26 de ago. de 2010

O BRASIL JÁ FOI UMA VENEZUELA, MAS NÃO VAI VIRAR UM MÉXICO

Entre 1964 e 1985 o Brasil experimentou um regime que combinava censura ou restrições à liberdade de imprensa, controle sobre atividades políticas e eleições indiretas para os cargos importantes. Existia uma aparência de democracia e legalidade que escondia uma ditadura não personalista, mas ditadura.

O regime econômico era estatista e socialista. A união, os estados, os municípios e até as autarquias eram proprietários-controladores de empresas e bens em praticamente todas as áreas da economia. Companhias elétricas, telefônicas, de água e esgôto, mineradoras, siderúrgicas, empresas de produção e manutenção de aeronaves, trens e vagões, empresas de abastecimento, empresas de prestação de serviços para portos, dezenas de bancos comerciais e de fomento, distribuidoras de café, companhias hoteleiras, ferrovias, auto-estradas, terceirizadoras de serviços públicos, milhares de imóveis vagos espalhados pelo país, etc...

Notaram a semelhança com a Venezuela de Hugo Chaves?

Pois é, o Brasil já foi uma Venezuela e o resultado não foi nada bom. As taxas brasileiras de crescimento econômico foram grandes e consistentes durante todo o pós guerra e em parte daquele regime ditatorial. Porém, quando o regime se abriu, descobriu-se que as milhares de empresas estatais eram cabides de emprego altamente ineficientes e deficitários, responsáveis diretos pelas altíssimas taxas de inflação e demais desequilíbrios que legaram ao Brasil um período economicamente perdido de mais ou menos 15 anos, pois apenas com o Plano Real em 1994 o país saiu da espiral inflacionária que o corroía depois dos desmandos administrativos daquela época.

A diferença daquele Brasil para a Venezuela de Hugo Chaves, é que mal ou bem, os militares brasileiros deixaram centenas de obras de infra-estrutura e programas desenvolvimentistas que, guardados os problemas já citados, geram efeitos até hoje. Já o ditador Venezuelano, quando sair morto de seu cargo, só deixará miséria e desespero.

Mas enfim, o Brasil já foi como a Venezuela, o que me dá a carteza que não vai caminhar para voltar a isso mesmo em um governo Dilma Roussef, como comentários toscos e insistentes que tenho lido na internet afirmam que vai acontecer. Já se sabe que o governo Dilma vai manter um dos ícones da estabilidade econômica dos anos Lula, o ex-tucano Henrique Meirelles. Será que gente como ele aceitaria a venezuelização do país apenas para atender a meia dúzia de radicais presos na ideologia dos anos 50, mas militantes do PT? Duvido.

Ontem, um editorial do jornal O Estado de S.Paulo saiu com uma outra sandice sob esse mesmo ponto de vista. Alegou que a terceira vitória consecutiva da dupla PT/PMDB estaria levando o Brasil a um regime como o mantido pelo PRI mexicano entre 1940 e 2000, de partido único, com aparência de democracia e aparelhamento do Estado.

Outra bobagem que me recuso a aceitar.

Ora, se Lula quisesse virar ditador, o faria com facilidade. Ele indicou 8 dos 11 ministros do STF, que não raro votam contra os interesses da União ou do PT/PMDB em suas decisões. Mesmo o ministro Dias Tóffoli, tido como a indicação mais política feita pelo presidente Lula, mantém uma postura de independência institucional e bom senso que não se esperaria de um STF "aparelhado" para transformar Lula em um novo Getúlio Vargas.

Mas vamos mais longe.

Quem criou a regra de reeleição? Ela foi a pior ruptura institucional brasileira no pós-democratização. E feita de modo apressado e não pensado, criou um grave efeito colateral no Judiciário, cuja nomeação da cúpula ficou por demais à mercê de um único presidente no caso de reeleição. Porque o sistema não foi repensado como um todo para possibilitar a reeleição, causou essa distorção que Lula poderia ter usado para se perpetuar no poder, coisa que não fez porque nas palavras dele mesmo "não se pode brincar com a democracia", a mesma que a coragem de homens de esquerda como ele, Mário Covas, José Richa, Leonel Brizola, Franco Montoro e Ulisses Guimarães ajudou a reconstruir.

A regra de reeleição foi criada pelos tucanos de afogadilho, porque Fernando Henrique queria mais 4 anos que poderiam ter sido de José Serra e que o PSDB queria negar a Luis Eduardo Magalhães. A verdade é esta, quem queria se perpetuar no poder eram os tucanos, o PT pegou o bonde andando e apenas seguiu a lei imposta pelo rolo compressor congressual do PSDB anos antes.

Daí vemos comentários sobre a venezuelização ou mexicanização do Brasil, mas apenas porque o PT/PMDB arrisca vencer a terceira eleição consecutiva. Mas se o PSDB vencesse em 2002 teríamos entrado em um processo de mexicanização?

Já escrevi aqui e repito que vejo pouquíssima diferença entre Dilma Roussef e José Serra, como vejo diferença alguma nos discursos de Serra com os de Lula, salvo um ou outro erro no português, cometido pelo segundo.

Enfim, o Brasil já foi uma Venezuela de triste memória, e duvido que irá virar um México da década retrasada apenas porque Dilma Roussef se elegeu presidente na esteira de um governo Lula que inegavelmente fez sucesso econômico e social. Não existe regime melhor para um partido como o PT e seu aliado o PMDB, que uma democracia capitalista como a brasileira, capaz de gerar riqueza suficiente para acalmar todos os interesses intestinos dos partidos, suas lideranças e oligarquias. Pensar que vão transformar o Brasil numa república de bananas governada por um macaco como a Venezuela ou o México do PRI é zombar da inteligência das pessoas, mesmo as da oposição.

