30 de mai. de 2017

A CARA-DE-PAU COMO ARGUMENTO DE DEFESA



Um ex-ministro da Fazenda (vejam bem, da FA-ZEN-DA, aquele à quem se reportam a Receita Federal do Brasil e a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional) vem à público e alega em sua defesa que sim, tem dinheiro na Suíça, que não foi declarado no Brasil,  fruto da venda de um imóvel da família. 

Difícil de acreditar que um ex-ministro da FAZENDA não saiba que o dinheiro de uma venda legal, não possa ser enviado legalmente para o exterior, a ponto de fazê-lo na ilegalidade de não declarar a operação de transferência, que qualquer gerente de banco brasileiro sabe fazer dentro das leis e das regras emitidas e fiscalizadas pela Receita Federal do Brasil. Difícil de acreditar, mesmo!

Sem contar que, se o ex-ministro acredita nessa história, isso explica a situação macroeconômica delicada do Brasil, porque demonstra que no ministério não havia alguém realmente capacitado para a função.

Um outro político, senador famoso, falante, bonitão e cheio de marra, foi acusado e receber 2 milhões de reais em dinheiro vivo de um mega-hiper empresário com negócios em dezenas de países pelo mundo afora. Alegou que era um empréstimo para pagar o advogado, que no mesmo dia declarou não ter recebido nada em dinheiro vivo! 

Hummm... se era empréstimo, porque não fizeram transferência bancária? Segura, sem risco de assalto e sem a necessidade de carregar mala (deve pesar pra caramba uma mala cheia de dinheiro, eu nunca vi uma assim na vida, mas fico imaginando). Se era para pagar advogado, porque não transferiram direto para a empresa ou pessoa do causídico?  Se era empréstimo, este é isento de imposto, desde que seja devolvido, mas se era para pagar o advogado, este teria que pagar os impostos, afinal, seria renda. Mas nada disso ocorreu ao senador. O senador administra seu gabinete com vários funcionários, relata, discute e vota os mais variados projetos de lei, sendo que alguns são inclusive fiscais, para combater a sonegação. Mesmo assim, ele "não sabia" que uma operação de 2 milhões podia ser feita por mera transferência bancária. 

E um ex-presidente frequenta um sítio. Do sítio ele recebe informações do caseiro, que informa dos pintinhos que morreram, dos gambás que caíram na armadilha e dos reparos que são necessários. Na casa do sítio, fotos e objetos pessoais seus na decoração e os nomes dos netos nos pedalinhos do lago. Mas alega que o sítio é... de um amigo! 

Não faz muito tempo, os (muitos) políticos envolvidos em investigações de corrupção vinham à público dizer serem inocentes, vítimas de enganos ou de perseguições políticas, mas agora, passamos à uma nova fase de suas defesas, eles adentraram à teoria da cara-de-pau explícita, com direito à óleo de peroba de brinde.


24 de mai. de 2017

É O CONGRESSO, ESTÚPIDO!


O Congresso Nacional vota as leis que quiser, do jeito que quiser, na hora que bem entender e mais do que isso, ele pode votar inclusive leis que não sejam de interesse dos Poderes Executivo e Judiciário, já que elas podem sofrer veto. O Congresso tem quadros técnicos e o direito de requisitar informações para todos os órgãos públicos da administração direta e indireta. Ele pode concluir por si mesmo qual a necessidade das contas públicas em, por exemplo, reformar a previdência, e qual o anseio da sociedade civil em alterar a legislação trabalhista. O Congresso deve funcionar independentemente dos poderes Executivo e Judiciário, apesar do sistema de contrapesos natural à separação de poderes. Ele é limitado pelos vetos daquele e pelas decisões deste, na exata medida em que também pauta seus comportamentos legislando e tendo a prerrogativa de cassar os vetos presidenciais, se obtiver maioria qualificada de votos.

Isso parece óbvio para qualquer pessoa que estude apenas um pouco o sistema jurídico. Mas por alguma razão, o próprio Congresso parece não entender.

