17 de set. de 2015

CONCILIAÇÃO: OS PARTIDOS POLÍTICOS NO BRASIL

I – Introdução.

Sempre digo que o Brasil não tem partidos políticos verdadeiros e que a única entidade entre nós assemelhada a um deles é o PT, onde é possível vislumbrar algum tipo de orientação ideológica e hierarquia em relação às lideranças, elementos sem os quais simplesmente não funcionam as organizações que nós brasileiros costumamos seguir como exemplo de tanto em nossa novel democracia, e que são os seguintes:

- o Partido Comunista da extinta URSS;
- o Trabalhista (“Labor”), os Liberais (“whigs”) e os Conservadores (“torys”) britânicos;
- Democrata e Republicano dos EUA.

Em verdade, nós, brasileiros, adotamos um conceito errado, de que os partidos são um meio necessário para atingir um objetivo, o cargo público.

Deveríamos considerar o partido político como um instrumento organizador de políticas públicas, mas isso não acontece por vários fatores, como o histórico-cultural, o econômico, o estrutural e outros menores.

Do fator histórico-cultural eu vou tratar nesta matéria, a partir do item II.

Porém, há que se afirmar que o fator econômico é preponderante na organização política brasileira. Li dias atrás, e peço desculpas ao leitor por não citar a fonte, que há muita gente no Brasil que gostaria de votar em pessoas que defendem políticas públicas verdadeiras, mas a situação econômica acaba levando a deferir o voto a quem oferece o alento necessário naquele momento específico antes ou depois do sufrágio. Muita gente no Brasil entende que a época de campanha política é para se esbaldar, ganhar presentes e aliviar um pouco a situação dolorosa do dia a dia. Não se pensa em longo prazo, nem no país, mas no que o candidato pode aliviar a situação individual do agente no agora.

Há ainda um aspecto mais grave, o estrutural. Eu chamo de estrutural porque é algo afeito do Estado brasileiro como uma máquina. Uma máquina política extremamente amadora, onde de uma eleição para outra o novo chefe do Executivo (e mesmo os integrantes do Legislativo) procede centenas ou milhares de exonerações e nomeações para cargos em comissão, deferidos a parentes, amigos, correligionários, membros do partido que o elegeu ou ainda, membros de partidos que prometem apoiá-lo durante o mandato. Ou seja, o partido político e a militância são o caminho para um emprego bem remunerado, onde os salários nunca atrasam e onde não é necessária grande qualificação, senão a de lealdade a um “cacique”.

Cada item destes dá margem a enormes discussões, monografias, teses de mestrado e doutorado, quero apenas escrever aqui uma impressão pessoal a partir de certos dados históricos, o que faço a partir do item II.

II – No Império: O poder pelo poder.

Os partidos políticos do império tiveram gênese no debate entre quem aceitava ou não a independência.

Vencida essa discussão, iniciou-se outra, segundo a qual buscava-se mais autonomia das então províncias, com a instalação de instituições republicanas à margem da monarquia, diminuindo, claro, o poder do imperador e distribuindo-o entre os pequenos poderosos locais.

Mesmo assim, não se podiam chamar de partidos. Suas denominações eram muito mais uma classificação de ânimos em relação aos assuntos, do que aparatos partidário-ideológicos.

Por volta de 1837 surgiram as primeiras instituições nacionais que poderiam ser chamadas de “partido”, mesmo considerando que a política, na época, era uma atividade exclusiva de senhores de terra e escravos, pessoas de mesma classe social, cujas opiniões pouco divergiam sobre assuntos importantes, de tal maneira que até o fim do segundo império vigeu uma situação de desinteresse do grande público pelas lides políticas, sempre centradas em uma prática que permeou a política brasileira em toda a sua história, a conciliação, que mantinha o poder centralizado na corte, a despeito dos reclames provinciais por mais autonomia, com contrapartida no atendimento de interesses específicos de líderes locais.

Na teoria, os Conservadores eram adeptos da centralização de poder, tinham bases rurais. Os Liberais o contrário, tentando fortalecer oligarquias provinciais dando-lhes autonomia, eram mais apreciados nas áreas urbanas. Apenas em teoria, pois já na época constatou-se um defeito inerente à toda história política brasileira: os partidos não mantinham unidos por ideologia, mas apenas por interesses pontuais de seus próceres.

CARLOS DELMIRO DA SILVA SOARES(1) é feliz em afirmar que esses “...dois partidos não apresentavam diferença ideológica marcantes, aceitando ambos a filosofia Liberal Clássica, de pouca intervenção do Estado no domínio econômico e outras características próprias do Liberalismo do século XX...” e ainda cita as historiadoras Maria Célia Freire e Marlene Ordonez (2) que escreveram o seguinte: “Na prática, esses partidos funcionavam independentemente de sua ideologia e não eram orientados pelos seus princípios. Lutavam apenas pela posse do poder. Havia elementos do Partido Liberal, bastante conservadores em duas idéias, e conservadores que apresentavam projetos de reforma progressistas. Tudo dependia das conveniências.”

III – Na República Velha.

A República foi uma conseqüência do enriquecimento das províncias de São Paulo, Minas Gerais e Rio Grande do Sul, cujo poder econômico passou a preponderar, enfraquecendo o Império, a figura do imperador e uma parte das oligarquias monarquistas. Também foi uma decorrência do tímido debate no Império sobre a autonomia provincial, que foi evoluindo junto com a economia das mais fortes entre elas e consequentemente, com a formação de novas elites que não dependiam de trabalho escravo e apenas da exploração de terras.

SP, MG e RS experimentaram fenômenos chamados de partidos republicanos desde a década de 1870, o que coincide com o enfraquecimento econômico da corte. Em verdade, eram organizações locais que abraçavam a causa da autonomia das províncias (ou por ideologia republicana, ou por interesses locais, o que, sabemos, preponderou) ou que, antevendo que a escravidão já não representava muito em termos econômicos, lutaram pela abolição.

O fato é que, proclamada a República, a situação partidária pouco se modificou.

VOLTAIRE SCHILLING (3), do canal de história do portal Terra é muito feliz em comentar que a proclamação da República “...contou com escassa presença de republicanos autênticos...” , basicamente porque ela não decorreu da militância partidária em favor do novo regime.

Tenho que ela foi ocasional, apenas para alinhar interesses e embarcar novos integrantes ao regime, quais sejam, os potentados econômicos urbanos de SP, MG e RS.

E podemos concluir por isso quando constatamos que tão logo iniciaram os primeiros embates políticos, a política de conciliação reapareceu no grande movimento de “conversão” segundo o qual o historiador HÉLIO SILVA (4) informa que “...muitos monarquistas aderiram espontâneamente à nova causa...” e ainda que “...havia um interesse comum de refrear ambições e rivalidades em benefício da República...”.

A República Velha acabou marcada pela inexistência de forças políticas nacionais e homogêneas, que dizer de partidos, pois os ditos “partidos” regionais eram representação das oligarquias e coronelismos de cada estado.

