30 de ago. de 2007

E AGORA?


É notório que o STF acolheu parcialmente a denúncia da Procuradoria-Geral da República e iniciou o processo penal contra os 40 acusados de envolvimento no caso do Mensalão. Eu gostaria de fazer alguns comentários sobre isso, dado que o debate no Brasil é sempre pobre de argumentos.

Em suma, os petistas dizem que não passa de armação da imprensa e a oposição diz que o governo conheceu uma grande derrota na decisão do STF, a ponto disso causar visível irritação ao presidente da república.

Nem tanto ao céu, nem tanto à terra, acho que nenhum dos dois lados está correto

Diz-se que que denúncia criminal só pode ser acolhida em existindo dois requisitos: mínimo de prova material do delito e indícios de autoria, o que se extrai do Código de Processo Penal, especialmente em seus artigos 43 e incisos, e 516. Sendo redundante, há que se informar que o indiciado apresenta uma defesa prévia anterior à recepção ou não da denúncia, justamente para que suas alegações sejam consideradas na decisão que o tornará ou não um réu.

Diz o processualista penal Júlio Fabbrini Mirabete que "É indispensável, porém, que haja um princípio de correspondência entre o fato imputado e o comportamento do agente retratados nos autos do inquérito ou das peças de informação para que a denúncia seja recebida. Permanece, porém, uma corrente jurisprudencial no sentido contrário, de que há justa causa para o processo se na denúncia ou queixa se descreve um crime em tese"..

Portanto, existe sim, a possibilidade do crime em tese.

E o crime em tese pode muito bem ser utilizado como argumento de defesa pelos petistas, mantendo sua argumentação de que se tratou de uma armação da imprensa.

É um direito deles, embora eu não concorde com isso. O acolhimento por crime em tese, geralmente é informado no corpo da decisão, e o teor completo desta ainda não foi publicado. Porém, o crime em tese tanto pode ser uma dúvida sobre o enquadramento da ação delitiva no tipo (que é descrição exata de cada delito constante do Código Penal), ou seja, não é um crime, mas outro de gravidade menor, quanto, efetivamente, um ato que não constitui crime mas encontra-se no limite da ilegalidade.

O STF, por sua vez, é o tribunal mais eminentemente técnico e ao mesmo tempo, o tribunal político. Ou seja, ele analisa as questões em alto nível teórico, mas pode votar com viés político. Um bom exemplo de julgamento político do STF foi o que envolveu duas contribuições tributárias absolutamente idênticas, o FINSOCIAL e a COFINS. O primeiro foi considerado inconstitucional, a segunda, dada a terrível crise fiscal que o país vivia em época, foi dita constitucional para evitar o mal maior de um Estado inadimplente.

Mas voltando ao assunto, notou-se que o STF adotou uma linha mista neste julgamento recente. Ele, por exemplo, não acolheu certas denúncias e acolheu outras, portanto, dado o viés político, "aliviou" a barra para alguns dos indiciados, especialmente o ex-ministro José Dirceu, mas ao mesmo tempo não o inocentou de plano, dando a chance para que sua defesa produza mais provas no sentido de absolvê-lo.

No entanto, eu não tenho dúvidas ante a decisão do STF, que o Mensalão efetivamente existiu, basicamente porque é impossível que entre 40 indiciados todos eles tenham sido acusados por crime em tese. É impossível que todas as provas colhidas nas CPI(s) e devidamente relatadas na imprensa sejam falsas ou ilegais, basicamente porque esse conjunto probatório foi analisado pela mais alta e especializada corte de Justiça do país, com vias a fundamentar sua decisão, acolhendo a denúncia que, repita-se, depende de prova material do delito e indícios de autoria, sendo que só excepcionalmente (e muito excepcionalmente!) admite-se delito em tese.

Por outro lado, o julgamento não foi exclusivamente político pois se o fosse, a tendência seria de absolvição geral e irrestrita, considerando que 6 dos 11 ministros foram nomeados pelo atual governo, e pelo menos 4 deles, enquanto o denunciado José Dirceu ainda era homem forte no Palácio do Planalto. Não se pode, ante a tais fatos, alegar que o STF, que alguns já acusam de elitista e golpista, persegue implacavelmente os aliados do governo lá processados.

O STF, porém, não julgou o governo e nem sentenciou contra ele. Sinceramente, é forçada demais a interpretação de alguns comentaristas políticos que dizem que o governo saiu derrotado. Nessa questão, concordo com o presidente da república: julgue-se e puna-se. Só seria derrota do governo se houvesse admissão de denúncia contra o presidente, o que não aconteceu, até porque o presidente nunca foi indiciado.

Mas o Mensalão existiu e ao mesmo tempo, isso causa uma "saia justa" para o senhor presidente que declarou várias vezes que não acreditava nisso. Mas é só isso, nem chega a ser derrota.