Não se pode impor ao Congresso Nacional uma liderança externa, de modo que a verdadeira grande crise pela qual passa o Brasil é de iniciativa. O Congresso ocupa-se demais com as opiniões que partem do Palácio do Planalto e deixa de afirmar sua própria independência.

O Congresso pode, sim, tomar a frente da reformas econômicas de que o país precisa, inclusive sem o impulso vindo do Palácio do Planalto. Pode arquivar as reformas trabalhista e previdenciária e implementar novos projetos, bem como pode dar continuidade aos projetos em curso, independentemente de quem seja o presidente da república ou da situação em que ele se encontre.

Se o Congresso Nacional assumisse sua função institucional, as crises cíclicas que atingem a presidência seriam menos graves, porque se saberia que, apesar do governante enfraquecido, ainda assim há um colegiado que funciona inclusive numa crise que afete parte de seus integrantes. 

Estamos paralisados desde outubro de 2014, quando Dilma Roussef resolveu peitar o PMDB e montar um governo petista, quebrando uma promessa de Lula, segundo a qual o novo governo seria compartilhado. 

E o mais interessante desse quadro, é saber que bem ou mal, o PMDB controla o Congresso Nacional, ele tem ampla capacidade de articular base suficiente para votar o que bem entender, com grandes chances de aprovar projetos de lei e até mesmo emendas constitucionais. Ele não precisava de Dilma, como não precisa de Temer, de modo que pode muito bem assumir a responsabilidade pelo país, para votar as reformas da previdência, da legislação trabalhista, a tributária e a política. 

Se até o presente momento não assumiu suas responsabilidades, é outro assunto. Mas deveria assumi-las e, independentemente de qualquer discussão sobre renúncia ou impeachment, manter o calendário de votações e sinalizar para o mundo que o Brasil não vai parar nem na fraqueza de seu presidente, nem na interpretação frouxa da Lei pelo seu Judiciário, muito menos na oposição baderneira que prefere ver o agravamento da crise econômica a discutir com civilidade dos grandes temas do país, incluindo a situação do presidente.

Pena que o que vimos ontem foi a negação do Congresso, foi a declaração de inutilidade do parlamento constatada tanto pela falta de traquejo da situação em encaminhar a votação de reformas importantes, quanto pelo radicalismo torpe e desonesto da oposição, que se recusa a discutir qualquer matéria que não seja a de substituir o presidente.

A verdadeira crise pela qual passa o Brasil é de iniciativa. Se o presidente da república tem algum problema, tudo pára e todas as forças convergem para mantê-lo ou derrubá-lo, mas a grande verdade é que reformas não precisam necessariamente ser propostas pelo Poder Executivo. O Congresso poderia tratar dos dois assuntos ao mesmo tempo, sem prejudicar a claudicante economia do país.

22 de mai. de 2017

PARALISIA QUE NÃO PASSA, A CRISE POLÍTICA CONSTANTE DO PAÍS.



A Constituição de 1988 não foi exatamente fruto de uma assembléia constituinte. Seu defeito fundamental foi ter sido feita por parlamentares que continuariam deputados e senadores depois de promulgada, e isso foi a causa direta da irresponsável distribuição de benesses, que fez, por exemplo, que o funcionalismo comum e celetista tivesse direitos equiparados às carreiras de Estado, de um tal modo que, do dia para a noite, o porteiro do Congresso Nacional passou a ter direito a anuênios e quinquênios, licença-prêmio e aposentadoria em valor maior que o da última remuneração, corrigida com os mesmos índices do pessoal da ativa.