Se no Império havia algo parecido com partidos nacionais, esses cindiram e cada uma de suas lideranças resolveu fundar a própria força política, não dando espaço à criação de instituições nacionais, o que acabou implicando num constante debater e puxar de armas pelo país afora, em vista das sempre presentes insatisfações regionais em um sistema caótico.

Caótico porque os estados economicamente hegemônicos eram SP e MG, do que adveio a política do “Café com Leite” que garantia certa estabilidade mas implicava muita insatisfação ao deflagrar a corrida sucessória na metade do mandato do presidente, sempre acabando com a escolha de um paulista ou mineiro. Isso gerou quarteladas por todo o lugar e presidentes que pouco produziram em termos de conquistas econômicas e sociais.

Sobre esse estado de coisas, o historiador HÉLIO SILVA (5): “...A gênese da candidatura do último presidente constitucional da República Velha foi a repetição dos conciliábulos de que falavam mal os políticos, quando não se podiam beneficiar deles. Não havia partidos políticos, mas simples rótulos vistosos, atrás dos quais os políticos se agrupavam, de acordo com suas conveniências. Não havia voto livre, mas a fraude generalizada, oficializada, praticada pelo Governo e pela oposição, porque não existia sequer outra forma de eleição...”
Enfim, um caos controlado onde as oligarquias se debatiam mas mantinham as rédeas da coisa, sem qualquer resquício de ideologia ou verdadeira organização partidária, até que os acontecimentos levaram a um levante e à ditadura Vargas.

IV – De Vargas à Revolução de 1964.

Vargas foi alçado ao poder por uma série de fatores, entre os quais, pelo menos eu entendo assim, não se encontra a política-partidária.

Ele representava o nacionalismo em moda na época, em um país que experimentava os efeitos da crise mundial de 1929 e no qual as lideranças políticas de há muito não apresentavam qualquer resquício de eficiência ou capacidade de realizar conquistas econômicas e sociais, mais preocupados em garantir a hegemonia das oligarquias de sempre.

Foi uma conjunção de fatores, mas não o partidário, basta lembrar que Vargas era representante de um partido regional, com os mesmos defeitos e pretensões dos que existiam em SP, MG e nos demais estados e também não deixou utilizar se da velha política de conciliação, tal qual os políticos do Império e da República Velha.

BÓRIS FAUSTO(6) cita que “...A ‘guerra paulista’ produziu efeitos contraditórios. De um lado, demonstrou ao governo Vargas e a Getúlio em particular que, apesar da vitória, era preciso cooptar pelo menos uma parte da elite paulista, e não confrontá-la abertamente ...”.

Vargas não era algo exatamente novo, mas na qualidade de ditador a sufocar opositores e centralizar o Estado pôde apresentar conquistas econômicas e sociais e enfrentar a crise mundial.

Ele foi o primeiro líder republicano nacional e sua popularidade era sabidamente imensa em todo o país, o que forçou ao arranjo de forças políticas heterogêneas que buscavam confrontá-lo. BÓRIS FAUSTO (7) cita que, com a Constituição de 1934 “As eleições marcaram um florescimento partidário como nunca existira no país, ainda que a grande maioria das organizações tivesse cunho regional.”.

O leitor se atenha na expressão “grande maioria”, que mostra que já havia resquícios de organizações nacionais, certamente considerando a popularidade do presidente em todos os estados do país.

Entre idas e vindas, avanços e retrocessos, a ditadura de Vargas gerou a tenebrosa Constituição de 1946 que, se por um lado ajudou a desenvolver os primeiros partidos de cunho nacional (PTB, PSD e UDN), por outro, era idealista demais, a ponto de prever coisas como a eleição separada de presidente e vice.

O sistema partidário passou a ser nacional, mas nem por isso funcionou. O diplomata JOSÉ GUILHERME MELCHIOR, citado por RONALDO COSTA COUTO (8), comenta sobre a situação de 1964 que: “...Instabilidade governamental, desintegração do sistema partidário, virtual paralisia da capacidade decisória do Legislativo...”.

A Constituição se manteve enquanto os presidentes foram Dutra e Vargas, ainda na esteira de poder do popular ex-ditador. Mas foi um dos estopins da verdadeira guerra acontecida durante o governo JK, quando uma oposição passou a ter influência no Poder Executivo, onde era representada pelo vice-presidente João Goulart, sem contar que JK não agradava em nada a UDN, partido das antigas oligarquias que nunca enfrentou (por não ter coragem para isso) Vargas a não ser no final de sua vida quando já no ocaso de sua carreira política.

Mas JK também conciliou na medida do possível e conseguiu encerrar seu mandato.

A Constituição de 1946 foi responsável direta pelo golpe de 1964 porque fragmentou o governo de 1960 em dois: o de Jânio, de direita, e o de João Goulart, de esquerda, o que acirrou o debate político num país influenciado pelos EUA e num mundo polarizado.

Eu, pelo menos, penso de Jânio sentiu essa instabilidade e tentou dar um golpe para tirar o PTB e Goulart da parada, acalmar os ânimos e tentar governar com os resultados econômicos que tiveram Vargas e JK, quem sabe até virando ditador, coisa que não conseguiria fazer porque absolutamente nada era possível com a relação de forças parlamentares da época. Não parecia ter ânimo conciliatório, mas não foi verdadeiramente testado sobre isso.

Jânio caiu e a vez de Goulart chegara. Jango, porém, não agradava nem o PSD nem a UDN e ficou isolado, com apoio apenas do PTB.

Daí veio o parlamentarismo enterrado pela inexistência de partidos, porque não conseguia a mínima estabilidade para manter gabinetes funcionais.

Voltando ao presidencialismo, Jango assumiu sem mínima condição de tomar medida econômica alguma que apresentasse resultados efetivos ao país. Daí apelou para as promessas de resgate social e se aproximou do comunismo, o que não funcionou, porque a população brasileira ainda era predominantemente rural, religiosa e extremamente conservadora. Há quem diga que ele também tentaria um golpe para se perpetuar no poder na qualidade de discípulo e sucessor de Vargas, mas não tinha apoio para tanto.

O maior artífice da sua queda talvez tenha sido Leonel Brizola, cuja retórica incendiária assustou os setores moderados da sociedade brasileira e afastou qualquer tipo de diálogo (conciliação) entre Jango e forças políticas que poderiam lhe dar mínima estabilidade para terminar o mandato.

Se Carlos Lacerda afastava os conservadores de Jango e fazia muito barulho a incomodá-lo, Leonel Brizola afastava os moderados e Jango ficou apenas com os "radicais" do PTB, não conseguindo qualquer resquício de conciliação.

O que aconteceu? A sociedade brasileira apoiou o golpe de 64 que pôs ordem no caos instalado desde 1960. Tanto apoiou, que só começou a discuti-lo em 1967, quando apareceram os primeiros opositores declarados e iniciou-se o endurecimento do regime.
V – O Bipartidarismo na Marra.

Em 1965, o Ato Institucional nº. 2 impôs o bipartidarismo.

