22 de abr. de 2008

INQUÉRITO E IMPRENSA

Em todos os casos em que um advogado não tem uma linha de defesa com argumentos sólidos ou mesmo saiba que seu cliente é culpado da acusação, certamente aparecem alegações envolvendo abusos da autoridade policial, tal qual o que está acontecendo nesse caso da menina Isabela Nardoni.

E mais do que isso, virão à tona os bons traços de personalidade do acusado. De repente ele vira uma santa pessoa ao repetir a palavra "deus" a todo momento, além de divulgar a imagem ser um bom cônjuge e pai/mãe dedicado, que chora a cada vez que é lembrado do fato criminoso.

Isso sem contar a alegação clássica de primariedade.

Nesse bárbaro caso paulistano, deparamos com ótimos advogados de defesa, porque em meio ao circo armado pela imprensa, eles souberam se aproveitar dela engambelando até a poderosa Rede Globo com aquela entrevista no Fantástico de domingo passado.

A Rede Globo fez as vezes do melhor advogado de defesa que uma pessoa pode contratar, aquele que chama a opinião pública contra as autoridades ao mesmo tempo em que afasta os olhares do barbarismo do crime e da complexidade das provas técnicas. Mais que isso, ajudou a santificar os acusados e certamente atraiu a simpatia de uma boa parte da opinião pública, aquela para quem as lágrimas de alguém são mais importantes que vestígios de nylon e o DNA do sangue espalhado na cena do crime. O fato é que para o telespectador médio da Rede Globo, lágrimas são palpáveis, e provas técnicas extremamente difíceis de compreender.

Estão presentes todos os elementos da defesa criminal clássica, aquela vista em qualquer processo comezinho em qualquer fórum do país:

1. A polícia é arbitrária! Os laudos não foram juntados aos autos! A prisão preventiva era desnecessária!

2. Os acusados, primários e de bons antecedentes, foram expostos pela polícia à execração pública, mesmo sendo santos a chorar em frente às mesmas telas que transmitem o festival de descaramento e falta de moral do Big Brother Brasil!

Aonde quero chegar com isso tudo?

Quero dizer que a imprensa quer mais é ver o circo pegar fogo. Quer muita gente protestando na porta da delegacia e muito choro de indiciados, muitas entrevistas exclusivas e especialmente, quer que os acusados sejam absolvidos para bradar em alto e bom som que a polícia é incompetente e a Justiça não funciona.


A idéia geral que fica é que a polícia ou é arbitrária ou é incompetente, quando na prática, esse caso é um exemplo de atuação policial eficiente, que soube aliar a prova técnica (perícias) aos depoimentos de testemunhas, diminuindo brechas na eventual denúncia do Ministério Público, que possibilitem à defesa protelar o processo judicial por tempo indefinido.

E a imprensa faz todo esso barulho sem atentar que, por exemplo, os laudos periciais não precisam ser juntados aos autos do depoimento dos acusados, porque o inquérito é uma fase em que, a teor do Código de Processo Penal, a defesa não pode intervir com alegações.

Ou seja, a imprensa ignora qualquer regra jurídica em favor do sensacionalismo barato, porque sabe que o espectador comum acredita mais em jornalistas despreparados, mas ávidos por lágrimas que atraem a audiência dos incautos, que na polícia, na boa polícia que efetivamente existe e que combate o crime.

E isso explica, pelo menos em parte, o porque de setores de nossa sociedade preferirem acreditar na segurança vendida por traficantes e bicheiros, a chamar a polícia.

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