Além deste aspecto, a estrutura política da Constituição de 1988 foi criada pela cúpula do então PMDB, que no meio do processo cindiu-se, sendo que uma parte fundou o PSDB em junho daquele ano. A causa maior da cisão foi a manobra do então presidente José Sarney não só em conseguir manter seu mandato (que acabou reduzido em 1 ano) como também em manter seu poder, já que, em aprovado o parlamentarismo ele passaria a ser apenas um chefe do Estado, não o de governo. Foi a intervenção de Sarney que "salvou" o presidencialismo.

péssima Constituição de 1988 mantém uma estrutura parlamentarista para um regime presidencialista. Ela dá enormes iniciativas ao presidente da república, porque de modo geral se imaginava que seria um primeiro-ministro ou chanceler. O melhor exemplo é a medida provisória, que era inicialmente ampla, praticamente ilimitada, porque em teoria pressupunha uma base parlamentar sólida que sustentasse o governo.

Mas ao mesmo tempo em que dá iniciativas, ela torna o presidente refém do Congresso porque ele não é primeiro-ministro, ou seja, ele não chega ao poder sem antes ter uma base parlamentar sólida. Ele se obriga a eleger-se e depois construir esta base. E base que se constrói depois implica negociar com pessoas que estiveram contra ele durante a campanha, sem alinhamento ideológico, sem obrigação de observar liderança.

O que aconteceu entre meados de 1988 e outubro, quando a Carta foi promulgada, foi o determinante legal de todas as crises institucionais que seguiram. A Constituição blindou a classe política com foro privilegiado, a possibilidade de criar partidos do nada e a capacidade de emendar ilimitadamente e sem freio de assunto tanto a legislação que o próprio Congresso produzia quanto à que vinha do Executivo nas medidas provisórias. 

Collor já não tinha apoio parlamentar ao ser eleito por um partido nanico. Montou uma base frágil que nas sucessivas crises de corrupção de seu governo logo se desfez, causando o impeachment. Itamar Franco voltou para o PMDB e compôs com o PSDB e o PFL, conseguindo apoio para encerrar o mandato com tranquilidade. Essa base PMDB/PSDB/PFL venceu as eleições com FHC que mesmo com dificuldades ideológicas conseguiu empreender boa parte das reformas, inclusive constitucionais, apesar do episódio da reeleição onde o tráfico de parlamentares se iniciou, dando um indicativo do meio pelo qual se poderia conter o Congresso.

Quando Lula vence as eleições, constata que sua base parlamentar pura, formada pelo PT, por partidos de esquerda e o antigo PL de José Alencar não lhe garantiriam nenhuma facilidade no Congresso. Inicia-se então um enorme processo de cooptação de parlamentares que desaguou no Mensalão, passando pela entrega de ministérios "de porteira fechada" para o PMDB, e na criação de partidos e siglas de aluguel, que justificavam as saídas de parlamentares dos partidos tradicionais e/ou de oposição. 

FHC necessitava de 3 ou 4 partidos para ter maioria no Congresso, Lula elevou essa quantia a 8 ou 9 e, quando chegou a vez de Dilma Roussef, ela já tinha a indigesta tarefa de negociar com 16, a maioria deles criada no segundo mandato de Lula, para que indivíduos em específico se aproveitassem da popularidade do ex-presidente e compusessem seu governo de dezenas de ministérios e secretarias distribuídos com farto número de nomeações em confiança.

O fato nisso tudo é que a Constituição exige que o presidente tenha apoio parlamentar, e daí chegamos a Michel Temer. 

Pouco antes das eleições de 2014 o PMDB de Temer, Jucá, Renan, Geddel, etc.. apregoava sua adesão à chapa de Dilma Roussef em busca de um governo de "iguais", compartilhado, no qual o partido teria um mesmo número de ministérios e uma concentração idêntica de poderes. Foi Lula que escolheu Temer e que ofereceu mundos e fundos para ter o PMDB com Dilma. Em novembro, Dilma inicia a composição e bate de frente com o partido aliado, indicando que o governo seria predominantemente petista e que ao PMDB ficariam apenas uns poucos ministérios de menor importância, quebrando a promessa de igualdade.

