17 de dez. de 2008


Embora eu não seja exatamente velho, vou completar apenas 40 no próximo dia 3, ainda sou de um tempo em que não existia escola pública, universal e gratuita.

Quando eu era criança, não havia escola para todo mundo.

Mais do que isso, a merenda escolar era limitadíssima e quem morava longe da sala de aula, ou ia à pé, ou não ia. Não foram poucos os colegas que acordavam de madrugada e andavam 7 ou 9 km para estudar. E ninguém reclamava, até porque, ao voltar para casa, alguns ainda ajudavam na lavoura.

E todos eles aprenderam a ler e a escrever. E suas famílias, mesmo as mais pobres, de regra cobravam a aprovação e todo mundo, de regra, estudava. Se apenas eu cheguei a ter formação universitária, isso é outro assunto, mas garanto que a maioria dos meus colegas de escola primária e ginasial compreendem um texto simples de uma lauda. Pena que aquele ensino não era universal e muita gente ficava fora da escola.

Hoje em dia, a escola praticamente universalizou-se. A Constituição de 1988 impõe o oferecimento de vagas. Houve um tempo, aqui onde eu moro, em que as salas de aula chegaram a ter 60 alunos, quando a média recomendável é de 30 para menos. Mas o importante é que as crianças estavam (ou estão) numa escola.

E na minha época, apenas uma ou outra escola de oferecia merenda. Hoje em dia, ela também é universal, apesar, claro, de muitos prefeitos roubarem dinheiro disso, desviando recursos municipais, estaduais e federais para suas contas pessoais. Mesmo assim, a enorme maioria das crianças em idade escolar de hoje em dia, recebe merenda.

E ao mesmo tempo, a distância deixou de ser problema. Prefeituras municipais gastam horrores com o transporte escolar, de tal modo que até se fecharam escolas rurais transferindo os alunos para escolas urbanas, não poucas vezes por interesses eleitoreiros, vez que os ônibus recebem e não raro pagam comissão para vereadores e prefeitos. Mas os alunos chegam às salas de aula e voltam para a casa em relativa segurança.

O acesso ao ensino foi universalizado e facilitado. Hoje há escola, merenda e transporte, mas a enorme maioria de quem é beneficiado por isso não aprende quase nada.

Criou-se a regra da aprovação automática, de tal modo que os pais não se preocupam mais se os filhos estudam ou não e mesmo as crianças não dão bola para obrigação alguma.

Instituiu-se a preguiça mental a partir do paternalismo do Estado, e há mais de 20 anos, estamos formando gerações de indolentes acostumados ao maná governamental sem qualquer tipo de contraprestação.

As crianças aprendem desde cedo que o governo lhes dá muita coisa de graça, e, sem o risco da reprovação, ao mesmo tempo compreendem que não precisam retribuir com nada, nem com esforço e notas altas. O Estado sempre lhes passará as mãos na cabeça, as aprovará sem que saibam ler e escrever e depois dará bolsa-família, seguro-desemprego e até condições favorecidas de litigar judicialmente, por serem pobres ou empregados, por meio de presunções juristantum que eu mesmo defendo, mas cujos resultados práticos não são os desejados pelo legislador.

Some-se isso à cultura da ignorância das celebridades sertanejas, pagodeiras ou funkeiras, e aos escândalos de lavadeiras que artistas ruins promovem com seus relacionamentos fugazes e seu culto obsessivo à imagem e ao sucesso sem mérito que a maioria alcança, criamos uma geração de alienados que sonha com próteses de silicone ou contratos de futebol com times do exterior, mas que compreende que para isso não é preciso ler e escrever, muito menos ser capacitado para algo mais que o óbvio.

A sensação que tenho hoje em dia, é que essa universalização combinada com falta de cobrança de obrigações, gerou uma geração de pessoas descomprometidas com tudo o que não seja de interesse exclusivamente pessoal. Virou uma espécie de treinamento do ego, do "eu", do "se dar bem" e da amoralidade que deságua até em formandos de medicina que não entendem o mínimo conceito ético, como aqueles lá de Londrina.

Mas eu posso estar errado, afinal, mal ou bem, estou ficando velho.

Foto: Museu Nacional do Imigrante. Joinvile/SC

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