Não sei exatamente quando, mas em um determinado momento na história
recente da humanidade, a felicidade “full time” virou um
dogma social, e não exatamente um valor a ser calculado em
perspectiva como faziam nossos avós que, ao fim da vida, ou
regozijavam-se de tê-la vivido de modo frutífero, com muitos bons
momentos e muitas alegrias guardadas no baú da memória, ou os que
chegavam à conclusão que nem tanto, não viveram exatamente como
podiam ter vivido. Uma pista sobre isso é a figura clássica do
velhinho(a) aposentado(a) que dava balas para os netos e lhes contava
histórias de uma juventude alegre, cheia de momentos bonitos que
mereciam a atenção dos garotos.
O fato de nossos dias, perceba o leitor, felicidade virou produto
porque vende, e muito!
Basta ver as revistas de manchetes em que “fulana tal, atriz
famosa, casada com o bonitão tal passa férias perfeitas na
Toscana”. As pessoas
compram a revista para saber da felicidade alheia - mesmo que ela
seja montada - porque o casalzinho se separa 30 dias depois, ocasião
em que a mesma revista vende a felicidade pela antítese: separou,
negócio é bola pra frente! O produto que se vende é a ideia do
sucesso a qualquer custo, do dinheiro que tudo compra, da felicidade
representada por uma vida perfeita cheia de sorrisos, mesmo que nem
sempre sinceros.
Ouvi uma reportagem de rádio que disse que a felicidade virou um
grande negócio que alimenta consultórios de psicologia e passa pela
venda de antidepressivos. Eu acrescentaria que envolve também as
cerimônias pomposas de casamentos que não duram muito tempo, pelos
aniversários luxuosos de crianças de colo que não entendem
patavina do que está acontecendo e até da educação precária de
crianças que, por não poderem ser contrariadas para não serem
infelizes, ou não se deixam educar ou simplesmente não são
educadas pelos pais.
Vivemos uma época de pessoas incapazes de suportar a frustração
natural da vida. Gente como os “ex”
namorados/noivos/maridos/esposas enlouquecidos pela perda do ente
querido, a criança que reina, chora, esperneia e enche o saco dos
pais até conseguir aquele brinquedo com o qual vai se divertir por
uns dias e depois jogar em algum armário, o jovem que mede a
felicidade pelas roupas de grife que veste ou pela quantidade de
álcool que consome em uma única noite. Tudo numa busca por uma
felicidade idealizada, mesmo que fugaz, confundida com felicidade
para sempre.
É 8 ou 80, tudo ou nada! O casal que passa por uma crise, solução:
divorcio e bola pra frente! A criança agitada: o calmante ou o
suborno do brinquedo novo! Ao cão que faz xixi na sala: o abandono!
Só importa a imagem de perfeição do casal que não briga, da
criança que não faz travessuras, da sala de estar de revista de
decoração sem o cãozinho mal criado, que porém foi comprado para
alavancar a felicidade do dono tal qual os iPads, iPhones e
eletro-eletrônicos da moda.
A felicidade virou um produto intrínseco a outros produtos e
serviços, ela é parte da promessa de quem organiza eventos e de
quem vende produtos, ela é a matéria-prima dos livros e
palestrantes de auto-ajuda, é ela, e não os sorrisos falsos
estampados em capas de revista, que aumenta as tiragens e a audiência
de sites de fofocas.
O problema é que felicidade é um valor medido pelo conjunto de bons
momentos da vida de uma pessoa e pela satisfação que ela tem no seu
dia-a-dia e não exatamente ser medida pelo tempo de sorriso no rosto
de quem quer que seja ou por aquela sensação de perfeição vendida
na publicidade e na mídia.
Mas virou negócio, e as pessoas estão a confundindo com
prosperidade.