19 de mai. de 2010

FICHAS SUJAS: O LOBBY PRECISA CONTINUAR!

Sou da opinião que essa lei aprovada hoje pelo Senado é redundante, porque se o Brasil fosse efetivamente um país sério, fichas sujas já estariam banidos de nosso sistema político há muito tempo sem necessidade de enumerar exatamente as situações em que eles podem perder a chance de conseguir uma generosa"teta" pública.

Não considero a regra do artigo 5o., LVII, aquela que diz que ninguém é considerado culpado antes do trânsito em julgado da sentença, como de interpretação literal.

Existe uma diferença sensível entre o culpado citado na norma e o processado por um determinado delito.

O culpado receberá o apenamento legal (a prisão, a multa, a cominação alternativa) que só é possível com o trânsito em julgado.

Mas restrições à vida civil de uma pessoa acontecem desde a aceitação da denúncia ou às vezes, desde que alguém foi à delegacia dar queixa de alguma coisa contra ela. Acontece coisa parecida quando você atrasa um imposto - pode até discutir e eximir-se da culpa que implica em multa (que é uma pena), mas enquanto não chegar a esse ponto, fica com o nome inscrito e um cadastro de inadimplentes, perdendo o direito às certidões negativas, com restrições à sua vida civil.

O processado não pode ausentar-se da comarca sem informar ao juízo. Ele também passa a constar de certidões positivas de distribuição, usadas para os mais variados fins, como a procura de emprego e o exercício profissional.

Ou seja, se alguém tem uma distribuição anotada, terá no mínimo que explicá-la se estiver se candidatar-se a um emprego ou trabalho, isso se a parte que levantar a restrição quiser ouvi-lo!

Mas um candidato à eleição pode apresentar uma ficha mais suja que pau de galinheiro mas sempre haverá um juiz ou um tribunal disposto a deferir-lhe uma liminar com velocidade impressionante!

Veja a diferença: se o pobre mortal que chegou às vias de fato com o vizinho arruaceiro e acabou processado resolver fazer concurso, provavelmente será humilhado, porque é provável que o órgão público não vá aceitar sua inscrição ou contratação ou, no mínimo, pedirá explicações que podem ou não ser aceitas. E se insistir e ir ao Judiciário, vai penar com falta de celeridade e eventualmente contentar-se com a sorte de ter seu pedido de liminar analisado dias ou horas antes do certame ou da data final, porque o Judiciário não é benevolente com o cidadão comum, como é com um ficha encracada que pretende ser vereador, prefeito, deputado, senador, governador ou presidente, de quem não se pedem explicações por suas certidões positivas, desde que não haja sentença definitiva.

São dois pesos e duas medidas: o processado pode não conseguir um emprego de gari, mas é capaz de eleger-se senador!

Ademais, o Judiciário brasileiro tem um histórico vergonhoso de leniência com as más práticas políticas.

Políticos que terminaram seus mandatos na base de sucessivas liminares conseguidas com velocidade e facilidade impressionantes. Gente condenada por roubar dinheiro público, que usou do mesmo dinheiro para eleger o filho ou a esposa e continuar nas práticas delituosas por procuração, sem que se tenha conseguido um bloqueio liminar de bens para assegurar uma execução para devolução do dinheiro ao erário. Julgamentos lentos, pedidos de vistas sem argumentações complementares, aceitação de recursos redundantes e já decididos, tudo é possivel quando o assunto envolve eleições, é fácil constatar isso, basta olhar o noticiário e acompanhar alguns casos nos tribunais eleitorais.

Que a Lei sobre os fichas sujas é um avanço extraordinário se for aplicada, eu concordo. Aplaudo a opinião pública e o movimento cívico que conseguiu o que se pensava impossivel - uma votação no Congresso, em que parlamentares votaram contra seus próprios interesses.

Mas não consigo dissociar a aplicação da Lei da interpretação do Judiciário, historicamente ruim quando se trata de moralizar as práticas políticas. Nada impede que juízes defiram candidaturas medonhas de sujas alegando as mesmas inconstitucionalidades alegadas hoje em dia.

Ou seja, acabou o "lobby" cívico no Congresso Nacional. No momento em que o presidente sancionar a Lei, o movimento pela ética na política deverá voltar suas atenções ao Supremo Tribunal Federal e se possível impetrando Ação Declaratória de Constitucionalidade no dia seguinte à sanção.

Se assim nao for, corremos o risco de manter tudo do mesmo jeito.

8 comentários:

  1. quase 2% da população brasileira mostrou que não é omissa e quer fichas limpas. Se é pouco ou muito, não importa.

    Em suma, infelizmente, migramos o centro do poder do legislativo para o judiciário. Se for pra seguir a linha pessimista dos tipicos metidos a intelectuais brasileiros [onde nada está bom, ninguém presta, etc etc etc], estamos abrindo as portas para o inicio da ditadura via ST´s e TS´s...

    acredito que é outro começo. A lei está ai, é mais uma entre tantas que possuimos no país. Acredito também que vale a analogia sugerida por 1 frase usada para causas ecologicas: um planeta melhor para os filhos ou filhos melhores para o planeta? Se não retirarmos o Gerson de nossa cultura, tudo caminhará como está... vamos arranjando novos jeitos de pular.

    Ah, sensacional o post sobre a convocação do Dunga... abraços!

