem geralmente não têm endereço fixo para serem visitados, não constam dos cadastros), para mostrar que desta vez o país aprendeu alguma coisa com a morte de gente inocente. Mas tudo vai voltar ao normal tão logo as pessoas esqueçam do fato, e vai sobrar algo como aquelas placas verdes informando a capacidade de público, que existem em todas as casas noturnas do país, e que igualmente ninguém observa.


28 de set. de 2015

ESTATUTO DA FAMÍLIA PARA QUÊ?

Ao criar a figura intocável do "menor", dando-lhe direitos demais e obrigação alguma, o Estatuto da Criança e do Adolescente piorou a situação da juventude. A quantidade de menores delinquantes subiu assustadoramente: eles portam armas, consomem drogas, se reproduzem, perambulam pelas cidades livremente a qualquer hora do dia ou da noite, se organizam em bandos e espalham o terror com a certeza da impunidade, pois na maioria dos casos, são liberados até sem a presença dos pais ou responsáveis. São menores que, pichando, vandalizando e furtando, destroem as escolas em que deveriam estar, atormentam a vida de professores e funcionários e impedem o crescimento intelectual da parcela majoritária deles que pretenda ter uma vida honesta. 

Tudo isso, porque desde o ECA, sua punição por delitos é branda ou inexistente. Apesar da beleza da letra da lei, que parece ter sido escrita por um poeta, crianças continuam sendo jogadas no mundo por pais irresponsáveis, sem direito certo à educação, nem saúde e muito menos moradia dignas, até porque, os próprios menores indomáveis criados pela Lei, tratam de ajudar na destruição das condições para que isto aconteça, especialmente quando analisamos a situação da escola pública.

Já o Estatuto do Desarmamento criminalizou o porte de armas pelos cidadãos de bem, retirando da maioria deles o direito de usá-las em sua defesa. Mesmo assim, o crime não diminuiu, pelo contrário, o Brasil continua sendo o campeão mundial de homicídios, mata-se mais aqui em um ano, do que o conflito Israel-Palestina matou em 60! O Brasil tirou as armas dos cidadãos, mas ao mesmo tempo negligenciou o controle de fronteiras, pelas quais entra o armamento pesado usado pela bandidagem. 

O resultado é que hoje, qualquer bandido é bem armado e qualquer cidadão está à sua mercê, e a punição para o cidadão de bem que for flagrado portando arma, é mais severa que a da maioria dos crimes cometidos pelo delinquente.

Esses exemplos são apenas para demonstrar que leis não servem para absolutamente nada se não são cumpridas. E quanto mais belas e perto do ideal são redigidas, menos efetivas se apresentam, porque idealismo, além de não ser exatamente humano, custa caro e demanda vontade férrea das autoridades e programas sociais consistentes que não podem se limitar a distribuir esmolas para miseráveis, como comprova a experiência nacional recente.

Em mais uma discussão inútil, tentando redigir uma nova e bela lei que simplesmente ninguém cumprirá, o Congresso Nacional discute o conceito de família e, como era de se esperar, ao invés de usar do bom senso de criar uma regra aberta que abarque as muitas situações que a sociedade real e naturalmente dinâmica cria,  visa adotar um conceito fechado e idealizado, preconceituoso e desconectado do mundo real, mesma fórmula maniqueísta que deu errado no ECA, no Estatuto do Desarmamento e mesmo no Estatuto do Idoso, onde uma parte das pessoas é sempre boa e vítima e outra é sempre má e agressora.

Não adianta ter Estatuto da Família para levar para o Judiciário a discussão de quem está ou não está incluso nele. Não adianta se criar uma figura intocável como a do "menor" se não se combate o que, em volta dele, o leva para a criminalidade. Não adianta excluir casais homossexuais do conceito de família porque eles têm o direito e a humanidade de dar lar a crianças que foram abandonadas por terceiros. Não adianta, de modo algum, tentar induzir a sociedade a um mundo de conceitos políticos e não reais. O menor que não pode constituir uma família com dois pais ou duas mães, pode ser o mesmo que tempos depois estará promovendo um arrastão, porque a sociedade não é ideal, não é perfeita, ela é tão melhor quanto mais bem regulada pelas leis com ação justa e correta das autoridades em atacar seu problemas, o que não significa apenas redigir leis poéticas, idealizadas e maniqueístas.