Então, Eduardo Cunha que já era favorito a ser o novo presidente da Câmara no primeiro turno, em outubro, por conta da insatisfação da parte do PMDB que preferia alinhar-se a Aécio Neves, passou a ser considerado favas contadas. O petistas imaginavam que o PMDB iria espernear, mas acabaria desistindo da briga para ficar com os cargos, como sempre fizera desde o governo FHC, o problema é isso acabou não acontecendo, porque a popularidade da presidente caiu rapidamente, ao mesmo tempo em que se descobriu que suas políticas macroeconômicas destroçaram as contas públicas. Juntando com uma presidência da câmara que já não prendia mais a pauta, foi uma questão de tempo o governo já visceralmente incompetente meter de vez os pés pelas mãos.

Dilma foi cassada porque negligenciou apoio parlamentar e ficou imensamente impopular. Temer, também impopular, ao menos tinha apoio parlamentar para propor e aprovar os remédios amargos que o país necessita para se recuperar. 

Semana passada, descobriu-se que Temer era apenas mais um, numa gigantesca máquina de negociar parlamentares,e agora também fica sem o apoio dentro do Congresso, o que o inviabiliza, tal qual o que ocorreu com Dilma e ocorreria com Lula e mesmo FHC em condições similares.

O que se constata desta sequência de fatos históricos é que o presidencialismo de coalizão que acabou surgindo da não implantação do parlamentarismo é um esparadrapo usado para curar câncer, porque o Congresso virou um balcão de negócios na exata medida em que os presidentes foram se elegendo sem bases parlamentares próprias sólidas e suficientes. Os Joesleys, Eikes e Odebrechts são apenas indivíduos que se aproveitam da fraqueza do Executivo em manter apoio parlamentar, porque no cerne da questão está um sistema político que deveria ser de um jeito, mas funciona de outro. Usa-se o Estado agigantado para alavancar negócios privados e em troca se consegue dinheiro para acalmar os ânimos parlamentares que sustentam o presidente.

Por esta razão é que falar em diretas já é apenas alimentar uma máquina que já funciona de modo precário. Qualquer presidente que seja eleito já, não terá base parlamentar sólida para governar e não será a sua popularidade pessoal que lhe dará condições de governabilidade, porque, afinal, o Congresso vai continuar sendo o atual.

Hoje, a melhor saída para o país seria a cassação ou renúncia de Michel Temer, com um novo presidente eleito mesmo pelo Congresso, a partir de uma coalizão parlamentar, ou seja, um presidente do PMDB, com a base congressual acalmada e capaz de ainda aproveitar os poucos meses do mandato para tentar restituir confiança econômica no país.

Mas de 2018 em diante só há 3 opções: a) uma reforma política que institua o parlamentarismo e corrija a distorção da Constituição de 1988; b) uma reforma política que equilibre o Executivo com o Legislativo; c) a eleição de um presidente acompanhada também da conquista por ele de uma maioria parlamentar consistente, o que é muito improvável, no cenário atual.

18 de mai. de 2017

NO BRASIL, O APOCALIPSE É PERIÓDICO



O que é possível concluir a partir dos efeitos dos muitos processos judiciais-institucionais observados nos últimos anos? Faço um apanhado:

- É possível concluir que uma presidente cassada por crime de responsabilidade não precisa ser apenada com perda de direitos políticos, mesmo contrariando a letra da Constituição.
- Dá para concluir que um réu indiciado em vários processos que versam sobre corrupção, pode presidir o Senado, mas não pode constar da linha sucessória, em caso de vacância da presidência.
- Fácil de constatar que mesmo havendo dezenas de pessoas indicando corrupção e favorecimentos, além de documentos, fotos, extratos bancários e inclusive documentos encontrados na casa do réu, ainda assim é preciso prova, quer-se um recibo que ateste que o réu recebeu valores por conta de um favorecimento de corrupção.
- Quem tem foro privilegiado não é processado porque o STF não tem tempo de fazê-lo!
- Prisão só em segunda instância. E mesmo quando você é condenado e depois de condenado volta a delinquir, ainda assim tem direito a habeas corpus, não importando mais a primeira condenação.
- Mulher com filhos pode cumprir prisão preventiva em casa, desde que seja rica e poderosa.
- Sendo rico, poderoso e homem, você pode cumprir prisão preventiva em casa se conseguir sacar milhões de reais do patrimônio que deveria estar bloqueado, e a Justiça lhe autoriza!

