Induzir a confusão de reforma da previdência com fim da aposentadoria é criminoso, atenta contra o futuro de todos os brasileiros.
Se confirmado o atual cálculo atuarial sem que se faça nada para adequar a previdência, em breve o governo brasileiro terá de abrir mão de programas sociais que lhes são facultativos (não são políticas de Estado, não são definidas como obrigatórias) como o Bolsa-Família e o Seguro-Desemprego, deixando de pagá-los para quitar as obrigações carimbadas, no caso, as aposentadorias.
Se nada for feito, em um prazo adicional à isto, os governos brasileiros começarão a ter de escolher entre gastar ou com a previdência, ou com a saúde, ou com a segurança pública. Não haverá recursos para todas elas, a tendência é que todas percam verba.
E se a inércia continuar, em determinado momento futuro o governo federal fará como os governos falidos do Rio Grande do Sul, Minas Gerais e Rio de Janeiro: passará a parcelar os pagamentos tanto de ativos, quanto de aposentados.
E se mesmo assim não se fizer uma reforma, chegará o dia em que os governos simplesmente não pagarão mais uma parte dos aposentados ou vão retirar parte dos rendimentos, em razão da necessidade de manter serviços públicos mínimos.
E quando isso acontecer, os primeiros a serem prejudicados não serão os nababos que recebem aposentadorias de 6 dígitos, estes têm uma enorme rede de proteção que inclui um Judiciário elitista que certamente dará liminares em favor de ex-desembargadores ou ex-auditores fiscais, mas que vai ignorar os aposentados que recebem salário mínimo, estas pessoas que não têm dinheiro para pagar advogados e custas judiciais, e que são pessimamente atendidas pela Justiça dativa mal estruturada no país inteiro.
Reformar a previdência não era, certamente, uma tarefa que nenhum presidente do passado queria assumir. FHC, Lula e Dilma se desgastaram tratando disso, tiveram oposição ferrenha até mesmo dentro de seus próprios partidos. Michel Temer teve a chance de ouro de conseguir uma reforma parcial que daria um respiro atuarial de alguns anos, foi barrado pela denúncia Janot/Joesley. Todos eles, se pudessem, nem tocariam no assunto, é muito mais fácil ser governante sem mexer em vespeiro, o problema é que governar exige olhar para o futuro, e neste, o vespeiro sempre aparece no horizonte.
A reforma da previdência que vem por aí não é do Bolsonaro, porque se ela representa um número baixo, digamos, 400 bilhões de reais em 10 anos, significará uma economia que não chega a 1/3 do déficit público de 2018 em dois governos e meio.
Aliás, se esta reforma que vem sendo discutida desde o governo Dilma for aprovada nestes termos, imediatamente após sua sanção ou promulgação, será necessário iniciar outra discussão sobre o mesmo assunto, porque as previdências dos militares, dos funcionalismos estaduais e municipais não terão sido atacadas.
O governo Jaime Lerner instituiu o Paraná Previdência, que é a entidade que administra as aposentadorias dos funcionários públicos estaduais. A idéia inicial era capitalizar as contribuições dos funcionários e do próprio estado. Mas o estado NUNCA honrou a sua parte (com os governadores Roberto Requião e Beto Richa) e além disso, recentemente aprovou-se uma lei segundo a qual, está isento de honrar tanto os compromissos passados quanto os futuros. Resultado: o cálculo atuarial simplesmente não encontra recursos para honrar as aposentadorias em 15 ou 20 anos.
É um problema colossal que se repete nos demais estados e em previdências municipais, em um país onde a expectativa de vida cresce todos os anos.
Que pode, é verdade, ser amenizado com crescimento e recuperação da economia. Mas amenizar não é solucionar.
Se o atual governo aceitar o desgaste que terá para discutir a previdência, em aprovando qualquer reforma estará prestando um enorme serviço ao país, inclusive aos governantes futuros, sejam eles da situação, sejam da oposição.
Vivendo em uma democracia, é provável, aliás, é certeiro que em algum momento futuro a oposição voltará a governar o país. Há quem prefira assumir um país totalmente quebrado e inviável, porque isso abre chance para discursos salvacionistas, demagogia e no fim das contas, ditadura. Mas acreditando na democracia também se pode dizer que mesmo a oposição séria tem interesse em reformar a previdência.
Portanto, quem disser que a reforma quer acabar com a aposentadoria, certamente tem um pé no regime de exceção. A questão precisa ser discutida, ninguém está pedindo que a oposição não apresente alternativas, mas fazer nada não é alternativa, e todo mundo sabe disto!