A ARENA, formada pela antiga UDN e uma parte do PSD, uma união das oligarquias locais devidamente conciliadas ao estilo do Império, da República Velha e de certos momentos de Vargas. O Executivo impôs uma espécie de silêncio a todos, se bem que não conseguiu lealdade, pelo que se viu a partir do processo de redemocratização.

No MDB, os moderados do PTB e eventuais outros partidos não elitistas, que aos poucos foi conquistando adeptos entre elites não tão arcaicas quanto as agrupadas na ARENA. O grande mérito de Ulisses Guimarães, Tancredo Neves, Theotônio Vilela e outros, foi de aglutinar no MDB as muitas forças diferentes da oposição moderada, que fizeram a opção por não aderir às armas, mas a um embate político que duraria décadas entre marchas e contra-marchas.

Em 1979, com a Lei da Anistia, Brizola juntou-se a eles e com discurso moderado, como querendo redimir-se dos erros colossais do seu passado e trazendo pela primeira vez o ânimo de criar estruturas partidárias verdadeiras.

Em 1981, foi autorizada a criação dos ditos partidos modernos.

VI – Até hoje.

A firmeza da oposição ao regime mudou a opinião pública, que encontrou nela uma opção quando as medidas econômicas dos governos militares começaram a não funcionar mais, minando sua popularidade, que era grande até o primeiro Choque do Petróleo.

O MDB tornara-se PMDB, frente política que havia vencido as eleições em 1974 e 1978, que venceria as de 1982 e mostrava que, cedo ou tarde, governaria o país pela pressão popular por mudanças. Isso causou uma verdadeira debandada no PDS que sucedera à ARENA, e que foi minguando, porque os históricos oligarcas que o formavam foram para outras siglas novamente com o intuito conciliatório que marcou a política brasileira em toda a sua história, no sentido de todos terem seus interesses atendidos no poder central.

Ao mesmo tempo, pequenas siglas com algum caráter verdadeiramente partidário e ideológico foram se desenvolvendo, como o PT, o PCB e o PDT, este último muito mais pelo carisma e o histórico de Leonel Brizola.

O PMDB conseguiu o poder em 1985 compondo com o PP de Tancredo Neves (que foi agregado à sigla maior) e com os setores do PDS que fundaram o PFL, apoio oligárquico sem o qual não haveria transição democrática.

Em 1986, ao vencer as eleições de modo avassalador, virou o novo porto seguro das oligarquias remanescentes do processo inicial, de tal modo que o antigo PDS praticamente desapareceu do mapa político, em favor, novamente, de uma conciliação entre a oligarquia tradicional e novas forças políticas moderadas, nascidas na luta contra a ditadura.

E a conciliação continuou durante os anos Sarney, que governou aos trancos e barrancos até que a Constituição de 1988 permitiu a eleição de um presidente por um partido minúsculo, sem força parlamentar e dependendo de unir forças políticas diversas, mas sem muita vocação ou mesmo disposição para o diálogo com gente que tinha convicções completamente diferentes, como, em exemplo contrário, faz o presidente Lula nos dias de hoje.

Collor caiu por várias razões, mas uma das primordiais foi justamente governar em confronto direto com as oligarquias do resto do país, mesmo ele sendo de uma delas, a instalada em Alagoas.

FHC teve tais apoios e Lula os têm, e a política brasileira jamais deixou, salvo nos poucos meses de poder do “caçador de marajás” e anos de Jango, de adotar a prática conciliação.

VII – Conclusão.

Como o leitor notou, enfoquei o assunto a partir do termo “conciliação”, no sentido de um arranjo político a evitar embates entre opiniões diferentes, desde que compondo em questões econômicas e interesses pontuais de líderes locais.

Na história brasileira, essa conciliação sempre teve por finalidade dar a impressão de grandes mudanças na teoria do poder, mas mínimas na prática.

O que quero dizer é que a inexistência de forças políticas homogêneas e bem distintas sempre foi o grande entrave brasileiro à democracia. O Brasil nunca teve partidos, não os tem até hoje, porque o que existe são apenas arremedos e entre estes o PT é o mais desenvolvido.

A história política brasileira teria sido muito menos conturbada se tivesse partidos políticos bem definidos, quem sabe, desenvolvidos partir das estruturas Conservadoras e Liberais do Império, agregando-se uma corrente de esquerda moderada como o antigo PTB. Mas isso jamais aconteceu e implicou em o povo nunca desenvolver consciência política, e os governos nunca saberem exatamente quem os apóia e quem não, a ponto de um partido de nítido viés estatista e interventor da economia como o PT governar mediante ditames econômicos neo-liberais, se deixando apoiar por indivíduos que seus líderes sempre combateram de modo até histriônico, exatamente o que fez o PSDB durante seus 8 anos de governo federal, se bem que este é uma espécie de sucessor do MDB e, portanto, com vocação conciliatória.

A prática da conciliação pode ter impedido guerras civis, separatismos e regimes ditatoriais ainda mais radicais que os que experimentamos, mas ela roubou da população as idéias de alternância real de poder, de organização partidária e principalmente a de que o Estado não existe para privilegiar as classes políticas, mas para melhorar a vida de todos. Hoje, o sentimento generalizado é que o Estado existe pelos políticos, porque eles são maiores que seus partidos.

Notas:

(1) SOARES, Carlos Dalmiro da Silva. Evolução histórico-sociológica dos partidos políticos no Brasil Imperial. In http://jus2.uol.com/doutrina/texto.asp?id=1503.
(2) Citação item “1”
(3) SCHILLING, Voltaire. Partidos Políticos no Brasil. In http://educaterra.terra.com.br/voltaire/brasil/2003/08/18/003.htm.
(4) SILVA, Hélio. História da República Brasileira. Volume 1 – Nasce a República, Editora Três, São Paulo, 1998, p.76.
(5) SILVA, Hélio. História da República Brasileira. Volume 7 – O Fim da Primeira República, Editora Três, São Paulo, 1998, p.33.
(6) FAUSTO, Boris. Perfis Brasileiros: Getúlio Vargas. Companhia das Letras, São Paulo, 2006, p. 64.
(7) FAUSTO, Boris. Obra citada, p.67.
(8) COUTO, Ronaldo Costa. História Indiscreta da Ditadura e da Abertura. Editora Record, Rio de Janeiro, 1998, p.43.

Bibliografia:

- BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional. Editora Saraiva, São Paulo, 1980.
- CONTI, Mário Sérgio. Notícias do Planalto. Companhia das Letras, São Paulo, 1999.
- COUTO, Ronaldo Costa. História Indiscreta da Ditadura e da Abertura. Editora Record, Rio de Janeiro, 1998.
- FAUSTO, Boris. Perfis Brasileiros: Getúlio Vargas. Companhia das Letras, São Paulo, 2006.
- SCHILLING, Voltaire. Partidos Políticos no Brasil. Portal Terra, 2003.
- SILVA, Hélio. História da República Brasileira. 24 Volumes, Editora Três, São Paulo, 1998.
- SOARES, Carlos Dalmiro da Silva. Evolução histórico-sociológica dos partidos políticos no Brasil Imperial. Portal Jus Navigandi, 2008.