E isso aí é só um resumo do show jurídico de horrores, onde a letra da Lei não é mais observada, substituída por sua interpretação momentânea à guisa da incapacidade das instituições de cassarem mandatos, expulsarem quadros partidários e impedirem o uso da máquina política-governamental na obstrução da justiça e na manipulação dos recursos públicos para enriquecer uns poucos e inclusive financiar regimes políticos no exterior.

A Lei, no Brasil, deixou de ser um marco obrigacional, ela virou o ponto de partida para se discutir o limite da legalidade que se pretende caso a caso. E a culpa disso é da classe política desonesta e do Judiciário frouxo, incluindo sua cúpula, já que o STF tem se prestado a alimentar a chicana constante na exata medida em que não decide, em que não trata dos inquéritos contra políticos de sua competência e em que mantém um regimento dúbio, em que a competência de cada ato é sempre discutível.

Mas o que esperar de um país governado por um conjunto de indiciados, réus e portadores de ficha corrida policial, encastelados por uma Constituição que lhes garante foro privilegiado? O que esperar de um país onde os políticos vão sendo acusados de corrupção, mas são tratados como "acusados" mesmo com montanhas de provas contra eles, a ponto de sequer se discutir sua inclusão dos quadros partidários aos quais fazem parte? O que esperar de um país onde o depoimento de um réu indiciado causa uma operação de segurança jamais vista na história e depois um evento político para o fã-clube de um meliante contra quem paira um conjunto de indícios probatórios?

A questão deixou de ser a delação premiada de algum beneficiário do Estado gigantesco e paquidérmico, que tudo controla, que em tudo impõe burocracia e que ao mesmo tempo usa generosamente suas empresas estatais para comprar apoios.

Petrobrás, Eletrobrás e BNDES são apenas interruptores de um sistema elétrico de corrupção endêmica, que desde a fundação do país vem garantindo aos amigos dos políticos a condição de cidadãos de primeira classe, à custa dos cidadãos das demais classes, que são os contribuintes de um Estado que aumenta impostos todos os anos, que impõe burocracia insana em todas as atividades, que atrapalha quem quer produzir, que protege cartéis e trustes, que negligencia educação, que não dá saúde e que é conivente com a violência da sociedade acuada, sem proteção policial ou institucional. Um Estado que prefere ver o cidadão desempregado recebendo esmola do Bolsa-Família a ter um emprego e renda para manter sua família com dignidade.

O Estado brasileiro é doente. É tão doente que chega a ter funcionários recebendo 10 vezes o teto remuneratório constitucional. É tão doente que não consegue concluir uma obra pública por mais prosaica que seja, dentro do prazo e de um orçamento razoável. É tão doente que exige que, para se vender um simples alfinete, o comerciante emita-se uma nota fiscal previamente autorizada, exigindo dezenas de códigos para que ela seja validada.

É isso que o Estado brasileiro faz. Ele dá esmolas para o eleitor e fortunas para o financiador do candidato. Ele  controla a atividade econômica a ponto de torná-la inviável, mas faz vistas grossas para quantias inimagináveis de dinheiro que agentes estatais manipulam em favor de uns poucos.