Se não é para abarcar todo mundo e dar direitos e obrigações para todos, melhor que a lei nem exista. Um Estatuto da Família que exclua direitos como o ECA excluiu obrigações, só vai piorar o quadro de relações humanas, porque estas sempre são mais efetivas que o ideal escrito em algum lugar, até porque o ideal é pessoal, um casal pode ser o início ideal de uma família para mim, mas pode não ser o que o leitor tenha em mente...


4 de set. de 2010

LEI E ÉTICA NÃO SÃO IRMÃS

No Brasil, se velhinhos são desrespeitados em filas de bancos, criamos um Estatuto do Idoso. Se adolescentes criados por pais irresponsáveis bebem, fumam, cheiram e viram objeto de desejo sexual de facínoras, tascamos um Estatuto da Criança e do Adolescente. Se mulheres apanham dos maridos criminosos, Lei Maria da Penha. Se o atendimento nas filas dos órgãos públicos é lerdo e ruim, um Código de Defesa do Contribuinte, e assim sucessivamente...

A cada escândalo, a cada análise mais aprofundada de algum problema nacional, cedo ou tarde acaba correspondendo uma legislação estúpida com preceitos ideais e quase sempre inexequíveis.

Mas uma coisa é legislar, outra é fazer cumprir o que aquelas palavras bonitas e aquele contexto ideal prevê. No Brasil, são poucas as leis que efetivamente são cumpridas e posso afirmar com absoluta certeza: nenhuma lei que protege o cidadão é cumprida à risca, porque em nossa sociedade há gente de primeira classe (os políticos, os ricos, os famosos e os altos funcionários públicos) para quem há esmero em garantir todos os direitos e para o resto, o povão, a patuléia o pessoal do andar de baixo, sobra ligar para o telefone 190 que ninguém atende, sobra fazer BO que acaba não correspondendo a uma investigação, sobra esperar para que um juizado especial qualquer ou a Justiça lerda e elitista do país tome alguma providência.

Na prática, os velhinhos pegam senhas especiais nas filas de bancos e acabam esperando 20, 40, 50 minutos como qualquer outra pessoa porque a agência que deveria ter 3 caixas tem apenas 1. O adolescente continua na rua fazendo o que bem entende e as mulheres continuam apanhando dos maridos, porque a polícia não atende pobre, ela só atende urgências das pessoas que têm acesso ao comando da corporação como juízes, promotores, políticos, grandes empresários e "bacanas", de um modo geral. E nas filas dos órgãos públicos, ninguém está nem aí para direito do contribuinte pois, se ele reclamar, inventa-se uma obrigação ou um documento faltante e faz ele voltar no dia seguinte para aprender a não reclamar do sistema.

Não se cumpre a lei, não se pune ninguém.

No Brasil é senso comum que basta escrever algumas linhas bonitas com a chancela de alguma casa legislativa para solucionar problemas.

Viramos um país governado pela demagogia e pelo velho ditado do "quem pode mais chora menos". Somos na realidade dois países, um ideal que atende aquele 1% da população que é ouvida pelas autoridades e o resto, que vive ao Deus dará, que a cada 4 anos vota acreditando nas "propostas" idiotas de melhor educação, mais saúde, mais segurança pública... propostas estas incessantemente repetidas a cada campanha política, que geram leis cada vez mais poéticas e menos aplicadas.

Depois do escândalo desta semana, tenho que o novo vilão nacional a ser objeto de ampla legislação moralizadora será a classe dos contabilistas. Não vai demorar, terá gente propondo rever o código de ética da profissão e o endurecimento de todos os procedimentos fiscais em que as mãos sujas e suspeitas de um contador tocarem, por mais que 99,9999999999% dos profissionais da área sejam absolutamente honestos e éticos.

Os contadores serão a partir de agora, o que um dia foram os bancos para os velhinhos, os pais irresponsáveis e os pedófilos para os jovens, os maridos violentos para as mulheres... isso até o próximo escândalo, quando se elegerá uma nova classe para fazer demnagogia acerca da ética que os brasileiros de modo geral não têm e que a classe política comemora não existir!

18 de nov. de 2009

DO PROBLEMA AO EXAGERO

Tramita na Câmara Municipal de Curitiba um projeto de Lei absurdo que impõe aos bares e boates com capacidade para mais de 100 lugares o cadastramento de seus clientes, com vias a identificar baderneiros.

Geralmente eu bato palmas quando leis visam impedir o fumo e a bebida, especialmente entre crianças e adolescentes nessa associação indevida de tais coisas com a diversão. Por isso defendo as leis anti-fumo e a Lei Seca do álcool no volante, bem como a responsabilização criminal severa para quem vende álcool e fumo para menores de idade.