- Revista VEJA, Edição Especial República, 20/11/1989.

15 de set. de 2015

O PACOTE DILMA-LEVY



A hesitação, a paralisia do governo Dilma, a incapacidade da presidente em constatar os problemas e sua ânsia em não mudar nada que ofenda o PT e suas idéias patrimonialistas sobre o Estado, tiveram ontem outro capítulo da novela de horrores instalada no Brasil desde a vitória eleitoral em outubro passado.

Contrariando inclusive a voz dissonante do ministro Jacques Wagner, que pregava um corte profundo e imediato de despesas antes da propositura de medidas de aumentos de impostos, Dilma Roussef preferiu contemporizar, anunciando medidas paliativas e implorando ao Congresso pela recriação da CPMF, enquanto aumentou por decreto o que podia majorar sem a anuência do Legislativo e sem efeito inflacionário.

Pior, hoje a presidenta se reúne com 18 governadores, vai oferecer-lhes uma esmola, uma parte da arrecadação da CPMF para fazerem lobby pela aprovação dela.

Quando um ministro apagado como Wagner é voz dissonante pedindo austeridade, é porque o governo acabou e virou zumbi, e mais, se o ministro da Defesa propõe cortes mais duros que o da Fazenda, é porque este não tem capacidade de demonstrar para a presidente que o governo aproxima-se do abismo.

Nas medidas anunciadas ontem, não há um único corte dos muitos ministérios. Não há a extinção de um único cargo em confiança. A extinção do abono de permanência, por sua vez, leva ao aumento da despesa, porque os funcionários experientes e capacitados que se mantinham trabalhando após a aposentadoria simplesmente irão para suas casas, forçando a contratação e o treinamento de gente que os substitua. Cortar a correção de salários e benefícios sociais é de pouca efetividade, já que o pipocar de greves será grande e mesmo as correções automáticas são sempre abaixo da inflação. 

Fosse um governo sério, sem compromisso com o partido (e, portanto, com os milhares de agentes públicos contratados sem concurso), haveria extinção em massa de cargos em comissão, de ministérios, de secretarias e início imediado de um plano profundo de privatizações e concessões transferindo atribuições do Estado para a sociedade. Mais que isso, faria um apelo por reformas estruturais sem as quais o Brasil nunca sairá do buraco, como a previdenciária, a fiscal e a tributária.

O Brasil continua na mesma, a crise do Estado não vai amainar.... 

14 de set. de 2015

O ORÇAMENTO ENGESSADO

Me chamou a atenção a opinião do ex-ministro da fazenda Mailson da Nóbrega, que alertou para o problema do orçamento engessado praticado pela administração pública brasileira. 

Segundo ele, apesar da boa intenção, essa forma de direcionar o gasto público não é eficiente, porque não necessariamente garante verba já que nem sempre a receita se realiza, e especialmente, não garante que o dinheiro que exista seja bem aplicado. 

O exemplo que ele usou foi o de um município pequeno, com taxa demográfica baixa ou negativa. Num lugar assim, o número de estudantes diminui todos os anos e mesmo assim, o prefeito se obriga a cumprir com uma parcela fixa do orçamento para gastar com educação, porque os percentuais legais são fixos e imutáveis... e todo o resto das atribuições municipais fica em segundo plano, mesmo sem avanços significativos na área específica.

O resultado é que dinheiro que poderia ser investido, gerando indução econômica, empregos e crescimento, acaba sendo gasto muitas vezes de modo inútil, apenas para cumprir a quota exigida pela Lei, para que o administrador público não seja punido por crime de responsabilidade.

O Brasil tem a mania de achar que leis rigorosas substituem a boa gestão, o preparo e o bom senso dos administradores, mesmo com provas seguidas de que isso não acontece. Nas áreas de saúde e educação então, a demagogia é onipresente, gasta-se o percentual mínimo, mas pouco se prepara os gestores e pouco se combatem os ralos de dinheiro que esses mesmos gestores promovem por incompetência, por desonestidade e mesmo pela necessidade de cumprir esses percentuais sob pena de sofrerem sanções legais.

Eu vou mais além. No Brasil, temos eleições para diretores de escolas públicas, de modo que quase nunca uma escola pública é administrada pelo melhor gestor escolhido por seus superiores na estrutura educacional, é quase sempre o mais político, o mais popular, o que melhor se adequa ao jogo de interesses muitas vezes políticos e mesquinhos que o sistema colocou dentro da escola sob a desculpa estúpida de que isso é democrático.

Ou seja, não adianta ter verba carimbada se o sistema força seu uso de modo irracional, melhor seria reforçar as punições e a fiscalização sobre os maus gestores do que garantir uma verba que nem sempre é necessária.

O Brasil precisa discutir essas questões. Nossa taxa demográfica decrescente força os gastos de saúde e os de previdência e alivia a pressão por gastos com educação. Mantido o quadro atual, continuaremos a gastar em educação mas não haverá como fechar o rombo da saúde e da previdência, mantido o engessamento orçamentário, ainda haverá a tendência de, mais uma vez, não haver investimentos e gerar retração econômica e com isso, diminuir a receita tributária e piorar ainda mais a situação.

Governo nenhum consegue enfrentar uma crise fiscal grave como a atual sem poder manobrar o orçamento. FHC, na esteira das muitas medidas de responsabilidade fiscal (todas impopulares) que tomou, ainda conseguiu criar a DRU (desvinculação de receitas da União) e com isso ter margem da manobra, mas esse modelo se esgotou, porque nem Lula nem Dilma imaginaram que poderiam enfrentar a crise atual, negligenciando o controle da folha de pagamento da União, dos gastos em geral e desistindo de fazer reformas previdenciária, fiscal e tributária, que eram essenciais para adequar as contas públicas.

Talvez agora seja o momento de corrigir esse rumo e aumentar os limites da DRU como forma de impedir o aumento dos impostos e exigir mais eficiência da administração pública. Não se pode ficar apenas no debate da péssima gestão de Dilma Roussef, há que se pensar no que vai acontecer depois dela, inclusive como serão os orçamentos e o uso das receitas depois dela.

10 de set. de 2015

O GRAU DE INVESTIMENTO...E O DE IRRESPONSABILIDADE

Não que eu seja economista, posso estar errado.

Com o grau de investimento obtido em abril de 2008, o Brasil manteve a irresponsabilidade fiscal e orçamentária de manter a taxa Selic (a básica de juros da economia) como uma das maiores, se não, a maior do planeta, numa média histórica alta (http://www.bcb.gov.br/?COPOMJUROS), com a mínima em março de 2013, no percentual de 7,16%, ainda assim, uma das maiores do planeta.

Comentam economistas, que a taxa de juros brasileira é alta e que compromete o equilíbrio orçamentário, já que quanto maior o índice, mais juros o contribuinte brasileiro é obrigado a pagar para sustentar a dívida pública, sendo obrigado, inclusive, a retirar dinheiro de outras áreas, para evitar o calote e uma consequente crise bancária igual ou pior que a da Grécia, por exemplo.