E entre estes ungidos que operam as falcatruas com o dinheiro público e o povo estúpido, gente como eu, que paga impostos, que se mata para manter a contribuição previdenciária em dia para se aposentar com no máximo 5200 reais, que sofre com desemprego, que não sai de casa com medo de ser assaltado, que não pode mandar o filho para uma escola pública porque ela só ensina ideologia de quem não gosta de trabalhar, que tem que pagar plano de saúde porque o SUS não funciona, etc... Entre os ungidos e gente como eu e você, estão os eleitos, que gozam das mais elaboradas mordomias, pagas por governos que não garantem saúde, educação e segurança, mas nos quais não faltam jatinhos, viagens internacionais, verbas de representação, salários mais altos que das funções similares da iniciativa privada e aposentadoria especial, integral e corrigida anualmente por índice superior ao da inflação oficial. Os eleitos tem dezenas de assessores bem remunerados, quotas para passagens aéreas, apartamentos funcionais e casas oficiais. Toda uma estrutura de facilidades e prazer posta à disposição dos eleitos, que em suas campanhas, gastam muito mais do que receberão de salários durante o mandato inteiro.

As delações premiadas geraram um clima apocalíptico periódico no país. Ora a Odebrecht denuncia milhares de políticos, ora a JBS diz que todo mundo recebia prenda eleitoral em troca de empréstimos generosos e subsidiados do BNDES. As vezes é na Petrobrás que se descobre que a diretoria autorizou a aquisição de uma refinaria inútil por 10 vezes seu preço de mercado, de vez em quando a Eletrobrás descobre que cobrou tarifas ilegais. Ora é uma Copa do Mundo caríssima, as vezes é uma Olimpíada inviável. E a cada delação um novo escândalo, e a cada escândalo, fogem mais investidores, mais empresários honestos fecham as portas, mais gente perde o emprego e mais os políticos aumentam os impostos para manter as máquinas que lhes garantem suas mordomias. E a cada aumento de imposto o país se torna menos viável e competitivo e quem paga a conta final é sempre o você (e eu) que só vê a vida piorar em direção à miséria igual à da Venezuela e de Cuba!

A cada pequeno apocalipse, mais processos, mais políticos se dizendo honestos e chamando a militância idiota para defendê-los, mais atos judiciais, mas poucas prisões, porque o STF não deixa, porque a prova é ilegal, porque faltou uma vírgula no mandado. Só o que fica é o clima de fim do mundo.

Ora, a cada delação deveria seguir-se uma série de prisões efetivas, de perdas de mandato, de apreensão de bens, de auditorias nos órgãos públicos... mas não, a partir daí a desculpa é o "estado de direito" o "devido processo legal" contra os "acusados", que todo mundo com mais de um neurônio sabe que são culpados. Quando é para livrar a cara dos políticos, interpreta-se a Lei, quando é para prendê-los, é a Lei e nada mais.

É o apocalipse periódico, que vai extinguindo a vida dos brasileiros que não recebem propina.. só a deles!



16 de mai. de 2017

NÃO É LULA CONTRA MORO


Uma denúncia criminal só pode ser aceita com prova material do delito e indícios de sua autoria. Um juiz não faz persecução penal, ele recebe a denúncia-crime, à aceita e analisa as provas a partir dos pedidos das partes, cabendo-lhe a (árdua) tarefa de condenar ou não, a partir de provas que são juntadas aos autos pelo Ministério Público, os assistentes de acusação e o réu.

Ou seja, é o Ministério Público que faz a persecução penal, é ele quem persegue a pena condenatória, o juiz tem por função analisar se efetivamente o crime está materialmente provado e demonstrar nas justificativas da sentença o nexo de causalidade entre a existência do crime e o suposto autor dele, o indiciado.

É um conceito simples, que qualquer profissional do Direito tem a obrigação de saber.

Certa feita, Jânio Quadros analisava um discurso redigido por um assessor e lhe disse: - lindo, bem escrito, mas onde estão os inimigos? Ele queria dizer ao assessor que o povo não entende discurso técnico, de modo geral, as massas só entendem o "eu contra alguém", ou "o alguém contra mim", ou seja, é preciso ter um inimigo.