Mas uma coisa é proibir a pessoa de ter comportamentos inadequados que prejudicam terceiros, outra é impedir seu direito de ir e vir.

As casas noturnas podem muito bem serem obrigadas a instalar câmeras de segurança para monitorar seu ambiente. Mas fichar clientes é de uma inconstitucionalidade flagrante que, óbvio, nenhum dos vereadores de Curitiba percebeu, até porque o nível médio dos edis da cidade é baixo e eles não teriam um "insight" assim.

É possível limitar o direito de ir e vir filmando lugares para posterior reconhecimento, pela polícia, de quem causa problemas.

Mas fichar uma pessoa porque ela costuma frequentar um determinado lugar é atividade exclusiva do Estado, decorre do seu poder de polícia, da mesma forma que a ele é deferida a exclusividade de emitir documentos de identificação. Mais do que isso, se a lei deferir ao comerciante o direito de dizer que ficha "x" e ficha "y" são baderneiros, resulta em ofender o monopólio da punição penal que existe ao Estado.

O Estado brasileiro é pródigo em descartar suas obrigações.

É obrigação da polícia identificar baderneiros, prendê-os e levá-los a responder processos judiciais, mas agora, os simplistas de plantão querem se desincumbir disto passando o custo e até mesmo o ônus da acusação para a iniciativa privada, que sujeitar-se-á a uma avalanche de ações por dano moral, de gente que não vai aceitar a pecha de "baderneiro" e irá ao Judiciário.

Aprovado um excremento legal como este, é provável que Curitiba vire uma cidade sem vida noturna, porque ou os clientes deixarão de frequentar tais lugares ou os comerciantes vão falir de tanto pagar por danos morais... mas o Estado vai continuar cobrando impostos, taxas, contribuições e contratando políticos inúteis e burros com suas trupes de parentes e correligionários corruptos, de tal forma a não sobrar dinheiro para investir em segurança pública, a mesma que o Estado quer transferir agora para donos de botecos!

26 de dez. de 2007

EMENDANDO

No Estadão de hoje, uma matéria interessante, leia no link clicando no título:

Constituição recebe 5 emendas por ano e mantém normas transitórias
Carta tem capítulo que abriga todo tipo de medida dos governos, como instituição da CPMF e da DRU

João Domingos


Durante a Assembléia Nacional Constituinte ocorreu um debate intenso sobre constitucionalização de certos assuntos, para diminuir a possibilidade de violação de direitos ou pura e simplesmente impedir sua discussão, consectário do entendimento de que uma Constituição guarda direitos e protege a sociedade.

O intuito de impedir discussões é visível nos direitos trabalhistas, enumerados na Carta Magna para supostamente proteger o trabalhador.

Isso não ocorreu.

Até hoje fala-se em reforma trabalhista com vias a diminuir o custo de folhas de pagamento e aumentar o número de vagas. Todos os governos desde então (inclusive o atual), tentaram flexibilizar essas regras e foram derrotados por maiores que fossem suas "bases aliadas", e por mais os entraves que isso tenha causado ao país.

Um exemplo claro desse excesso é o salário-familia, constante do inciso XII do artigo 6º. É um direito constitucional que representa alguns centavos na folha de pagamento de quem recebe mais de 2 salários mínimos por mês. Um acinte à inteligência do país, que não pode discutir sobre centavos numa folha de pagamento agravado pela com demagogia ainda maior de a regra constitucional não ser universal, não ser aplica a todos os trabalhadores a teor das exceções de que trata o parágrafo único do mesmo artigo.

O dinheiro que esses centavos representam poderia ser muito mais bem utilizado de outra forma, mas fica ali atrapalhando empregadores e onerando o governo porque a Constituição o exige.

Já no que concerne ao Direito Tributário, buscou-se constitucionalizar os tributos para impedir que aumentassem todos os anos, evitando a violação de direitos.

Mas para tributos o Congresso Nacional é sempre flexível e aceita qualquer emenda constitucional por mais danosa que ela seja ao país. Daí se criam impostos, contribuições sociais e dezenas de novas taxas e acréscimos cobrados na folha de pagamento (os inefáveis "terceiros").

Para aumentar tributos por aqui, a Constituição nunca é difícil de emendar e já ouvi quem defenda tirar a listagem dos impostos da Constituição para facilitar a criação de mais deles, mantendo nela apenas os princípios tributários, os mesmos que todos os governos teimam em violar quase diariamente com as vistas quase grossas do Judiciário

A Constituição foi mal redigida. Já sofreu 95 emendas desde 1988, muitas delas entulhadas no Ato das Disposições Constitucionais Tributárias sobre matérias que de constitucionais não têm nada.