10 comentários:

  1. Fábio, interessante essa análise entre a ditadura militar do Brasil 64/85 e o governo Chávez na Venezuela. Ambos regimes estatistas e com censura.


    Outra diferença- os militares não tinham militâncias populares organizadas e violentas como ocorre na Venezuela de Chávez. Eles tinham militares que eles convidavam para fazer os serviços sujos, sobretudo na época do AI 5.


    Sou defensor de uma única reeleição de 4 em 4 anos, apenas acho que o Brasil deveria fazer todas as eleições de 4 em 4 anos.

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  2. Eu também, Maia.

    Uma única eleição geral a cada 4 anos, presidencialista.

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  3. Tmb concordo com a colega ai acima, eleição de 4 em 4 anos, rejeito essa de 8 anos, pq assim podemos testar essa tao democracia que falamos.

    abraço Fabio

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  4. Eu sou a favor da reeleição.Acho 4 anos pouco e não é criação nossa.Como bons macaquitos copiamos dos EUA.O que o PSDB queria era o regime parlamentarista e consta em seu estatuto. Cada dia que passa a mediocridade da campanha do Serra aumenta com sandices sem tamanho.Ontem teve uma análise da campanha na Band , muito boa que deu saídas para a oposição principalmente dos impostos que não foram retirados dos alimentos, contrariando o discurso do Lula que diz governar para os pobres.Ele tirou dos carros, por ex, mas não tirou dos alimentos básicos.Com 6% de desemprego não há contestação que suporte.Eu não me lembro desse índice .

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  5. Apoio a reeleição a cada 4 anos. O que não pode acontecer e vai, é vc ficar 8 anos no poder, 4 fora e voltar mais oito anos. O Lula pensa nisso. A Dilma é só um trampolim ou ela vai quebrar as costas do Lula? Duvido...

    Grande abraço

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  6. Fábio

    Primeiro, parabéns pela análise. Poucos são os blogueiros que conheço que expressam tão bem suas opiniões partindo do ponto inicial da discussão e explicando o conteúdo como você faz aqui. Sendo-lhe mais ainda sincero, não vejo isso nem sequer em blogs famosos de grandes portais.

    Não vivi esse período venezuelano no Brasil como citado aí (rs), mas em meados de 80 senti na pele as durezas do que é estar numa republica como a que você descreve...

    Vou falar do editorial da Estadão:
    Se não estou enganado (corrija-me se estiver), nos períodos áureos de FHC, a mídia tinha um imenso poder de influência e benesses do governo. Eles manipulavam com mais facilidades esse povo. Com a entrada de Lula, a coisa mudou um pouco. Lula agora era 'o manipulador' - recentemente, vi uma nota do J.Guzzo na Veja em que ele dizia 'sucesso no Brasil é um insulto pessoal" como se, este sucesso de sua revista causasse, de certa forma, inveja em alguns setores do governo. A imprensa não teve tanta pompa e os jornalistas não tiveram tantas facilidades. Isso para eles beirava a censura e cheira até hoje.

    O setor de comunicação deste governo do PT nunca teve uma comunicação boa com a imprensa, e estes boatos que rolam me parece mais o medo desta velha mídia em relação a esse assunto (censura). Algo que querem porque querem fazer as pessoas pensarem que está existindo um plano diabólico do PT para um ataque a liberdade de expressão e a democracia, direitos constítuidos e únicos do cidadão.

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  7. Você se restringe ao âmbito econômico. Eu temo é pelos valores democráticos: liberdade acima de tudo. As agressões às instituições não devem ser desconsideradas. A ditadura militar não foi venezuelana, mas já vivemos um ajuntamento oligárquico à lá PRI.

    O resto é dilmismo. Quem acha que violação de sigilo e das liberdades em geral é pouco, tem mais é que votar na Ruimself.

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  8. Tambosi,

    Essas agressões às instituições são frequentes tanto no governo do PT quanto no do PSDB. Vou lembrar que, para impor as privatizações ao seu modo, o governo FHC mudou um artigo da Lei das SA e logo após encerrado o processo, devolveu o artigo à redação original.

    Foi o PSDB que praticou a pior quebra institucional do país após a redemocratização, que foi a regra da reeleição, que foi notoriamente COMPRADA ao Congresso Nacional, com ministro pedindo demissão para votar e logo após sendo readmitido.

    Foi FHC que nomeou o pior ministro do STF na história, o senhor Nelson Jobim, cujos julgamentos políticos demais e jurídicos de menos não raro acobertaram aliados políticos.

    O PT não está distante do PSDB em quebras institucionais, sendo que os vazamentos da receita federal já vêm daquela época, quando o então secretário de receita federal mandou uma carta para advogados informando que comparou os rendimentos de vários deles com mesmo tempo de carreira, para pedir explicações sobre as diferenças de rendimentos.

    Também acho graves as violações na receita federal, não gosto do personalismo de Lula, muito menos do PT.

    Mas porque o PT vai emplacar a terceira eleição seguida, não é razão para dizer que o Brasil vai virar um México ou Venezuela, isso é RADICALISMO, o mesmo do qual reclamamos ao tratar do PT, mas não olhamos ou fazemos que não olhamos quando vem de outros partidos.

    E a propósito: ninguém aqui afirmou que vai votar em Dilma...

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  9. está mais que na hora de parar para pensar sobre essas duas ideologias tão importantes que ainda competem até hoje

    visite meu blog
    http://www.falandomais2.blogspot.com/

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  10. 100% aprovado seu post. E isso mesmo!!!

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