Sou da opinião que essa lei aprovada hoje pelo Senado é redundante, porque se o Brasil fosse efetivamente um país sério, fichas sujas já estariam banidos de nosso sistema político há muito tempo sem necessidade de enumerar exatamente as situações em que eles podem perder a chance de conseguir uma generosa"teta" pública.
Não considero a regra do artigo 5o., LVII, aquela que diz que ninguém é considerado culpado antes do trânsito em julgado da sentença, como de interpretação literal.
Existe uma diferença sensível entre o culpado citado na norma e o processado por um determinado delito.
O culpado receberá o apenamento legal (a prisão, a multa, a cominação alternativa) que só é possível com o trânsito em julgado.
Mas restrições à vida civil de uma pessoa acontecem desde a aceitação da denúncia ou às vezes, desde que alguém foi à delegacia dar queixa de alguma coisa contra ela. Acontece coisa parecida quando você atrasa um imposto - pode até discutir e eximir-se da culpa que implica em multa (que é uma pena), mas enquanto não chegar a esse ponto, fica com o nome inscrito e um cadastro de inadimplentes, perdendo o direito às certidões negativas, com restrições à sua vida civil.
O processado não pode ausentar-se da comarca sem informar ao juízo. Ele também passa a constar de certidões positivas de distribuição, usadas para os mais variados fins, como a procura de emprego e o exercício profissional.
Ou seja, se alguém tem uma distribuição anotada, terá no mínimo que explicá-la se estiver se candidatar-se a um emprego ou trabalho, isso se a parte que levantar a restrição quiser ouvi-lo!
Mas um candidato à eleição pode apresentar uma ficha mais suja que pau de galinheiro mas sempre haverá um juiz ou um tribunal disposto a deferir-lhe uma liminar com velocidade impressionante!
Veja a diferença: se o pobre mortal que chegou às vias de fato com o vizinho arruaceiro e acabou processado resolver fazer concurso, provavelmente será humilhado, porque é provável que o órgão público não vá aceitar sua inscrição ou contratação ou, no mínimo, pedirá explicações que podem ou não ser aceitas. E se insistir e ir ao Judiciário, vai penar com falta de celeridade e eventualmente contentar-se com a sorte de ter seu pedido de liminar analisado dias ou horas antes do certame ou da data final, porque o Judiciário não é benevolente com o cidadão comum, como é com um ficha encracada que pretende ser vereador, prefeito, deputado, senador, governador ou presidente, de quem não se pedem explicações por suas certidões positivas, desde que não haja sentença definitiva.
São dois pesos e duas medidas: o processado pode não conseguir um emprego de gari, mas é capaz de eleger-se senador!
Ademais, o Judiciário brasileiro tem um histórico vergonhoso de leniência com as más práticas políticas.
Políticos que terminaram seus mandatos na base de sucessivas liminares conseguidas com velocidade e facilidade impressionantes. Gente condenada por roubar dinheiro público, que usou do mesmo dinheiro para eleger o filho ou a esposa e continuar nas práticas delituosas por procuração, sem que se tenha conseguido um bloqueio liminar de bens para assegurar uma execução para devolução do dinheiro ao erário. Julgamentos lentos, pedidos de vistas sem argumentações complementares, aceitação de recursos redundantes e já decididos, tudo é possivel quando o assunto envolve eleições, é fácil constatar isso, basta olhar o noticiário e acompanhar alguns casos nos tribunais eleitorais.
Que a Lei sobre os fichas sujas é um avanço extraordinário se for aplicada, eu concordo. Aplaudo a opinião pública e o movimento cívico que conseguiu o que se pensava impossivel - uma votação no Congresso, em que parlamentares votaram contra seus próprios interesses.
Mas não consigo dissociar a aplicação da Lei da interpretação do Judiciário, historicamente ruim quando se trata de moralizar as práticas políticas. Nada impede que juízes defiram candidaturas medonhas de sujas alegando as mesmas inconstitucionalidades alegadas hoje em dia.
Ou seja, acabou o "lobby" cívico no Congresso Nacional. No momento em que o presidente sancionar a Lei, o movimento pela ética na política deverá voltar suas atenções ao Supremo Tribunal Federal e se possível impetrando Ação Declaratória de Constitucionalidade no dia seguinte à sanção.