Ora, observada uma boa técnica jurídica (uma utopia num país de gente - parlamentares, inclusive - que não lê nem estuda), o ADCT deveria considerado como imune à emendamento. Ou seja, ele teria que exaurir suas matérias e ser esquecido, justamente por ser transitório.

Mas isso não impediu de sucessivos governos e legislaturas emendá-lo, como bem demonstra a matéria do Estadão. O resultado é que o ato transitório virou permamente, uma parte da Carta onde se constitucionalizam todos os assuntos de conveniência do governo em exercicio.

O país já não tem mais exatamente uma Constituição. Tem uma Lei Complementar que nada complementa e que não guarda mais direitos, muito menos protege eficazmente a sociedade, justamente pela facilidade de ser alterada.

FHC comprou a regra da reeleição e há quem defenda que o atual governo compre outra, e quem perde é a sociedade, que vê a democracia esvair pelos dedos, corroída por continuismo e caudilhismo.

Outro exemplo é o constante aumento de tributos, que arrancam dinheiro da sociedade para financiar um Estado ineficiente que paga salários milionários à uma elite política e funcional. Se a Constituição não fosse tão facilmente emendável, o Estado teria que aprender a ser eficiente e trabalhar com os recursos que ela disponibiliza. Mas não, emenda-se e premia-se a incompetência, a gastança e a corrupção em detrimento da sociedade.

Enfim, temos uma "quase" Constituição, e isso explica muito do atraso nacional

30 de set. de 2007

CUMPLICIDADE CULPOSA

Editorial de O Estado de S.Paulo de hoje, exatamente o que penso sobre a questão.

No Brasil fala-se muito de "direitos humanos", mas pouco de obrigações humanas.

O sistema penitenciário envolve uma barafunda de regras para proteger os condenados, levam à soltura muito antes do cumprimento das penas. Não custa lembrar que o assassino a que se refere o editorial do Estadão estava sofrendo medida de segurança, que é uma quase prisão, que ele, condenado a 17 anos cadeia, recebeu por "bom comportamento", enganando psicólogos, assistentes sociais e juiz incompetentes, para quem basta olhar as informações de uma ficha amarelada para decidir por nas ruas um assassino.

No caso das medidas de segurança, que são aplicadas para pessoas portadoras de alguma doença mental, a demagogia corre solta e indivíduos da periculosidade deste, são tratados como pobres coitados privados do convívio de suas famílias, "vítimas" da sociedade que paga impostos extorsivos, mas vê seus filhos mortos pelas facadas de um monstro que recebeu de um juiz a autorização para circular pelas ruas e escolher suas vítimas.

É demagogia demais em um Estado que contrata milhares de ocupantes inúteis de cargos em comissão, mas não prepara a contento os agentes públicos que decidem a liberdade de uma "coisa" como esse indivíduo de altíssima periculosidade, que será condenado a mais 30 anos pelo assassinato dos dois garotos mas não vai demorar 5, estará nas ruas matando novamente.

Tal qual o Champinha, que volta para as ruas no fim deste ano.

Ou ainda, com a mesma cara-de-pau de Suzane von Richtofen, que demanda por "danos morais" contra o Estado que a puniu por assassinar a família a sangue frio.

O Brasil precisa é acabar com essa prática de contratar agentes públicos que se candidatam aos cargos apenas porque o salário é bom. Para ser juiz, um indivíduo sem vocação alguma passa um ou dois anos estudando, decora textos legais e regrinhas imbecis, passa num concurso e depois, perdendo tempo com mestrados e doutorados, faz da magistratura uma atividade secundária e apressada, onde parece proibido sair do gabinete para encontrar-se com a sociedade real, decidindo assim, com base em ouvi dizer e laudos propostos por outras pessoas igualmente sem vocação para o serviço público.

Juízes, psicólogos, psiquiatras e assistentes sociais do sistema penitenciário erram, mas quem paga a conta são cidadãos comuns, cujo trabalho braçal e o suor no rosto não sensibilizam quem decide em gabinetes de palácios cheios de mármore, granito e doutores.

CORITIBA: O MEDO DO FUTURO.

No erro de uma diretoria interina, que acionou a justiça comum em 1989 para não jogar uma partida marcada de má-fé pela CBF para prejudicar ...