Pense o leitor nestes 3 fatos:
1. A Polícia Federal desmantelou uma quadrilha que "facilitava" para determinada empresa agenciadora, a aprovação de projetos que receberiam incentivos da Lei Rouanet, administrados pelo Ministério da Cultura.
2. Fiscais do IAP - Instituto Ambiental do Paraná foram presos por facilitar a liberação de licenças de corte da araucárias (pinheiro símbolo do Paraná) e traficar a madeira, que é nobre, rara e em extinção.
3.Este que vos escreve passou 3 horas e 30 minutos desta tarde numa fila da Receita Federal do Brasil para retirar uma certidão negativa de tributos que estava travada por um débito de R$ 18,00, para uma empresa que fatura R$ 3 milhões por ano.
Pode alguém dizer que não são relacionados. O Fábio Mayer é um chato que não suporta fila, a PF cumpriu o seu dever e os fiscais do IAP devem mesmo pegar cana.
Mas o elo de ligação entre os fatos é a burocracia.
A mesma burocracia absurda que impede a emissão de certidão negativa para um contribuinte que paga em dia mais de 1 milhão de reais anuais em impostos, por R$ 18,00, é o que incentiva a proliferação de quadrilhas que calçam funcionários públicos para agilizar as coisas em processos administrativos e possibilita, ante o excesso de papelório não devidamente analisado, que araucárias nativas sejam cortadas como se fossem pinus ou eucaliptos de reflorestamento.
O caso dos R$ 18,00 é o mais simples. Hoje, a fiscalização é eletrônica, você declara o imposto e se houver alguma diferença ela fica lá como um óbice fiscal. O contribuinte que ganha R$ 1000 e precisa de certidão negativa uma vez na vida é tratado exatamente do mesmo jeito que outro, que fatura R$ 3 milhões e precisa de uma certidão sempre renovada, sob risco de, não a tendo, parar de operar e demitir seus 54 funcionários.
Já nos dois outros casos, a burocracia é o motor do ato ilegal.
Os benefícios fiscais da Lei Rouanet são ridículos. A cada R$ 100,00 aplicados em projetos culturais com base nesta Lei, apenas 2 ou 3 são recuperados a título de incentivo fiscal e, mesmo assim, dependendo da forma e da aprovação prévia altamente burocrática. O que a quadrilha fazia era apenas pagar uns caraminguás para um funcionário no MinC tirar os seus processos de uma pilha altíssima e agilizar sua tramitação, quando muito, informando da falta de algum documento que deveria ser obtido ou falsificado. Em outras palavras, a prisão dos caras se deu porque eles violaram o princípio da isonomia na fila, segundo o qual, todo mundo tem que esperar o mesmo tempo para ver seus projetos aprovados, mesmo que esse tempo represente meses ou anos de atraso no que pretende fazer.
No caso das araucárias, a questão é que é tanto papel, tanta burocracia e tanta regra absurda a se cumprir para conseguir uma autorização de corte de qualquer madeira ou licenciamento ambiental de qualquer natureza, que os fiscais simplesmente recebiam uns caraminguás, trocavam a documentação ou simplesmente deixavam passar porque, uma vez cortadas as árvores, até alguém sério lá do setor de fiscalização perceber, já teria dado tempo de ter outra árvore adulta no lugar.
Enfim, a corrupção que decorre da burocracia, se protege nela mesma. Seja em processos administrativos que são perdidos em repartições ou mesmo em processos judiciais que o péssimo Judiciário nacional simplesmente deixa de lado, porque os senhores juízes, de regra, não aceitam dar mais de 5 horas diárias de expediente.
Mas o problema mesmo é que a maior parte da população não tem caraminguás para calçar ninguém para acelerar seus processos. Os honestos, no Brasil, ficam na fila e são atendidos por funcionários que as vezes nem sabem quais os documentos são necessários para cada processo ou não têm idéia de para onde encaminhar aquele contribuinte chato que está ali no balcão pedindo informações (e aviso que a Receita Federal do Brasil é a exceção).
A burocracia brasileira é um misto de excesso de ocupantes de cargos em comissão decidindo coisas importantes sem entender patavina delas, leis mal redigidas que mudam a toda hora e falta de funcionários qualificados nos serviços essenciais do Estado.
Abrir uma empresa, entre nós, demora 150 dias ou quase meio ano, fechá-la, 3 anos se nada der errado (e sempre dá alguma coisa errado!).E digo mais, no Brasil, adota-se uma coisa absurda chamada TAXA DE FISCALIZAÇÃO, cobrada, por exemplo, pelas Agências Reguladoras. Taxa é um tributo que depende de uma contraprestação do Estado, mas essa contraprestação, na teoria clássica, não pode estar ligada às funções essenciais de governo, dentre as quais se encontra, a de fiscalizar e regular. Ou seja, o governo cobra pela burocracia que ele mesmo exige para não cumprir suas funções essenciais.
Isso atrasa investimentos, retarda e/ou diminui arrecadação tributária, rouba empregos e progresso e só beneficia uma classe de pessoas, a dos políticos corruptos, aqueles que indicam seus apadrinhados para cargos em comissão e acabam controlando determinado órgão e cobrando proprina para que ele cumpra suas funções legais. E há órgãos controlando todas as atividades econômicas sem exceção, algumas delas dependentes de autorizações complicadíssimas, do mesmo jeito que financiamentos por bancos públicos dependem de pelo menos 4 certidões negativas de órgãos diferentes. É um "Deus nos acuda" burocrático, que transformou os contadores em meros leva e trás de papéis carimbados.
Enfim, não que eu reclame dos 210 minutos de fila, porque, trabalhando nisto há 23 anos posso atestar que melhorou muito desde a década de 80, pelo menos na RFB. Mas o país precisa arrumar isso, e só não o faz porque os políticos ganham muito de influência e propinas com esse estado de coisas.
Eles, sempre eles roubando o progresso na Nação!
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