Se assim nao for, corremos o risco de manter tudo do mesmo jeito.
Não considero a regra do artigo 5o., LVII, aquela que diz que ninguém é considerado culpado antes do trânsito em julgado da sentença, como de interpretação literal.
Existe uma diferença sensível entre o culpado citado na norma e o processado por um determinado delito.
O culpado receberá o apenamento legal (a prisão, a multa, a cominação alternativa) que só é possível com o trânsito em julgado.
Mas restrições à vida civil de uma pessoa acontecem desde a aceitação da denúncia ou às vezes, desde que alguém foi à delegacia dar queixa de alguma coisa contra ela. Acontece coisa parecida quando você atrasa um imposto - pode até discutir e eximir-se da culpa que implica em multa (que é uma pena), mas enquanto não chegar a esse ponto, fica com o nome inscrito e um cadastro de inadimplentes, perdendo o direito às certidões negativas, com restrições à sua vida civil.
O processado não pode ausentar-se da comarca sem informar ao juízo. Ele também passa a constar de certidões positivas de distribuição, usadas para os mais variados fins, como a procura de emprego e o exercício profissional.
Ou seja, se alguém tem uma distribuição anotada, terá no mínimo que explicá-la se estiver se candidatar-se a um emprego ou trabalho, isso se a parte que levantar a restrição quiser ouvi-lo!
Mas um candidato à eleição pode apresentar uma ficha mais suja que pau de galinheiro mas sempre haverá um juiz ou um tribunal disposto a deferir-lhe uma liminar com velocidade impressionante!
Veja a diferença: se o pobre mortal que chegou às vias de fato com o vizinho arruaceiro e acabou processado resolver fazer concurso, provavelmente será humilhado, porque é provável que o órgão público não vá aceitar sua inscrição ou contratação ou, no mínimo, pedirá explicações que podem ou não ser aceitas. E se insistir e ir ao Judiciário, vai penar com falta de celeridade e eventualmente contentar-se com a sorte de ter seu pedido de liminar analisado dias ou horas antes do certame ou da data final, porque o Judiciário não é benevolente com o cidadão comum, como é com um ficha encracada que pretende ser vereador, prefeito, deputado, senador, governador ou presidente, de quem não se pedem explicações por suas certidões positivas, desde que não haja sentença definitiva.
São dois pesos e duas medidas: o processado pode não conseguir um emprego de gari, mas é capaz de eleger-se senador!
Ademais, o Judiciário brasileiro tem um histórico vergonhoso de leniência com as más práticas políticas.
Políticos que terminaram seus mandatos na base de sucessivas liminares conseguidas com velocidade e facilidade impressionantes. Gente condenada por roubar dinheiro público, que usou do mesmo dinheiro para eleger o filho ou a esposa e continuar nas práticas delituosas por procuração, sem que se tenha conseguido um bloqueio liminar de bens para assegurar uma execução para devolução do dinheiro ao erário. Julgamentos lentos, pedidos de vistas sem argumentações complementares, aceitação de recursos redundantes e já decididos, tudo é possivel quando o assunto envolve eleições, é fácil constatar isso, basta olhar o noticiário e acompanhar alguns casos nos tribunais eleitorais.
Que a Lei sobre os fichas sujas é um avanço extraordinário se for aplicada, eu concordo. Aplaudo a opinião pública e o movimento cívico que conseguiu o que se pensava impossivel - uma votação no Congresso, em que parlamentares votaram contra seus próprios interesses.
Mas não consigo dissociar a aplicação da Lei da interpretação do Judiciário, historicamente ruim quando se trata de moralizar as práticas políticas. Nada impede que juízes defiram candidaturas medonhas de sujas alegando as mesmas inconstitucionalidades alegadas hoje em dia.
Ou seja, acabou o "lobby" cívico no Congresso Nacional. No momento em que o presidente sancionar a Lei, o movimento pela ética na política deverá voltar suas atenções ao Supremo Tribunal Federal e se possível impetrando Ação Declaratória de Constitucionalidade no dia seguinte à sanção.
Se assim nao for, corremos o risco de manter tudo do mesmo jeito.