O ex-presidente Lula tem por estratégia política e processual se vitimizar. Ele tenta convencer o eleitorado de que está sendo vítima de uma perseguição do Judiciário, capitaneada pelo juiz Sérgio Moro, que na sua visão defensiva está forjando provas e forçando depoimentos para incriminá-lo. Imagina que transformando a discussão em fato político, pode requisitar a medida processual que bem entender, arrastando o processo até (em tese) estar eleito, quando então uma prisão viraria grave crise institucional, não sem desconsiderar o foro privilegiado.

O problema, para Lula, é que uma defesa política necessita de um inimigo bem definido, alguém contra quem se opor, com quem possa se comparar. Lula teve vários inimigos durante sua carreira. Começou com Collor, depois passou a ser FHC (apesar de serem amigos). Após isto, elegeu Aécio Neves.  Hoje, Collor, FHC e Aécio são politicamente irrelevantes, não representam mais absolutamente nada até porque o primeiro foi absorvido pelo lulismo e os dois restantes tem força eleitoral relativamente pequena, já que não se conseguiu fazer do PSDB uma força bem definida sobre o que quer que seja, é um partido meramente adesista.

Já o Ministério Público não tem rosto, nem endereço, nem dá declarações. A força-tarefa da Lava Jato sempre se manifesta por meio colegiado, dificilmente algum dos promotores assume solitário qualquer declaração ou ação processual. Já um juiz é um órgão institucional em si mesmo, porque ele decide sozinho em primeira instância. Logo, ao invés de insurgir-se contra o MP, Lula preferiu Moro, quem tem rosto, voz, cujas decisões são efetivas em razão da função que exerce. Passou a ser o inimigo perfeito, o algoz das quimeras políticas do ex-presidente, alguém contra quem se pode direcionar as reclamações, porque a imprensa buscará seu depoimento. Enquanto a campanha política não se inicia, Moro é perfeito, depois, pode ser que as baterias sejam voltadas para algum candidato que ameace a candidatura do ex-presidente.

Também existe um movimento bem claro de incutir na opinião pública que não existem provas. Se há vários delatores, se há documentos, se há circunstâncias, se há várias testemunhas, há provas, e não poucas. Mais que isso, se não houvesse prova material do crime e indícios de autoria, os tribunais já teriam encerrado as ações penais em curso contra Lula preliminarmente, por pura e simples nulidade, mas nem o STF chegou a sequer aventar tese assim. Assim, enquanto a sentença não sai, existe prova material do crime e um indiciado, só se pode afirmar que não há prova a partir da fixação do nexo de causalidade que aparece com a sentença, cuja função é ligar o crime existente ao suposto autor.

Sem contar o absurdo de imaginar que um caso de corrupção terá recibos. Corrupto nenhum em lugar nenhum do mundo dá recibos do que recebe irregularmente, corruptos tendem a ocultar bens e evitar documentos. Contra eles, a prova é quase sempre circunstancial, o que exige que o Judiciário se convença da culpa a partir de um conjunto probatório farto e consistente, muito embora obtido por construção lógica.

O Lula X Moro é uma peça de marketing, adotada inclusive por certos setores da imprensa, que parecem não entender, ou não querer entender como se desenrola um processo judicial, e acabam aceitando o mote dos inimigos viscerais em clima de Fla-Flu em prejuízo das instituições. 

3 de mai. de 2017

LE PEN, TRUMP, BREXIT, NACIONALISMO... O PÊNDULO HISTÓRICO



Se observarmos um pouco a história recente da humanidade, veremos que pelo menos desde o fim da Segunda Guerra o nacionalismo hibernou. Países de patriotismo exacerbado como a Alemanha e a França abriram mão de parte de sua soberania em prol da União Européia, atraindo outros, menores e menos poderosos, mas historicamente também nacionalistas, como a Grécia, a Polônia e a Áustria, juntando-se aos que eram historicamente mais propensos à abertura de suas fronteiras, como a Inglaterra, a Itália, Portugal e Espanha.

