O Poder Executivo brasileiro acostumou-se a impor o que bem entende por Medida Provisória, porque sabe que o Congresso Nacional pouco produz e a população brasileira pouco entende do conceito de tripartição de poderes.
O Código Civil de 2002, que substituiu o de 1916, ficou 30 anos no Congresso, assim como lá estão empacadas a Reforma Tributária (entre ante-projetos, projetos mortos e enterrados e projetos em andamento, ela já está lá há uns 20 anos) e uma série de legislações importantes que não são de interesse do Executivo, conquanto sejam da sociedade.
Pior que isso, o Congresso (ou o próprio Executivo, que manda e desmanda em senadores e deputados incompetentes e sem moral para fiscalizar ninguém) inventa uma CPI atrás da outra, sem que nenhuma chegue a qualquer resultado prático visível.
Ontem li nos jornais que a CPI das ONGS, que envolve investigação sobre valores que equivalem a umas 20 vezes aos dos cartões corporativos, foi prejudicada porque o escândalo mais recente tem preferência.
Enfim, não há prioridades, basicamente porque as CPI(s) não são feitas para investigar nada, mas para se transformarem em shows televisivos de embate entre o governo e a "quase" oposição.
Antigamente, a Silvia Popovic apresentava o Canal Livre na Rede Bandeirantes todos os fins de tarde sobre os assuntos mais irrelevantes. O Congresso está parecendo o programa dela (ótima apresentadora), um embate constante entre egos e interesses mesquinhos, feito para as câmeras das TV(s) da casa, um falatório sem sentido, com perguntas idiotas e despropositadas e discursos acalorados de parlamentares despreparados que vão do nada a lugar algum fazendo pose de autoridades.
Daí há quem reclame do excesso de Medidas Provisórias, mas o fato é que o Congresso Nacional pouco trabalha.
O uso indiscriminado de Medidas Provisórias, que é prática corrente desde a Constituição de 1988 transformou o Congresso Nacional num mero carimbador de documentos, basicamente porque deputados e senadores não se preocupam mais em legislar, mas apenas em "fazer política" e conseguir emendas e cargos, coisa que num país com tripartição de poderes, é atribuição de líderes de bancada e componentes das mesas das casas legislativas.
As MP(s) deveriam ser utilizadas em caso de relevância e urgência, mas em verdade, são utilizadas para tudo o que o governo quer impor na marra, desde impostos até políticas de saúde, muito embora, quando não haja grande interesse na matéria, o Executivo se utilize de projeto de Lei, como o que universaliza a merenda escolar no ensino secundário. E se utiliza projeto de Lei, é porque quer que a matéria fique engavetada, destino de quase tudo o que não é veiculado pela agenda do Poder Executivo.
Sinceramente, para mim a merenda escolar é muito mais relevante e urgente que a polêmica (conquanto correta) proibição de venda de álcool nas estradas. Mas o governo não pensa assim, talvez porque a merenda escolar não gera arrecadação por meio de multas que são impostas aos infratores nas estradas, sem contar que a merenda necessitaria de 300 milhões do orçamento (ou seja, menos que um tribunal cheio de mármore e granito).
Essa escala de valores poderia ser corrigida por um Congresso Nacional atuante, legiferante e fiscalizador. Mas o que temos é um Congresso servil, incapaz e acometido de paralisia cívica.
Leia mais:
O Globo
CPI do Cartão marca semana no Congresso, que deverá ter trabalhos prejudicados no ano
Publicada em 18/02/2008 às 11h25m
Adriana Mendes - Globo Online
18 de fev. de 2008
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