Como o Banco Central brasileiro não é independente, ou seja, ele sofre a influência do Poder Executivo, os governos Lula e Dilma poderiam ter trabalhado no sentido de diminuir gradualmente a taxa Selic para índices próximos dos observados por economias com grau de investimento, diminuindo assim o impacto nos orçamentos futuros. Talvez seria possível manter a taxa em índices ainda entre os maiores do mundo, mas que estariam hoje ao menos alguns pontos percentuais abaixo.

Mas obviamente nada fizeram, preferiram assumir o risco de gastar sem freios em todas as áreas, imaginando que nunca seriam obrigados a fazer grandes alterações na taxa da época, porque o grau de investimento foi encarado à época como mais uma realização pessoal de Lula, tido por muitos como o maior governante do mundo, o midas que transformava em ouro tudo o que tocava. Cometeram o erro de achar que a fase boa nunca acabaria.

Um governo responsável sempre olha bem adiante e é prevenido. No Brasil, os governos, via de regra, só olham para o presente e no caso do PT, só olharam para o umbigo dos presidentes.

A taxa Selic de hoje é de 14,25%. E cada ponto percentual que ela sobe, aumenta a despesa da União em uma fábula de dinheiro. Chegamos numa situação em que tão somente o aumento da taxa de juros em 2015, que foi de dois pontos percentuais, aumenta as despesas da União em pelo menos o dobro do que o governo Dilma pretendia economizar com seu pacote de retirada de direitos sociais enviado ao Congresso no início do ano. Ou seja, a conta NUNCA fechará com essa taxa de juros pornográfica. E se ela for mantida, pode ser que CPMF ou aumentos de impostos aliviem o problema fiscal imediato, mas no futuro, também não serão suficientes.

Agora, se ficar sem grau de investimento (se bem que ele ainda se mantém, porque é preciso que mais uma das agências de rating rebaixe o país), terá que aumentar juros que por si só, já são astronômicos. E junto com taxa maior, despesa maior e mais pressão orçamentária.

Não é exatamente uma conta de juros, é uma conta de incúria e irresponsabilidade.


5 de set. de 2015

CRIANÇA NA PRAIA, PESADELO OCIDENTAL



A imagem chocante da criança morta na praia despertou no mundo aquele misto de indignação e remorso que é bem típico da raça humana, sempre que confrontada com sua própria face. 

O ser humano tende a adotar uma zona de conforto na qual ele faz valer seus próprios valores e convicções, sem dar muita importância ao mundo exterior até o dia em que algo quebra essa acomodação.

Nós, ocidentais, ou seja, cristãos que desenvolvemos uma ideia de sistema político baseado em alternância de poder e liberdade individual, temos a mania de achar que nossos valores e convicções são obrigatórios, que todas as regiões do planeta seguirão nossos dogmas e acreditarão em nossa maneira de ver a vida, mesmo que ela seja apenas idealizada, já que o ocidente está longe de ser completamente cristão, que dizer completamente democrático, com alternância de poder e liberdade individual generalizada. Aliás, o ocidente é bem tolerante até mesmo com ditaduras, como a da China ou a da Arábia Saudita, quando lhes são convenientes.

Na história do mundo temos provas contundentes de que nem sempre essas convicções são efetivamente práticas, aplicáveis a qualquer dos povos. A democracia, embora ainda seja o melhor sistema de poder (opinião minha), nem sempre é o mais eficiente, nem o mais apropriado em todos os lugares.

Quando a URSS invadiu o Afeganistão, os EUA e vários países ocidentais apoiaram todos os grupos que se dispuseram a lutar contra  monstro comunista que nada mais queria que uma guerra para afastar sua opinião pública da falência do sistema que acabaria tempos depois, e que também era apenas uma ideia toda própria de sistema político que também se queria exportar a qualquer custo. Acabou custando o fim do comunismo e o nascimento do ultra-radicalismo islâmico, decorrência da luta entre os dois lados da Cortina de Ferro, após os muitos erros do mundo colonialista

Acabado o comunismo,  não contente com a vitória que alcançou, o ocidente continuou cometendo erros. Interveio por uma segunda vez no Iraque, num momento em que Saddam já não representava risco para mais ninguém além de suas fronteiras. Entregou o Afeganistão para um suposto sistema democrático que nunca conseguiu tirar do país o status de nação miserável e sempre em conflito, em razão dos muitos grupos radicais que por lá disputam o poder. Por fim, quando ocorreu a "Primavera Árabe", o ocidente vislumbrou a chance de "livrar-se"de mais ditadores, especialmente Khadafi da Líbia e Assad na Síria,  apoiando insurgentes na tentativa de exportar democracia sem muita preocupação com a história daqueles países e povos, ou ainda com a instabilidade política que isso poderia gerar, já que, governados por décadas com mão de ferro e sem oposição, eram lugares propícios para o aparecimento de  grupos radicais, já que aquelas pessoas jamais conheceram conceitos de liberdade, democracia e da tolerância que os dois primeiros exigem.

Mas não se perguntou da estabilidade na Síria, lugar onde a ditadura Assad era tolerante com cristãos e comportamentos ocidentalizados, nem na Líbia, cujo ditador havia abdicado do terrorismo para ficar no poder e ao mesmo tempo, melhorar as condições de vida de sua população. Nos dois países, seguiu-se uma guerra civil, do mesmo jeito que no Egito e da Tunísia há sérios problemas políticos que causam tensões e violência constantes desde então.

Democracia é algo muito bonito como conceito, mas não é adotável de modo imediato, ela precisa ser aprendida, país nenhum vira uma democracia de um dia para o outro, até porque eleições não significam que ela exista ou tenha vencido a luta contra o totalitarismo.

Esta semana, Vladimir Putin (ele mesmo um governante forte e não-democrático, mas que só é isto porque foi alçado ao poder num processo em que a democracia não levou estabilidade à Rússia, que então voltou para os governos com mão de ferro) declarou que o ocidente (em especial os EUA), não observou a história e os costumes dos povos árabes ao apoiar a ideia de liberdade, que por sua vez causou o colapso dos regimes, o fortalecimento do ultra-radicalismo e por fim, a crise de refugiados que amedronta a Europa, ao mesmo tempo em que reluta em pegar em armas para combater o Estado Islâmico e seus pares que aterrorizam os países antes acalmados por ditaduras estáveis.

Putin está certo, ele mesmo é a prova de que história e costumes as vezes afastam o (belo)conceito de democracia que aprendemos a valorizar aqui no lado do mundo com fortes laços culturais com a Velha Europa.

Já antes do século XX o ocidente impôs um conceito de país a povos nômades, mas não satisfeito, quis mudar o modo de vida daquela gente contrariando até mesmo seu estágio histórico e evolucionário.A intervenção desastrosa do ocidente (EUA e Europa, preponderantemente), sob as mais variadas desculpas (colonialismo, petróleo, democracia, anticomunismo, etc...) em países sem tradição democrática e fortemente influenciados por dogmas religiosos, foi o o motor para o aparecimento do Taleban, do Estado Islâmico e de várias correntes que são radicais porque isso é algo que somente as religiões despertam nos seres humanos, como a própria história do ocidente demonstra, apesar de nem sempre nós atinarmos para isto, já que as vezes esquecemos das cruzadas, da inquisição e do extermínio de judeus.