No limiar da Segunda Guerra, França, Alemanha e EUA eram potências ensimesmadas, mesmo com a França ainda administrando um império colonial. Foi a mudança de status da Alemanha, para um nacionalismo agressivo e conquistador que mudou isso, e causou a onda internacionalista que seguiu nos 70 anos seguintes, em maior ou menor grau, até decorrente da necessidade de ajuda externa para recuperar o continente europeu.

Do outro lado do Atlântico, o país que até meados da Segunda Guerra era isolacionista (que não deixa de ser um aspecto nacionalista) porque sua economia se bastava em si, os EUA, passou a promover o livre comércio a partir da lição recebida na própria guerra, que o tirou da mais grave recessão de sua história e o alavancou para o status de superpotência mais rica e poderosa do globo, ofuscando até o império colonial que o criou fundado no conceito de livre tráfego de riquezas.

Claro que o medo de um novo conflito também impulsionou a internacionalização, mas o fato é que a Europa e os EUA descobriram com a grande guerra, que o mundo era ávido por livre comércio, menos regulamentações, menos alfândegas e fronteiras, menos entraves para a comunicação e o transporte de um lugar para o outro. O desenvolvimento dos meios de transporte e comunicação também contribuiu para se formar um conceito de "aldeia global" que prometia riqueza e progresso para todos, mas que falhou ao deparar com o radicalismo islâmico, em face de inúmeros fatores, entre os quais menciono a obsessão ocidental em exportar democracia, mesmo apenas conceitual, e a dependência que o mundo adquiriu ao petróleo, que gerou intervenções desastrosas e injustiças em boa parte pobre do globo.

O mesmo internacionalismo que pregava livre comércio, União Européia, NAFTA, Mercosul, Pacto Andino, OPEP e dezenas de outras ações econômicas, também quis exportar um modelo democrático que nem sempre era adequado aos países. Caíram impérios, monarquias e ditaduras pelo mundo afora, substituídos muitas vezes por regimes depauperados e incapazes de manter coesas suas sociedades, gerando guerras civis e o fenômeno da migração forçada de refugiados e de combatentes, mola mestra do terrorismo global que causa pânico nos países ricos.

Dizem que o mundo que aprovou o Brexit, elegeu Donald Trump e reforçou imensamente o capital politico de Marine Le Pen da Força Nacional está em divisão ideológica. Mentira porque ele já era dividido bem antes disso, com a diferença que, de modo geral,  experimentava-se um viés internacionalista, que dava força às políticas socialistas, democratas-cristãs e sociais-democratas, que pregavam uma sociedade global ao mesmo tempo em que internamente limitavam os direitos de seus cidadãos.

O que estamos vendo é uma reação natural, uma nova guinada ao nacionalismo. Cidadãos amedrontados com o terrorismo e cansados do discurso de liberdade e fronteiras abertas, que forçam a diminuição da liberdade interna. Estes cidadãos estão migrando seus votos para a direita e a extrema-direita, que prometem justamente o contrário - mais liberdade interna e menos internacionalismo econômico -  economias que não exportem empregos para outros lugares, acumulação de riqueza interna, menos ajuda para o externo.

É uma daquelas guinadas históricas. Ouvi um historiador dizer que, na última vez que o mundo guinou ao nacionalismo, isso causou duas guerras mundiais. Mas arrisco dizer também que o internacionalismo também está acabando com uma guerra mundial, embora ela seja assimétrica e não declarada por estados nacionais. Vivemos uma guerra do radicalismo islâmico (não do Islã) contra o modo de vida ocidental, com uma reação que, se não é militar, é tão radical em suas idéias como se fosse, de restituir o status nacional em prejuízo do internacional.

No futuro imediato é provável a assunção de líderes que preguem nacionalismo, alavancados pelo medo causado por esta guerra de fim de ciclo internacional. Não será algo novo na humanidade, nem se pode afirmar que será bom ou mal, será apenas o pêndulo da história voltando para o outro lado.



CORITIBA: O MEDO DO FUTURO.

No erro de uma diretoria interina, que acionou a justiça comum em 1989 para não jogar uma partida marcada de má-fé pela CBF para prejudicar ...