A crise na Europa é reflexo do seu próprio desenvolvimento sócio-econômico.
Se pensarmos que a maioria dos países ricos na Europa experimenta um processo acelerado de estabilização demográfica, ou seja, população que não cresce ou cresce pouco ou diminui, com envelhecimento generalizado a pressionar sistemas previdenciários e de saúde bancados por Estados nacionais que sempre adotaram uma linha social-democrata, vemos que as contas públicas européias tendem, sim, a sofrer graves problemas.
Houve uma primeira fase de endividamento extremo, fase esta que gera a atual crise, mas não é improvável que esse processo venha em ondas nas próximas décadas, porque em determinado momento futuro, ou os impostos vão aumentar ou os gastos públicos vão diminuir, seja para zerar déficits, seja para, com isto, evitar que Estados nacionais sujeitem-se às regras pouco sensatas e justas dos mercados financeiros detentores de títulos dos tesouros, capazes de criar instabilidades do dia para a noite sem conexão alguma com a realidade.
Por outro lado, nos países ricos da Europa não há mais a necessidade de investimentos colossais de infra-estrutura que gerem indução econômica. As nações mais tradicionais da Europa já são economicamente bem preparadas, tudo, lá, implica apenas adaptação, não é necessário construir nada, basta ajustar. Talvez seja por isto que a União Européia tenha aceito alguns países eminentemente pobres como a Grécia em seus quadros, a necessidade de encontrar lugares onde alocar investimentos e gerar riquezas.
É verdade que a Europa pode exportar capitais, como efetivamente faz, importando dividendos. Funcionaria de modo perfeito se a exportação de capitais fosse feita pelos Estados nacionais e não por instituições privadas. Se os Estados praticassem isso dentro de um contexto de equilíbrio orçamentário interno, os dividendos que recebessem do exterior seriam usados para financiar o próprio Estado, como faz a Noruega com seu fundo soberano de petróleo.
O problema é que a exportação dos capitais europeus está sob controle da iniciativa privada, o que significa que os lucros da operação enriquecem os poucos proprietários destas carteiras, não os Estados, muitos menos seus cidadãos.
É um dilema: o Estado, em qualquer lugar do mundo, e salvo raras exceções, não sabe lidar com dinheiro. O Estado geralmente desperdiça e faz uso político e daí não gera lucro. Mas quem o usa com eficiência e gera lucro, não necessariamente gera riqueza para o Estado, ou seja, os déficits orçamentários continuam, a emissão de títulos, idem, e a especulação e a instabilidade, também.
E há o componente político.
O cidadão europeu cresceu e se acostumou a viver sob a proteção do Estado, que assumiu os sistemas educacional, de saúde e de previdência e sempre manteve a prática de tributar e retribuir com qualidade. E em vista desse sistema, o europeu também se acostumou a ter aversão à imigração, por mais que ela exista e gere problemas pontuais, especialmente o da exclusão pura e simples dos imigrantes dos sistemas de bem estar social da região.
Os índices demográficos europeus vão estabilizando, o que poderia ser revertido com políticas de imigração, mas o eleitorado não quer isto, na exata medida em que também não quer abrir mão dos benefícios que conquistou durante toda a vida.
Para nós, brasileiros, que pagamos os impostos mais altos do mundo sem qualquer contraprestação de qualidade pelo Estado, pode parecer estranho e mesquinho não aceitar a imigração que gera indução econômica, afinal, nessa lógica, mais gente, mais necessidade de infra-estrutura, mais obras = economia girando e crescendo. O problema é que os imigrantes não vão à Europa mais por oportunidades econômicas, eles vão para lá assumir sub-empregos na esperança de gozarem daqueles sistemas de bem estar social que seus países de origem nem sonham ter.
Ou seja, a Europa está em crise porque é desenvolvida, porque, talvez (e isso é apenas especulação), tenha chegado no limite do seu desenvolvimento, em uma situação em que será necessário rever conceitos econômicos arraigados, tanto no setor público, de governos gastadores, populistas, irresponsáveis e politiqueiros, quanto no setor privado, onde especuladores brincam com a vida de milhões de pessoas não exatamente por motivos justos, como comprovam os bônus desproporcionais aos méritos, que muitos executivos de finanças recebem de seus empregadores.