Não estou dizendo que a responsabilidade por Taleban e Estado Islâmico é exclusivamente do ocidente, porque certamente há outros fatores, incluindo as próprias ditaduras que foram derrubadas.

Mas afirmo que o ocidente esqueceu da hipótese de que, ruim com ditaduras, as coisas poderiam ser piores sem elas, o que efetivamente acabou acontecendo.

Milhares de refugiados tentam sair do inferno das guerras civis e das perseguições políticas, religiosas e raciais, que eram contidas enquanto os ditadores punham freios nas várias facções radicais, que de repente começaram a receber armas e publicidade para de manifestarem na Líbia, na Síria, no Iraque, no Afeganistão, no Curdistão, no Egito, na Tunísia, etc... As pessoas fogem dessa agressão constante e batem às portas da Europa ocidental, que tem medo de recebê-las, o que pode comprometer sua recuperação econômica e até mesmo sua ideia de sociedade livre e democrática, já que miseráveis são campo fértil para radicalismos em qualquer lugar do mundo, mesmo em lugares ricos e democráticos.

A criança morta na praia é uma imagem  que nos amedronta muito além da pena que qualquer ser humano teria pela criança, ela é um pesadelo que nos confronta com a hipótese de quem nem tudo que achamos bom e justo é universal e que talvez, nossos erros e nossa mania de exportar idéias estejam custando a vida de inocentes.

14 de dez. de 2013

PINHEIRO MACHADO, O PRIMEIRO CONDESTÁVEL DA REPÚBLICA... MAS NÃO O ÚLTIMO


Fábio Max Marschner Mayer
Advogado e Contabilista
Pós Graduado em Direito Empresarial
http:/fabiomayer.blogspot.com
http:/predicaehistoria.blogspot.com

Não é de hoje que a política brasileira envereda pela obsessão em colocar em postos-chaves da República, conscientemente ou não, figuras por vezes impopulares com a função precípua de proteger um determinado regime ou eternizar no poder um determinado grupo político.
O aspecto mais complexo (que chega a ser engraçado) é que, no Brasil, a impopularidade é relativa. O indivíduo pode cair em desgraça junto à opinião pública, ter os piores aspectos da vida devassados pela imprensa e seguidos de desaprovação geral, mas as urnas e não raro as instituições acabam preservando-os. E menos raro ainda é o indivíduo nessa situação ficar ungido de uma expressão nacional tamanha, que seus defeitos notórios são falados à boca pequena pelas pessoas que os cercam, apesar de escancarados na sociedade.
Essa introdução é apenas para dar a dimensão da figura histórica da qual tratará neste ensaio,  um proeminente da República Velha, o Senador José Gomes Pinheiro Machado, por mais que a comparação com figuras atuais seja inevitável.
I – A formação intelectual.
Nascido em 08/05/1851, terceiro filho de um Juiz de Direito, engajou-se aos 14 na Escola Militar e partiu para a Guerra do Paraguai, dando baixa por imposição do seu pai e em razão de doenças provavelmente adquiridas no “front”. Passou então a ser estancieiro nas propriedades da família. Cursou a Faculdade de Direito de São Paulo, que concluiu em 1878.
A Faculdade de Direito do Largo de São Francisco foi provavelmente o maior reduto republicano do Império, cuja realeza definhava por motivos vários, como o enfraquecimento econômico da nobreza, o aumento da influência de estados como o Rio Grande do Sul e a influência dos Estados Unidos da América, país republicano, sobre o resto do continente.
Do Largo de São Francisco partiram muitos dos eventos políticos mais importantes da história do Brasil, e foi o meio onde Pinheiro Machado foi intronizado na política, especialmente a do seu estado natal, onde conheceu estudantes que nos anos seguintes teriam grande influência na história daquela então província, tais como Júlio de Castilhos e Assis Brasil.
Ou seja, Pinheiro Machado, por óbvio, abraçou em primeiro lugar a causa que mais afetava a cambaleante monarquia, o abolicionismo, mas o fez porque passou a ser renhido propagandista republicano, abraçando, os conceitos positivistas de Augusto Comte, basicamente fundados na primazia do conhecimento científico e do mérito, que no caso indicava que o poder político não poderia ser exercido por unção divina, mas pela meritocracia emanada da sociedade, dentro do conceito do “Amor por princípio, Ordem por base e Progresso por fim” que inspira o lema presente na bandeira nacional republicana, Ordem e Progresso.
É verdade que o Brasil adotou variantes desse pensamento em cada célula republicana, das muitas que eclodiram pelo Brasil em províncias diferentes, gerando conflitos internos que permearam a luta pela República e depois a própria República Velha.
No caso, Pinheiro Machado acabou no bojo da variante republicana sul-riograndense de Júlio de Castilhos, de linha arbitrária, mais tendente a um poder ditatorial, que  Ricardo Velez Rodrigues[i] bem resume como “autoritarismo doutrinário”.
Tratou de exercer esses conceitos já no início da vida profissional que seguiu na cidade de Cruz Alta e por óbvio, assim que eclodiu a Proclamação da República, aliou-se ao seu já citado  conterrâneo.

II – O republicanismo castilhista:

No ensaio “Conciliação: Os Partidos Políticos no Brasil” ,que o leitor encontra nesta mesma página da internet, eu já havia citado que a “...República Velha acabou marcada pela inexistência de forças políticas nacionais e homogêneas, que dizer de partidos, pois os ditos “partidos” regionais eram representação das oligarquias e coronelismos de cada estado...”[ii]. E assim foi no Rio Grande do Sul, onde a influência de Júlio de Castilhos, como já dissemos, legou o dito “autoritarismo doutrinário”, um pensamento republicano ditatorial no sentido de centralizar o poder e dele emanarem as ordens que supostamente permeiam o progresso positivista.  Não se estranhe isso, até porque república tem pouca relação com a democracia, pelo menos no conceito que guardamos nos dias de hoje.

Em verdade, esse pensamento com viés autoritário permeia toda a história política do Brasil desde a Colônia até os dias de hoje. Se é verdade que não exatamente nos termos propostos por Júlio de Castilhos ou mesmo por Augusto Comte, o fato óbvio é os políticos brasileiros tendem sempre a acumular poder e centralizar decisões e práticas para tentar eternizar-se no poder.
Mas a República Velha era instável. Cada um dos novos estados criados pela República tinha suas próprias oligarquias e seus próprios conceitos republicanos e políticos, em cada um deles havia grupos cujas rivalidades excediam a política, era o coronelismo puro e simples à serviço de um ou de poucos indivíduos, que tentava transpor-se para o plano nacional, o que efetivamente aconteceu ao menos com os grupos de São Paulo e Minas Gerais, na política do Café com Leite.
O “castilhismo” nada mais era que uma faceta disto, uma visão toda própria de república: conservadora, pouco afeita ao caráter negociador do liberalismo que também era um traço republicano, uma aproximação, como cita Velez Rodrigues, com o autoritarismo: “...Ao instituir a tutela e a cooptação como base da ordem social e política, ao mesmo tempo em que dava à nossa elite um bom argumento para se perpetuar no poder, Castilhos exonerava-a dos freios morais e políticos da sociedade liberal, expressados pelo no parlamento e nas liberdades...”.
Esse era, em resumo, o pensamento de Pinheiro Machado, e que, veremos adiante, permeou sua carreira política. Mas é interessante notar nesse momento os elementos que compõe o conceito tão bem expressado acima: tutela, cooptação e perpetuação no poder, conceitos que vigem até hoje na política brasileira em todos os níveis, e que definem as relações políticas brasileiras.

