Ensinar esportes não deve ser uma busca por medalhistas, precisa ser um exercício de cidadania.
O Brasil tem um povo vaidoso com um governo que se aproveita disto. Achamos que vitórias, medalhas e títulos diminuem nossos problemas, quando em verdade só aliviam nossa sensação de impotência ante a tantas coisas que não resolvemos porque nossos políticos não tem nem competência, nem vontade para atacar.
Incorremos no erro de buscar os fenômenos individuais das modalidades para fazer deles medalhistas e celebridades. Merecidamente eles viram ídolos, tais como Gustavo Kuerten, Joaquim Cruz, Flávio Canto, Hortência, Gustavo Borges, Daniele Hipólito, Servílio de Oliveira, etc... Daí eles se aposentam, e o esporte diminui ou desaparece do cenário porque não aparecem fenômenos todos os dias e eles sozinhos não deixam uma tradição no ensino da modalidade não porque não queiram, mas porque seu país valoriza demais os resultados e de menos o trabalho de formação e a pura e simples prática recreativa.
É preciso ensinar esportes para as crianças e adolescentes todos os dias e mais do que isso, mostrar para eles todo tipo de modalidade, informá-los das muitas possibilidades, dar-lhes a opção de conhecer e despertar interesse para o que tenham vocação, se é que à tenham.
Escrevo isso em época de olimpíada, para dizer que esporte é antes de tudo uma parte da formação de um bom cidadão, devia ser um elemento importante e obrigatório do sistema educacional, representando a procura por disciplina e saúde.
Não se deve ensinar esportes nas escolas focando nos resultados, mas para mostrar as boas coisas que ele retorna à pessoa. O aluno que aprender esportes na escola e tiver o talento, naturalmente acabará adotando a profissão de atleta, vai treinar e buscar resultados. É assim nas potências esportivas, elas formam cidadãos melhores que aprendem a seguir regras, respeitar os adversários e praticar por prazer, ao mesmo tempo em que formam atletas de sucesso potencial.
O professor Paulo me acompanhou desde a segunda série do primário até a primeira do colegial.
Boa praça com os alunos, amigão de todo mundo, não havia gente na escola que não gostasse dele. Era o professor da diversão, do futebol, do basquete, do handebol, das corridas e dos passeios à pé pela cidade. Quando precisava de silêncio dizia um "tá agitada, Creuza?" e sendo a sala quase sempre só de garotos, voltava ao silêncio, segurando o riso.
Mandava fazer trabalhos sobre esportes, tínhamos que pesquisar regras, atletas e competições. Quando chovia, aproveitava esses trabalhos e fazia brincadeiras de perguntas e respostas, perguntava dos resultados das olimpíadas, dos panamericanos, da copa, do campeonato brasileiro. Os alunos aprendiam regras, conheciam os astros do esporte, se divertiam nos erros das equipes alheias, mas sempre em silêncio, algazarra só era permitida até ele fazer a próxima pergunta.
Um dia os alunos estavam agitados. Era para montar 4 times para um torneio de handebol, naquela linha de ir escolhendo e deixando os piores para o final. O problema é que por mais que ele pedisse silêncio e mandasse parar com as palhaçadas, não conseguia.
Daí se irritou. Apitou forte, disse que o handebol estava cancelado e mandou formar duplas com o aluno que estivesse mais próximo. Seguiu-se a pior sequência de exercícios que eu e todo mundo ali tinha feito na vida. Abdominal, carrinho (consistindo em um dos alunos segurar as pernas do outro e atravessarem a pista com os braços fazerem as honras da roda, trocando para voltar), corrida em torno da escola e um monte de outras atividades chatas que ninguém gostava.
No final da aula, todo mundo exausto, uns olhando pros outros com cara de culpados, foi curto e grosso: sem comportamento, todas as aulas seriam iguais àquela. E nunca mais, inclusive nos anos seguintes, aconteceu de alguém cair na besteira de sair da linha.
Mesmo eu, que sempre fui um desastre completo em todos os esportes, sempre tive empatia, era um professor que nos ensinava um valor que não esqueci nunca, o da disciplina em observar regras por ser parte de um todo.
Eu e meus colegas aprendemos boas coisas sobre o esporte. Não saiu daquele colégio nenhum campeão de nada, mas bons universitários, bons pais, bons profissionais, bons funcionários, bons cidadãos. Gente que, via de regra aprendeu a respeitar para ser respeitado.
Esporte é muito mais o que o professor Paulo nos ensinava do que resultados, medalhas, glórias e aparições da TV. Esporte é escola de disciplina. Medalhas e vitórias são um bônus para quem aprende a fazer dele um gerador de cidadania.