E sabem o que é pior nisso tudo? É que cedo ou tarde, esse processo vai chegar ao resto do mundo e pode até se agravar com o esgotamento dos mercados consumidores para onde hoje se exporte capital. Ou ainda com a falência de sistemas previdenciários que terão que suportar o envelhecimento da população em escala global. Cedo ou tarde, os países subdesenvolvidos vão virar desenvolvidos, as populações vão estabilizar, as necessidades de indução econômica vão diminuir, chegaremos a um limite econômico já que até o planeta terá esgotamento de seus recursos se a raça humana não descobrir como se expandir para fora dele. E não haverá país, seja ele capitalista, seja socialista, que não vá sentir os efeitos, se uma nova estrutura financeira mundial não for gestada desde já.
Pode demorar, mas a crise da Europa é alerta para o que virá adiante para todos.
PS: Não ando inspirado para escrever, o que é notado pela falta de posts aqui no blog. Eu peço desculpas aos leitores.
Eles abriram a torneira e agora não sabem mais como conter a gastança monumental que atolou e ainda atola muitos países. E o pior é que fazem isso porque sabem quem é que pode pagar essa conta: ou seja, os países da América latina, como sempre foi.
ResponderExcluirSerá que desta vez vamos nos curvar de novo como sempre fizemos?
Os países da AL só vão se enforcar se quiserem, Roberto Hyra. O Brasil, por exemplo, podia ser um país de contas superavitárias se não torrase tanto dinheiro em corrupção e estupidez, a receita tributária cresce todos os anos acima da inflação, mas o governo continua gastando acima disto...
ResponderExcluirSua análise tem razão na faceta de sua ótica. Eu já acho que eles estão assim porque são arrogantes.Demorou cair a ficha que o colonialismo acabou e que não há mais riquesa, vindo dos explorados por séculos e que sutentaram o estilo de vida dos donos do lugar. Mandaram embora os que não eram assim considerados, como os enxames que saem para formar outras colônias quando há super população.Perceberam que não podem mais fazer guerras para matar milhões como fazem as abelhas e marimbondos e recomeçar, explorando a corja sobrevivente na recontrução de seus palácios, postos abaixo e sem serventia mas retratos da exploração centenária de outros povos. Também acho que o estilo de vida nababesco, artificial exige muito gasto ao contrário dos povos explorados que possuem vida mais simples, com costumes mais naturais, adaptado, talvez, à sua realidade que está longe de explorar povos e o próprio Planeta para bancar as lantejoulas da sua civilização.O europeu impos sua civilização à ferro e fogo e , agora que o resto do mundo acordou e diz BASTA. A corda arrebentou para o lado mais forte, contrariando o seu ditado que diz o contrário.
ResponderExcluirMagui,
ResponderExcluirEm parte discordo.
Você acha que o brasileiro, povo colonizado vive uma vida simples? Adotamos o padrão europeu/americano de consumo, queremos carro, TV de ultima geração, celular 4G, McDonalds e Pizza Hut, estamos consumindo a uma razão desproporcional aos recursos naturais, tal como europeus e americanos.
E o Estado brasileiro quer ser o mesmo estado de bem estar social dos europeus, embora não tenha competência para tanto, de tanto que se rouba.
Ou seja, queremos ser iguais à eles e arriscamos experimentar crises iguais.
Mas concordo contigo sobre a arrogância de achar que poderiam manter o colonialismo enrustido em práticas econômicas, importando matérias-primas de modo barato e exportando bugigangas. É o colonialismo que levou Portugal a aceitar a independência de colônias apenas na década de 70, e que legou ao país 20 anos de estagnação econômica até aprender a viver sem explorar colônias.
O grande erro da Europa foi não equilibrar as contas públicas e deixar-se enredar pela teia da UE, onde os erros de alguns afetam a todos. Houve politicagem na manutenção de um generoso Estado de bem estar social que, sim, é arrogante porque é teorizado em economia há séculos, que em certo momento a economia estabiliza junto com a estabilização de índices demográficos.