III – A atuação política.

Uma pesquisa rápida sobre Pinheiro Machado mostra uma unanimidade sobre seu brilhantismo pessoal, que não se confunde com o julgamento que cada pessoa venha a fazer de sua atuação política.
É traço cultural brasileiro apagar os defeitos das figuras públicas tão logo elas morram, e não foi diferente com este senador pelo Rio Grande do Sul.
Pinheiro Machado lutou na Revolução Federalista onde recebeu de Floriano Peixoto, pela sua comprovada capacidade em batalha, o título de “General de Brigada Honorário. Após isso, ingressou no caminho natural da política.
Nas páginas de história do portal UOL pode-se ler trechos da reportagem de cobertura do jornal “Correio da Manhã” sobre o seu assassinato, que dizem “...o General Pinheiro Machado, a exemplo de todos os grande dominadores das multidões, nunca tomou em conta da sua obra pública as opposições mínimas, as resistências imponderáveis ao seu espírito de lutador affeito a enfrentar e vencer as maiores energias antagônicas...”. Ou seja, era persistente, determinado e disciplinado em conseguir o que queria, acumulava poder, influências, e, claro, inimizades. E continuou o mesmo “Correio da Manhã”: “...Chefe político, de uma influência tão vasta, tão poderosa e quase podemos dizer tão incontrastável na vida da nação... “.  
Enfim, de constituinte de 1890/91(ao lado, claro, de Júlio de Castilhos) virou um acumulador de poder que ficou no topo da pirâmide política do advento da república até sua morte, em 1915, mesmo sendo opositor da política do “café com leite”, mesmo contestado por agremiações republicanas regionais.
Sendo acumulador de poder, e considerando que sua atuação tinha como premissas a tutela, a cooptação e a perpetuação no poder, também foi acumulador de riqueza. Usou do poder para enriquecer em torno das trocas de favores, da influência onipresente sobre a política e especialmente sobre a faceta do “fazedor de reis” ou do “paladino da república”, alcunhas recebidas, a primeira dos inimigos, a segunda dos aliados, por ocupar a presidência da “Comissão de Verificação de Poderes”  e a vice-presidência do Senado da República. Tornou-se um político poderoso, tinha influência, era temido e ainda por cima, acumulava riqueza material.
A “Comissão de Verificação de Poderes”, fora criada por influência do presidente Campos Sales, um hábil político oligarca, que empreendeu a “política dos governadores”, de acumular poder regional e transportá-lo para um poder nacional[iii]. A comissão parlamentar apoiava os governadores, tinha atribuições equivalentes às da Justiça Eleitoral de hoje. Nela, decidia-se da existência ou não de fraudes e irregularidades eleitorais, o que dava ao poderoso senador a faculdade de tirar a carreira política de alguns e entregá-la a outros, seus aliados, seus favorecidos, seus devedores ou credores de acordo com seus interesses, independentemente da quantidade de votos que os prejudicados tivessem. Ou seja, Pinheiro Machado trabalhava fortalecendo os governadores que por sua vez fortaleciam o presidente, e ao mesmo tempo se auto-fortalecia, pois ficava numa posição acima de todos eles.
Isso fez dele figura central de todos os governos da República a partir de então, apesar de mero membro do Legislativo, a ponto de ser chamado de “o homem que governa o governo”.
É óbvio que nos anais da história não se usa a palavra certa para definir isso, que é corrupção, não diferente da presente nos dias de hoje, com os mesmos objetivos: tutelar, cooptar e perpetuar-se no poder. Eduardo Bueno cita o historiador americano Joseph Love, que disse: “Noutras palavras, pairava ao seu redor um ar inconfundível de corrupção”[iv]. O fato do poderoso político ser retratado hoje em dia como um dos pilares da República, não é mentiroso, afinal, graças à ele, ela consolidou-se, embora não nos termos éticos que eram pregados antes dela nascer, mas nos termos éticos que permeiam a política brasileira durante toda sua história até hoje.

IV – O auge e a queda:

O auge de seu poder deu-se durante o governo do Marechal Hermes da Fonseca, quando  quebrou-se temporariamente a política do  Café com Leite e a presidência voltou às mãos dos militares, que a haviam entregado aos civis ao fim da era de Floriano Peixoto, não sem grande descontentamento que se acumulou nesse ínterim.
Até então, o presidente eleito ou era ex-governador de São Paulo ou era ex-governador de Minas Gerais. Mas o presidente Afonso Penna resolvera lançar à sua sucessão um de seus ministros, David Campista, o que desagradou a todas as correntes da República.
 Então ocorreu uma tríplice aliança entre o Exército (que durante toda a República, até a Constituição de 1988 sempre esteve presente como protagonista do embate político), Minas Gerais e Rio Grande do Sul e, claro, com a influência de Pinheiro Machado.
Então, São Paulo, estado traído pela perda da política até então vigente, apoiou Ruy Barbosa, o adversário mais ferrenho de Pinheiro Machado, única pessoa em todo o país e em toda a classe política que era capaz e tinha coragem de enfrentar o poderoso senador, mas que ao mesmo tempo era o único político temido por este, em razão de sua grande popularidade. Ruy era querido dos brasileiros desde os tempos do império, embora isso não lhe tenha valido o cargo de presidente.
Mas o fato é que a campanha rachou o país e reapareceram por todos os estados os “cismas” republicanos regionais, as pequenas oligarquias locais dividiram-se, algumas apoiavam o governo, outras não, e o resultado era o de não acumular poder na presidência, ao menos não como ocorria com a antiga política dos governadores, gerando as revoltas da Chibata e do Contestado, e oposição visível, num tempo em que haver oposição não era costume na política brasileira.
Foi aí que Pinheiro Machado experimentou o auge de sua glória, ele foi o artífice da política de “salvações nacionais” que buscava reaproximar o poder dos estados ao poder federal, combatendo insurgências regionais, impedindo a ascenção de políticos que não eram simpáticos ao poder federal, controlando o Congresso Nacional mesmo que por meios indefensáveis.
E assim foi, inclusive durante o governo seguinte de Venceslau Brás, até seu assassinato com uma punhalada em 8 de setembro de 1915 desferida por um popular, que afirmou durante o resto de sua vida que o fez sozinho, sem interferência de políticos, e cuja motivação encontrada em um bilhete que carregava, dizia ser o sofrimento do povo, atribuindo a Pinheiro Machado ser o símbolo todos os defeitos da política que não legava progresso e atormentava o país com suas eternas diatribes, seus acordos e acertos obscuros. Eduardo Bueno cita que “Talvez por isso tenha havido carnaval no Rio de Janeiro e em São Paulo, quando a notícia de que Pinheiro fora assassinado se espalhou. O povo associava sua figura à carestia, aos desmandos políticos e à manutenção do poder nas mãos dos oligarcas.”[v]
Pinheiro Machado foi herói para muitos, especialmente no Rio Grande do Sul e vilão para outros tantos. Há os que digam que ajudou a legar as péssimas práticas políticas brasileiras, há quem diga que deixou a consolidação da República.