E AGORA?

Agora cabe ao STF processar e julgar a questão justamente na qualidade de "pretório excelso". Ou seja, ele deve fazê-lo observando que é a mais alta corte de Justiça do país, contra a qual não há instância recursal. Se houver pedido de prova protelatória, deve negar. Se houver reclamação contra a mesma negativa, deve deixar claro que a constitucinalidade de uma questão controversa é analisada pelo mesmo tribunal, o que significa que suas decisões se aplicam imediatamente e sem discussão.

Se fizer isso, levará o processo a ser julgado, condenando e absolvendo em prazos razoáveis, dando uma resposta para a sociedade. Se, pelo contrário, não adotar essa regra e se deixar levar por manobras protelatórias e recursos destituídos de sentido, levando à prescrição e por consequência, ao não julgamento, pode institucionalizar de vez o vale tudo político, com graves efeitos no andar de baixo, a sociedade civil de modo geral.

23 comentários:

  1. Eu acho que o STF agiu corretamente.O Ministro mineiro tem uma inteligência privilegida e sabemos disso pelo seu curriculo bem como o Procurador que ofereceu a denúnica.A mais seria especulação porque não conhecemos os autos do processo. Eu acho que no final vão ser condenados porque a opinião pública está atenta e manifestando-se.
    Susana do http://holandaeeu.blogspot.com e que me mandou os CDs também recebeu ontem os dela.Eu mandei o 1969 e um natalino que não mandei para vc.

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  2. Fábio,
    Muito bem esclarecido o seu artigo. Mas já me dou por satisfeito, nessa primeira fase, e pelo posicionamento claro do Supremo no acatamento dos “quarenta”, que já eram por demais conhecidos do público brasileiro.

    É claro, e conhecendo os meandros políticos como conhecemos, que os tais estão atolados até o pescoço. E, hoje mesmo nos noticiários da televisão, o procurador da República já afirmou que chegaram novos documentos que não deixam margem de dúvidas sobre tais envolvimentos e a formação de quadrilha.

    Esta primeira fase, da maneira em que acabou se esboçando, fortaleceu o STF, repercutiu internacionalmente, e, se os ilustres ministros tomarem gosto pela ‘coisa certa’, quem sabe, se poderá passar o Brasil a limpo. E olha que está precisando e com urgência.

    Uma outra boa vitória, a essa altura do campeonato, seria a CASSAÇÃO DO MANDATO do senador Renan Calheiros. Assim, respiraríamos um ar mais agradável, você não acha?/ Abs

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  3. André,

    Os relatores do processo do Renan pediram a cassação... queira Deus que o Senado entenda a gravidade da situação e a importância do exemplo a ser dado.

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  4. Bem, ao menos algo está sendo feito (eu imagino né). Que não fiquem sem chumbo.
    Deixei-te um mimo lá em casa. Passa por lá que acho bem merecido.
    Beijos

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  5. Fabio,

    como sempre perfeito seus textos. Não há possibilidade para qualquer remendo.

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  6. Boa explicação Fábio. O fator político dessa decisão do STF no entanto é enorme: José Dirceu e seus companheiros são acusados de uma coisa que insistem em negar! (direito deles...) Pro povão, pro pessoal do Bolsa-Família, isso vai pegar...
    Um abraço.

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  7. Pelo jeito é o mesmo que dizer que o montro de loch ness existe mas não provar. E ficar por isso mesmo. Tudo que é contra o governo, vindo dos outros poderes pode ter certeza que é suspeito.

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  8. Viva Fábio:

    Isso, com julgamento ou não, já todos sabemos que a corrupção reina no Brasil.
    Prova-la ou não é indiferente para o povo. Esse sabe bem os políticos que tem.
    Este agora vão valer-se do mesmo dinheiro que roubaram ao povo para provar a sua "inocência".
    Isso aí fede.

    Eles todos no seu conjunto é que deviam ter vergonha por saberem que o povo olha para eles como um bando de malfeitores.

    Mas isso é só para quem tem vergonha na cara.

    Bom fim de semana.
    Um abraço,

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  9. Caro Fábio Mayer:

    Esse assunto, certamente, ainda renderá muitos debates e os seus esclarecimentos, sob a ótica jurídica, são muito interessantes.

    Um detalhe muito curioso foi o debate travado entre o ministro Lewandowsky e seus colegas, no que se refere à denúncia contra José Dirceu. No seu entender não poderia ser julgado por formação de quadrilha. A resposta de César Peluso, afirmando que um bando ou quadrilha não escreve atas para registrar sua formação, foi espetacular. Mesmo assim, o compadre de Lula da Silva (Lewandowsky), pelo jeito, será o magistrado do STF que atuará a serviço do Ali-Babá e, conseqüentemente, dos 40 ladrões. Deixou isso bem claro através de seu voto e seus argumentos. Dará trabalho para Ellen Grace. Não seria o caso de se proclamar incapacitado, como o fez Marco Aurélio de Mello durante o julgamento de Collor?

