Um comentarista político de Curitiba, Raul Mazza, sempre comenta que o Brasil é um país em que não existe uma meritocracia.
Ele quer dizer com isso que o Brasil, via de regra, não premia quem é mais competente, porque aqui, o que mais importa é ser popular, ser bonito ou ter algum tipo de apadrinhamento.
E não deixa de ser verdade.
Quem procura emprego nessas agências estúpidas de recrutamento passa pelas maiores humilhações. Em processos seletivos, convocam uns 10 ou 15 profissionais e fazem várias entrevistas e as ridículas dinâmicas de grupo, mas o contratado geralmente é alguém indicado por um dos diretores da empresa ou até mesmo da agência ou ainda pior, o mais bonito dentre os candidatos. A maioria dessas empresas de recrutamento cobra sem prestar um mísero serviço, se aproveitam na necessidade alheia de trabalhar. Elas alimentam a deméritocracia ao selecionar os bons e escolher apenas os mais ou menos.
Mas vamos mais longe.
Conheço uma funcionária de tribunal cuja promoção foi preterida em favor de outra, com anos a menos de serviço, porque esta adulava o juiz responsável pela sua repartição, e aquela, se limitava a trabalhar feito escrava e deixar seus prazos em dia. Ou seja, mais vale elogiar diariamente a cor da gravata do magistrado, que trabalhar sério e fazer as coisas funcionarem.
E sob outro aspecto, aqui na cidade onde vivo um dos candidatos a prefeito mal e porcamente sabe escrever o nome, mas ele é favorito às eleições porque é parente de um ex-prefeito que foi cassado porque condenado em todas as instâncias por comprar votos na cara dura, mas praticava assistencialismo barato. Mesmo assim, o gajo é favorito, porque o povão vê nele a continuidade do "injustiçado".
Eu mesmo já senti na carne que o mérito não é valorizado entre nós. Certa feita, um cliente meu foi acionado em valores milionários. Eu e minha sócia trabalhamos durante uns 10 dias sem parar para juntar provas, montar alegações e fazer a contestação. Um trabalho estafante, sob a pressão de um prazo exíguo combinado com a preocupação do cliente, empresa formada por fundos de pensão, que queriam explicação detalhada do por que de serem réus em juízo.
Não nos negamos a atender à situação de urgência, decidimos discutir o valor dos serviços depois, confiando no cliente. Ganhamos a ação em primeira instância, mas ele se recusou a pagar pelos serviços, alegando que era nossa obrigação contratual, mesmo havendo cláusula expressa dizendo que não.
Tempos depois, o mesmo cliente que nunca nos pagou, forçou-nos a aceitar um novo advogado na causa, um ex-desembargador que "cuidaria" do recurso. O tal advogado usou a mesma petição feita no meu escritório, acrescentou um parágrafo e fez uma sustentação oral completamente fora do que estava escrito, não sem antes botar banca e garantir para minha sócia que aquele processo se encerraria ali. Perdeu a ação no tribunal e mesmo assim, recebeu R$ 40 mil, enquanto eu e minha sócia nunca recebemos nem um centavo porque, afinal, não somos ex-desembargadores, pouco importa a qualidade de nosso serviços.
Longe de reclamar da vida, me considero um advogado comum mas pouco acima da média do que se encontra nos fóruns. Mas fico estarrecido ao ver o trabalho que prestam alguns dos grandes figurões do mundo jurídico. É incrível como se encontram erros crassos de português e de interpretação jurídica tudo compensado porque o advogado "x" tem boa influência no tribunal, de onde as vezes ele é aposentado, ou porque advogado "y" é ligado ao deputado "w". Enfim, claro que há os profissionais excepcionais, aqueles que são uma referência, mas a maioria dos figurões só o é porque atropelaram o mérito, e porque é comum no Brasil se escolher um advogado bom em trocar influência, ou bom em ganhar tempo para quem não quer pagar o que deve.
No Brasil é quase sempre assim. Bons empregos são deferidos a quem tem indicação ou a quem é mais bonito, pouco importando sua competência. Promoções no serviço público não consideram as fichas funcionais. Correligionários imbecis de políticos recebem chefias que seriam melhor ocupadas por funcionários de carreira. Políticos comprovadamente corruptos são extremamente populares. As dançarinas do Tchan recebem mais reconhecimento que, por exemplo, as talentosas Vanessa da Mata ou Ana Carolina. Quem promete vender influência é mais valorizado que os que trabalham duro. Até no futebol que antigamente era exceção esse quadro chegou, à vista dos cabeças de bagre que conseguiram a façanha de perder para a seleção da Venezuela, convocados não exatamente pelo seu mérito.
Não existe meritocracia no Brasil. Pouco importa se o leitor tenha estudado para conseguir lugar nas melhores universidades. Pouco importa se antes das provas você estudava de madrugada e tirava nota 10 porque é provável que seu colega que saía do bar para a sala de aula, fazia a prova, colava e tirava 5 tomará o seu lugar no mercado de trabalho por tem alguém que o indique ou por ser mais bonito e descolado. De nada adianta trabalhar sério, as promoções não são decididas pelo seu desempenho. E no resumo, pouco adianta ser honesto, porque o que importa entre nós é "se dar bem" e pessoas honestas não aceitam isso, elas querem vencer por méritos.
Somos um país de indicações, de cargos em comissão que desprezam os concursos públicos, de mulheres que só fazem sucesso por mostrarem as carnes em revistas masculinas e de políticos populistas. Excluímos o mérito de nossas vidas, e o fazemos isso justificando até em boas intenções, como a de desafogar as escolas públicas, que aprovam alunos que sequer aprender a ler e escrever, ou ainda, damos o direito de trabalhar a profissionais saídos de faculdades tipo fim de semana e pagou-passou, porque supostamente isso tira pessoas da pobreza.
Enfim, vivemos a cultura do "se dar bem".
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