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  2. Golpe contra o ficha Limpa!
    Uma emenda de plenário ao projeto Ficha Limpa, apresentada pelo senador Francisco Dornelles (PP-RJ), estabelece que a proibição para que pessoas com condenações por colegiados se candidatem a cargos eletivos só valerá para sentenças proferidas após a promulgação da lei.
    Com essa interpretação, mesmo os poucos casos que seriam atingidos pela proposta poderão se candidatar, como o deputado Paulo Maluf (PP-SP), que é do mesmo partido de Dornelles.

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  3. Uma das coisas que mais fiz desde que tenho um blog foi reclamar do Judiciário brasileiro - ter blog é pouca coisa, é verdade, mas não pelas minhas condições apenas porque sabemos que isso (reclamar) morre na casca mesmo.

    O texto do Ficha Limpa como fora redigido pelo MCCE seria ótimo se não tivesse sido desfigurado na Câmara e pelo Senado. O Congresso votou pela pressão pública, não por interesse próprio dos deputados ou por alegria deles. E todos (mais uma vez: TODOS) só votaram porque 'sabem' que é possível recorrer no Judiciário, alegando insconstitucionalidade.

    Se o Brasil fosse um país sério o Ficha Limpa seria norma nos estatutos de todos os partidos. A verdade é que os ratos do congresso não são ratos por acaso, são ratos também porque tem apoio, e tem (no Judiciário BR) quem os apoie nas suas empreitadas. Afinal, quem redige as leis faria alguma lei para se prejudicar?

    Alguma coisa, mesmo que mínima, só muda nesse país se for por mobilidade pública, e eu já estou até perdendo a fé na humanidade.

    PS. Mudando de assunto:
    Respondi no meu blog sobre sua opinião em meu último post.

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  4. Não escrevi um linha sobre o assunto porque penso que há vários pontos não claros neste movimento ficha limpa.
    Hoje, vivemos num mundo em que, mesmo que todos sejam considerados inocentes até provarem o contrário, a verdade é que os inocentes tem sempre que provar a inocencia.
    Neste caso, é bem provável que os limpos é que terão que mostrar suas fichas limpas, enquanto os sujos, exigirão deles tal limpeza...

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  5. Tem razão mas a luta não pode parar e quanto mais se discute mais o eleitor ( comum) pode ficar atento.

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  6. Nossa política fede, só a Justiça não sente o cheiro!
    É comum político livrar-se de problemas cabeludos com o "maiorrr apoiooo" da Justiça e de juizes que acatam defesas de hábeis advogados. Tem político que pode pagar honorários de ex-ministro de Justiça! E tem ex-ministro de Justiça que aceita defender calhorda, afinal todo cidadão tem o direito de defesa. E tem juiz disposto a estudar processos com muito carinho, mas muito carinho mesmo, quando o réu merece!
    No Paraná, o famoso caso DeCarli é um exemplo. O cara matou dois dirigindo bêbado um carro super potente. Dois julgamentos já foram marcados. O ex deputado nem se deu ao trabalho de aparecer nas duas oportunidades, restando ao juiz marcar outra data! Segundo informações divulgadas a atitude do réu não é exatamente fora da lei ou desrespeito, é prevista e pode acontecer!
    Não resisto:
    -Se fosse plebeu pobre e negro seria arrastado até o juiz, alguém duvida? Ou mais comum, seria julgado a revelia.
    Não sei, mas me parece que o problema de corrupção politica seria resolvido se nossa Justiça fosse uma só,no sentido de agir aplicando a lei de maneira similar com todos os cidadãos.Por mais que seja negado, a Lei é uma só, mas não me parece assim.
    Não culpo politicos ou pessoas que usam todos os recursos que possuem para terem um bom tratamento, vantagens ou regalias, culpo sim quem permite que isso aconteça mesmo tendo por função básica evitar justamente isso.

    Mas atenção, não vale o clássico "só no Brasil":

    Bill Clinton e Hillary passaram anos se explicando com a justiça americana sobre a grana preta que ganharam em um nebuloso caso conhecido como "a fraude imobiliária Whitewater" um caso de falência suspeita de uma poupança pública. Todos os envolvidos no escândalo foram condenados, sócios e amigos de casal Clinton amargaram multas, devolução de valores e prisões. Bill e Hillary foram inocentados por falta de provas! Hoje quem se explica é a Justiça americana ao povo americano explicando porque prova que condena chico não condena Francisco!

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  7. Zé,

    Eu disse "se o Brasil fosse sério", não exclui nenhum outro país, apenas critiquei o nosso, por conta desse estado de coisas.

    A política é suja em todo lugar, tanto nos EUA, como na Rússia ou em Cuba ou Venezuela... nenhum desses países é muito diferente do Brsil quando o assunto envolve as altas cúpulas políticas, a diferença é que fora do Brasil, uma condenaçao acaba com a carreira de alguém (os Clinton não foram condenados) e, no Brasil, parece que o fortalece, o cara sai dizendo que "não conseguiram" puni-lo porque conseguiu liminar para fugir da sentença e uma parte substancial do povão o vê como herói.

    De qualquer modo, critico o Judiciário até pelos mesmos motivos que voce citou, o Sr.De Carli escarnece com a Justiça, se fosse pobre já teria condenação à revelia...

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  8. Essa lei è exatamente como o acordo do Lula com o Ira.

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