    Fábio, além de termos o mesmo nome, constato que nossas opiniões são muito parecidas diante de muitas questões. Será um grande prazer visitar o seu blog com freqüência. Li diversos textos antes de registrar esse comentário. Expresso meus cumprimentos pelo zelo e qualidade dos posts.

    Gostaria de registrar, aqui também, o agradecimento pela sua visita e pelo seu comentário (que respondi) em meu blog. E também pela inclusão em sua lista de recomendações. Terei satisfação em retribuir.

    Forte abraço e até breve.

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  10. Eu concordo com o Marcus Mayer, em tudo. Lewandowsky eh um vendido. Eh da turma do Ze Dirça.

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  11. estou mais indignada do q que nunca com a (In)Justiça Brasileira...pois promotor Thales Ferri Schoedl, que assassinou aquele jovem em 2004, recebeu do Ministério Público Estadual o direito de manter o cargo de promotor. VERGONHA!

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  12. To contigo na analise,FABIO.
    Acho que existem exageros de parte a parte.
    Minha unica pulga é sobre os "proximos capitulos". Apesar de todos os advogados de defesa afirmarem que querem que o julgamento seja rapido,creio que esta novela vai mesmo durar 4 ou 5 anos e qdo ja estiver nas "lendas" acusam as tainhas e absolvem os tubarões.
    Vamos ver.

    Abração!!

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  13. Fábio, concordo com a sua explanação, aliás, bastante clara. O STF, a meu ver, na realidade conciliou as duas coisas. No final desta novela, segundo creio, vão condenar os pequenos criminosos e liberar aos grandes. Tomara que não seja assim, mas é o que penso. Bom fim de semana.

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  14. Fábio, não corremos o risco de serem inocentados e ainda pedirem indenizações do Estado, não?
    Você que é do ramo: Estou falando bobagem?
    he he !
    Cara, os sujeitoa ainda dizem que suspeito são os juizes...pelamordedeus!

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  15. Roça,

    Com o Judiciário brasileiro, TUDO É POSSÍVEL, você não está errado, não!

    Mas é divertido ver os petralhas tentando explicar como um tribunal composto por maioria de magistrados que eles mesmo indicaram, foi votar contra o alto comissário.

    =)

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  16. Oi Fábio
    Depois eu volto para comentar. Vim te dizer que hoje é 31 de agosto, "Dia dos Blogs" e eu indiquei o teu blog lá no pata como um blog trilegal e muito interessante, mas fica frio, não precisas fazer "niente", já que o dia está terminando.
    bjs.

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  17. Boa, meu caro desembargador.
    Abraço

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  18. Oi Fabio,
    Gostei muito de seu texto principalmente pelo teor explicativo, apenas torço que as coisas se resolvam da melhor forma possível.
    Bom final de semana,
    Um Abraço
    Paulo

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  19. Anônimo1/9/07 16:18

    Sabe o que é ruim nessa historia? Ato político! Ato político é bom quando as pessoas sao informadas e todo mundo tem acesso a informacao e forma opiniao de modo equitativo, ai esta politizado e apto. Agora julgamento politico tem outro nome, intolerancia. O que na verdade é um paradoxo, pois é o que nao deveriamos ter, ou seja ser tolerante. Conversa fiada de luso e de mineiro, tem é que botar todo mundo na cadeia, ou entao é mesmo o monstro do lago, como disse o Ricardo ... sóóó que á cadeia so vai acontecer no universo paralelo, porque aqui vai tudo ficar na mesma, embora todo mundo diga que foi licao de cidadania, heroi so STF e outras baboseiras. Vai ficar tudo como dantes ... A prosposito, precisamos reler Orewell em 1984 ... é so ver algumas tiradas do PT e seus asseclas em recentes manifestacoes, recentes e nao eo recentes.

    Jack "Abranches" Aré
    http://courodejacare.zip.net/

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  20. Fábio seu blog é ótimo, e merece muitas e muitas estrelas!
    Espero vc no prêmio no proximo ano.
    abraço
    boa semana
    =]

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  21. Anônimo2/9/07 00:31

    Pelo jeito, mergulhou nas músicas do Elvis e nem deu tempo de publicar mais nada.Eu te avisei...

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  22. Anônimo2/9/07 11:26

    Oh Fabio nao acredito nao..esses 40 senhores acusados de roubar, etc vao sair de STF mais inocentes do que crianca de um mes.

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  23. Anônimo2/9/07 17:57

    Olá, tudo bem? O triste é consttaar que a sociedade brasileira está alheia ao caso... Poucos comentários nas ruas sobre esse processo.. Abraços, Fabio

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