V – Conclusão:
Nesse breve ensaio sobre a figura histórica complexa de Pinheiro Machado não tive a intenção de desfazer a importância da figura histórica, fica a critério do leitor julgá-lo, se quiser, fica ao encargo dos historiadores esclarecer a importância dele na história fora dos limites das minhas opiniões.
Minha intenção foi mostrar que muitas das práticas políticas brasileiras são atávicas, elas vêm desde o Império, são constantes em nossa história embora mais visíveis a partir da Proclamação da República.
Em um tempo em que não havia mídia eletrônica, onde os jornais de oposição eram empastelados, onde valia a adulação para manter os órgãos de imprensa, onde falar mal de político podia dar cadeia, Pinheiro Machado foi um homem super poderoso acima da Lei e das acusações.
Na época ele equivalia aos políticos de hoje em dia, eternamente encastelados em presidências de órgãos importantes apesar das denuncias contra si, apesar da impopularidade entre classes intelectualmente mais bem preparadas e principalmente, apesar das mudanças de grupos políticos dominantes, ajeitando-se ao sabor da situação de momento, mantendo-se sempre no topo da pirâmide política.
Pinheiro Machado não foi diferente de um político dos dias de hoje, que não renuncia de seu cargo mesmo flagrado pagando pensão para filha havida com amante com dinheiro público, ou acusado de coagir poderes para manter sua ascendência sobre seu estado de origem, ou ainda, defendendo calorosamente o governo de uma pessoa à quem tinha feito oposição ou por ela tinha sido oposto há pouco tempo passado.
Pinheiro Machado foi um político brasileiro, e a conclusão que tiro é justamente esta, de que no Brasil, muita coisa muda para tudo continuar exatamente como sempre esteve: tutela, cooptação e perpetuação de poder!




[i] Castilhismo: Uma Flosofia da República. Coleção Brasil 500 Anos, e-book, Editora do Senado.
[iii] Semelhanças com a política de nossos dias não são mera coincidência.
[iv] Brasil: Uma História, LeYa editores,  São Paulo, 2010, p.301.
[v] Idem nota anteror.

13 de ago. de 2013

O BRASIL NÃO-POTÊNCIA!

Vez em quando o Brasil encarna o sonho de virar superpotência influente no mundo exibindo uma suposta prosperidade que contrasta com a pobreza econômica e de espírito de existe por aqui, e que decorre da incompetência atávica dos seus governantes.

Na onda do “Milagre”, fase em que a economia crescia de 12 a 16% anuais, se falava que estava nascendo uma nação pronta a dar uma vida rica e de igualdade social ao seu povo, capaz de influenciar o mundo. Época em que se torrou o dinheiro público do aumento da arrecadação de impostos em todo tipo de asneira, inclusive uma Copa do Mundo exclusiva para o Brasil, a Copa Sesquicentenário da Independência. O resultado foi, na primeira crise, o desmonte do sonho do “Brasil potência” como um castelo de cartas ao vento, legando 20 anos de inflação alta, descontrole de contas públicas e principalmente, de abandono social e econômico da população, que até hoje dentro de sua ignorância patrocinada por quem nunca quis mesmo educá-la com qualidade, ainda elogia o falecido ex-presidente Médici que era “do povo” a ponto de ser admirado por assistir futebol com radinho de pilha na orelha, sem que muita gente lembre que ele foi o cabeça da pior fase da ditadura, que governou com os DOPS sequestrando e torturando inimigos do regime.

Perdeu-se uma oportunidade de ouro para construir Estado com contas públicas em ordem e investir maciçamente em educação, segurança e saúde, projetando um país rico, poderoso e influente para o terceiro milênio, como aconteceu com a Coréia do Sul que então, era um país miserável e hoje é potência econômica, militar e política.

Vivemos hoje em dia fase parecida. O presidente Lula teve a oportunidade de ouro de preparar o país para virar superpotência, ele tinha todos os requisitos necessários: contas públicas em rota de controle, crescimento econômico, crescimento exponencial da arrecadação tributária, cenário externo favorável. Mas ele mesmo torrou tudo nas exatas mesmas asneiras em que o Brasill torrou chance idêntica que teve na década de 70! Criou milhares de cargos para agentes comissionados e em confiança, fez obras faraônicas que não terminaram ou para pouco servem, abusou das mordomias e a cereja do bolo, aceitou o encargo de fazer Copa do Mundo e Olimpíada em um espaço de 2 anos.

A diferença de Lula para Médici é que aquele governou com democracia e este, não. Aquele não torturou nem perseguiu e este, sim. Fora isso, ambos viraram ícones populares entoando o canto do “Brasil potência” sem grande preocupação prática em criar condições para tanto, que são simples: contas públicas em ordem e superavitárias, educação de qualidade, segurança (lato sensu) e saúde, requisitos sem os quais sociedade alguma se desenvolve.

Se há uma coisa que o Brasil deveria aprender nessa fase marrenta pela qual passa o governo Dilma Roussef, em que se desvendam as falhas de seu antecessor que falava demais e resolvia pouco, é que progresso se alcança em longo prazo e que não são nem 4, nem 8 anos que colocam um país das dimensões e da complexidade do Brasil na situação de potência. Mais que isso, não é apenas um governo ou um governante que faz isto, é um conjunto de pessoas cujo amálgama é a democracia, não é tarefa para um partido ou um tipo de ideologia. Fora isso, o Brasil é um país potencialmente rico, mas materialmente pobre: não dá saúde nem educação para seus cidadãos, não lhes dá segurança para trabalhar e viver honestamente, não é capaz sequer de manter ativas suas forças armadas que hoje são equipadas com sucata, armamentos usados até o osso em países estrangeiros entregues a preço de banana para os militaresm, enquanto os políticos passeiam com aviões novos de fábrica.


O Brasil é um país pobre, mais que pobre, é um país vergonhoso, onde a elite política formada basicamente pela escória da sociedade, vive como soberana européia, e o povo, mesmo o povo mais bem formado e intelectualmente bem preparado, sustenta os abusos de quem se aboletou no Estado para dedicar-se ao ócio arrotando uma grandeza inexistente.

CORITIBA: O MEDO DO FUTURO.

No erro de uma diretoria interina, que acionou a justiça comum em 1989 para não jogar uma partida marcada de má-fé pela CBF para prejudicar ...