Não é preciso ser
diplomata para saber que os resultados práticos da Rio + 20 serão
tímidos ou até nulos.
O problema de órgãos
multilaterais como a ONU é que eles dependem que países abram mão
de uma parte de sua soberania para que as decisões colegiadas tenham
algum efeito e abrangência.
Para um organismo como
a ONU traçar diretivas e impor sua aplicação ele teria de ter um
mandato deferido pelos países, com o poder de fiscalizar e fazer
cumprir, o que pelo menos hoje em dia é impensável por várias
razões
A primeira é que os
governantes de qualquer lugar têm o hábito de achar que o mundo se
resume ao que está em volta do seu umbigo. É praticamente
impossível encontrar um estadista que aceite a aplicação de regras
transnacionais no território do seu país, violando diretrizes
políticas como a manutenção de um crescimento econômico acelerado
(caso da China) ou alterar o orçamento do país para gastar menos
com programas sociais e mais com programas ambientais (caso do
Brasil) ou ainda, limitar emissões que de gases que aumentam os
lucros de suas empresas (caso dos EUA), porque além da soberania que
ninguém quer violada, há promessas de campanha e programas de
governo que muitas vezes são até mesquinhos ante a tarefa de salvar
a humanidade preservando o meio-ambiente, mas são por demais afeitas
àquele eleitorado, e não serão objeto de negociação porque
implicam em um ônus eleitoral para o governante.
Ademais, como a ONU
conseguiria fazer colossos militares e econômicos como os EUA e a
China, principais emissores de gases do efeito estufa, cumprirem suas
regras em detrimento de sua economia interna e em ultima análise, do
seu eleitorado? Se pegarmos um tema atual, veremos que não se
consegue fazer cumprir diretrizes do Conselho de Segurança na Síria,
que é um país minúsculo, o que fazer então se hipoteticamente se
descobrisse que a Alemanha viola regras ambientais mundiais?
Logo, contentemo-nos
com os resultados pífios obtidos na Rio’ 92, cujas metas do
documento final não foram atingidas em nem 5% da lista. Não será
diferente na Rio + 20, por mais que o oba-oba em volta do evento seja
grande e que para os desavisados seja vendida uma revolução, um
pacto de concórdia entre os países para evitarem o desastre
ambiental que se anuncia.
Não haverá concórdia,
não haverá pacto, no máximo haverá um alerta para que cada país
ao menos aumente um pouco os esforços que têm (se é que os tenha)
para salvar o meio-ambiente.
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Mas isso não significa
que não se deva discutir o problema cada vez mais grave da
degradação ambiental que por sua vez é causada pelo pior agente
poluidor, o mais implacável, o mais presente e cujo combate é
extremamente delicado, o homem!
Sempre digo que não
existirá lugar, cidade ou país sustentável sem que o ser humano
assim seja. Enquanto vivermos em um mundo que desperdiça alimentos,
que é viciado em energia obtida com grave prejuízo ao
meio-ambiente. Um mundo que por motivos estéticos ainda não
extinguiu uma série de produtos impossíveis de reciclar, um mundo
que exige cada vez mais pontos turísticos mesmo que para tanto eles
agridam ecossistemas ainda virgens, um mundo que consome de tudo, em
grandes quantidades e em velocidade que aumenta exponencialmente. Com
esse quadro não haverá sustentabilidade por mais que diplomatas,
cientistas e ecologistas se unam na tentativa de apresentar soluções.
O Brasil experimentou
nos últimos 10 anos um processo que demonstra muito bem que não
adianta um país querer ser sustentável a partir dos discursos do
seu governo, se o seu povo não o é. Quando a população brasileira
recepcionou uma melhoria econômica ela foi às compras sem nenhuma
preocupação com o meio-ambiente. Primeiro importaram-se bugigangas
chinesas feitas com material altamente poluente e produzidas com
grande prejuízo ao meio-ambiente e mesmo à raça humana, já que
muitas vezes frutos de trabalho escravo. Quando a febre dos
importados perdeu força, o brasileiro descobriu o automóvel e
transformou cidades pacatas em pequenas metrópoles cheias de
problemas com trânsito caótico, falta de espaços urbanos e
poluição. E por fim, o brasileiro adotou o mais perverso sistema de
consumo que é o difundido no mundo pela cultura norte-americana e
segundo o qual um produto é feito para durar pouco tempo com enorme
pressão social e econômica para ser descartado e/ou trocado, muitas
vezes não por não mais servir, mas simplesmente por não estar mais
na moda.
O leitor lembra do
Traband? O Traband era o sonho de consumo de todo o alemão oriental,
ou seja, os habitantes do país socialista que resultou da cisão da
Alemanha nazista no pós 2ª Guerra. O Traband rodava mal pra
caramba, não dava conforto nenhum para o motorista e tinha um motor
poluente que era movido a gasolina com altos índices de chumbo sendo
que a instalação de um catalisador provavelmente travaria seu
motor. Mesmo assim, se a gente olhar bem, o Traband era mais
sustentável que qualquer carro de hoje em dia por uma razão simples
- a pessoa que comprava um ficava com ele até o fim da vida - ou
seja, havia uma enorme economia de recursos naturais na sua produção
e mesmo que a pessoa quisesse trocá-lo, trocaria um antigo por outro
mais novo mas na essência sem inovações e na prática, perda de
dinheiro!
É óbvio que eu mesmo
não quero viver em um mundo tipo Traband, mas se as pessoas
consumissem com mais responsabilidade, se aproveitassem a vida útil
de seus bens, se os enviassem corretamente para a reciclagem, se
jogassem seu lixo no lugar adequado, se deixassem de consumir coisas
que sabem que agridem o meio ambiente (quantos milionários adquirem
móveis de madeira de lei roubada da Amazônia?) não estaríamos do
outro lado do espectro, vivendo em uma sociedade tão opulenta quanto
irresponsável, onde a saúde de uma empresa não está nos números
consolidados do seu balanço, mas apenas na opinião de operadores
ainda imberbes das bolsas de valores que exigem que ela aumente seus
lucros todos os anos, apresentando novos produtos “indispensáveis”
ou “da moda” para o público consumidor, sob pena de rebaixarem a
cotação dos seus papéis.
Dias atrás li algo que
me deixou impressionado, um articulista foi direto ao ponto e afirmou
de modo bastante lúcido que a salvação do homem não está apenas
em preservar os recursos naturais que são finitos, mas sim em
promover a criatividade e a inovação do próprio homem, que é
infinita. Talvez esteja na hora de transferir esse ânimo em inovar
das fábricas de eletroeletrônicos e automóveis para os
comportamentos sociais ou para programas de reaproveitamento de
matérias-primas, talvez a sustentabilidade que salvará o planeta
esteja em aprender a consumir de modo responsável e mais que isso,
aprender a recuperar os recursos já despendidos sem perdas ou
descartes de qualquer natureza ao meio-ambiente.
O desafio é conter a
natureza humana, mas só o próprio homem é capaz disto!